Aprovado pela CTNBio em setembro de 2008.
O controle da vegetação espontânea baseado na aplicação continua de herbicidas de um mesmo grupo químico acelera a seleção de biótipos tolerantes. A sobrevivência e a multiplicação dessas plantas em determinadas áreas faz com que tanto o herbicida, como a própria semente transgênica percam sua utilidade.
Outro risco associado ao uso de cultivos transgênicos resistentes a herbicidas é o de que o próprio cultivo adquira características de planta invasora, como nos casos de rotação de culturas onde ambas apresentem resistência ao mesmo herbicida. No caso do algodão existe o risco de cruzamento para espécies aparentadas de ocorrência no território brasileiro.
Os cultivos transgênicos tolerantes a herbicidas aprofundam o paradigma de campos totalmente limpos. Isso significa redução de biodiversidade e, conseqüentemente, uma maior simplificação do agroecossistema, com maior instabilidade e susceptibilidade a ao ataque de insetos praga. Quanto maior o ataque de pragas, maior o uso de venenos agrícolas.
Entre os anos de 1964 e 1979, período de expansão da chamada modernização agrícola baseada em pacotes tecnológicos, aumentou em 1.243% o uso de adubos solúveis e em 421% o uso de agrotóxicos. Praticamente no mesmo período, entre 1958 e 1976, 400 novas pragas surgiram.
A expansão das monoculturas com o consequente uso crescente de agrotóxicos fez explodir também o número de insetos resistentes a agrotóxicos. Eram 10 até 1946 e 500 em 1988 . Esses dados mostram que a simplificação dos agroecossistemas gera um espiral descendente de insustentabilidade, onde a aplicação de agrotóxicos gera novas e mais resistentes pragas, que demandam mais agrotóxicos, que por sua vez geram novos insetos pragas, e assim por diante.
Por outro lado, a presença de plantas espontâneas aumenta a biodiversidade e contribui para um melhor aproveitamento de recursos naturais como luz, calor, água e nutrientes. Ao mesmo tempo, a presença de plantas espontâneas, sob manejo, evidentemente, aumenta a produção total de biomassa por unidade de área e reduz a incidência direta de radiação solar sob a superfície do solo bem como o impacto de gotas de chuva – duas características desejáveis em regiões tropicais.
A presença de plantas espontâneas nos agroecossistemas é benéfica uma vez que elas são fonte de néctar e pólen para insetos e por aumentar a complexidade dos agroecossistemas. Assim, com a presença de plantas espontâneas são preenchidos nichos ecológicos deixados descobertos pelos monocultivos.
As relações de parasitismo e de controle biológico de pragas têm maior chance de acontecer em áreas diversificadas com plantas espontâneas. Uma extensa revisão de literatura com casos em que uma maior diversificação dos agroecossistemas resultou em menor prejuízo causado por insetos pragas foi feita por Altieri and Nicholls .
Os dados do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos revelam que as pulverizações com herbicidas nas áreas de algodão tolerante a herbicidas sofreram redução nos seus três primeiros anos e na seqüência passou a requerer doses crescentes do produto para controlar a vegetação espontânea.
No período de 9 anos, o algodão tolerante a herbicidas recebeu 12,1 mil toneladas a mais do que se esta mesma área tivesse sido plantada com variedades convencionais.
Estes dados do governo norte-americano foram sistematizados por Charles Benbrook, pesquisador e consultor autônomo, a partir dos dados produzidos pelo National Agricultural Statistics Service (NASS) do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA). Seu trabalho recebeu apoio financeiro da Union of Concerned Scientists, organização norte-americana sem fins lucrativos de cientistas independentes.
Fluxo gênico e contaminação genética
Ocorrem no Brasil variedades nativas de algodoeiro da espécie endêmica Gossypium mustelinum e variedades naturalizadas da espécie G. basbadense (rim-de-boi e macaco), além da cultivada G. hirsutum, com suas raças Marie Galante (mocó) e Latifolium (anual).
Diante da diversidade genética do algodoeiro de ocorrência no território brasileiro e de sua importância, o painel de especialistas do GMO-ERA avaliou que “a introgressão do gene Bt em algodoeiros não-transgênicos poderia exacerbar a ameaça à integridade genética da diversidade existente no Brasil do gênero Gossypium” (Embrapa, 2004) .
A contaminação genética pode ocorrer via polinização ou dispersão de sementes. Sabe-se que o algodoeiro é visitado por diferentes espécies de insetos, apesar da carência de estudos na área. Em Dourados, Mato Grosso do Sul, insetos de 9 diferentes ordens foram observados . No mais, sabe-se que a abelha africanizada e a irapuá são polinizadores efetivos da espécie .
O mesmo painel de especialistas informa sobre a possibilidade de fluxo gênico entre algodão Bt e as demais presentes no Brasil que “devemos assumir que se as diferentes formas de algodão que ocorrem no Brasil estiverem presentes a uma distância em que seja possível a transferência de polens oriundos de algodoeiros Bt, haverá possibilidade de fluxo gênico”.
Na seqüência colocam que “Uma vez que não existem barreiras genéticas capazes de isolar as populações recipientes presentes no Brasil, será impossível eliminar completamente a possibilidade de fluxo gênico entre algodão Bt e outros tipos de algodão”. O fato de a polinização ser feita principalmente pela Apis melifera, que voa grandes distâncias, reforça essa tese.
No entanto, o mesmo grupo de especialistas acredita que o fluxo gênico indesejável pode ser evitado “restringindo-se áreas em que determinadas variedades de algodão Bt possam ser cultivadas, com a exclusão de áreas críticas”.
Bibliografia:
Paschoal. A. Produção Orgânica de Alimentos: agricultura sustentável para os séculos XX e XXI. Piracicaba: Esalq/USP, 1994. 191p.
Altieri, M.A. e Nicholls, C. I. (2004). Biodiversity and pest management in agroecossistems (2nd ed.). New York: Haworth.
GMO Guidelines project – Algodão Bt. Documentos 38. EMBRAPA, 2004.
Louveira. V.A. et al., Polinização na cultura do algodoeiro; frequência e diversidade dos insetos. In: Congreso Brasileiro de Apicultura, 14, Campo Grande, MS 2002, Anais… p.28.
Sanchez Jr., Malerbo-Souza, D.T. Frequencia dos insetos na polinização e produção de algodão. Acta Scientiarium. Agronomy. V.26, n.4, p.461-465, 2004.