O Presidente Lula já abandonou qualquer veleidade de coerência nas suas atitudes em relação aos temas ambientais e agora parece abandonar também o seu discurso social com o corte de 55% do orçamento do MDA. A Ministra Marina Silva, um dos ícones dos movimentos ambientalista e social, é tratada como um estorvo no governo petista e sistematicamente derrotada em todas as suas posições em defesa de um desenvolvimento sustentável ou, pelo menos, não tão selvagem nas suas relações com o meio ambiente.
Depois de um longo debate interno e muita pressão da sociedade civil o governo prepara-se para entregar sem luta o Projeto de Lei de Biossegurança concebido originalmente no MMA,mas hoje completamente deformado na sua versão votada no Senado e que vai a votação na Câmara. As próprias ambigüidades e contradições no governo é que permitiram esta vitória das multinacionais da transgenia, pois uma posição coerente em 2003 teria liquidado a fatura.
Quem canta vitória publicamente não é a Monsanto, discreta manipuladora por trás dos bastidores e verdadeira beneficiária desta decisão, mas os grandes produtores representados na Câmara pela bancada ruralista. Ainda vamos ver estes personagens “torcer a orelha sem sair sangue” arrependidos de terem entregado seus interesses estratégicos em troca de vantagens aparentes e conjunturais.
De fato, os dados que o governo não quis pesquisar vão surgindo aos poucos. A produtividade de todas as variedades de soja transgênica se revela significativamente menor do que as convencionais recomendadas, nas pesquisas realizadas em Cruz Alta pela Fundacep. As quantidades de herbicidas aplicadas na soja transgênica são superiores em 86% àquelas aplicadas na soja convencional, nos Estados Unidos, após 9 anos de cultivo. Na Argentina não só o emprego de herbicidas aumentou em 14% na soja transgênica como o uso de outros herbicidas (necessário pela perda de eficiência do glifosato) chega a 25% do volume aplicado de glifosato após 7 anos de cultivo.
Tudo isto indica que as “vantagens” da soja transgênica se evaporam rapidamente mas a dependência dos agricultores frente aos fornecedores destas sementes é permanente. Nos EUA e na Argentina não se acham sementes de variedades convencionais e os agricultores estão presos na engrenagem.
E os mercados? A demanda de soja convencional só faz aumentar enquanto nossos deputados dão alegremente um tiro no pé liberando sem reservas os cultivos transgênicos. O argumento de que há espaço para todos os tipos de produção (transgênica, convencional e orgânica) é fruto de perigosa desinformação. Segundo o tipo de planta o nível de contaminação pode ser fatal para manter uma produção limpa. Na Europa não há proibição de plantio de transgênicos mas há um debate sobre as regras de convivência entre os diferentes tipos de cultura. A dificuldade de se estabelecer as regras é que vem impedindo os cultivos.
Aqui no Brasil quem vai garantir os interesses dos produtores orgânicos de soja? Os Ministros Furlan e Rodrigues foram prestigiar a Biofach na Alemanha e anunciam negócios da ordem de 31 milhões em exportações de produtos orgânicos brasileiros. Sabem eles que já perdemos mercado de soja orgânica na Europa por causa da contaminação por transgênicos? E os produtores de soja convencional, muito mais numerosos que os orgânicos (infelizmente)? Hoje os agricultores que não plantaram soja transgênica no Rio Grande do Sul estão sendo punidos pela cobrança da taxa tecnológica pela Monsanto porque sua produção aparece contaminada na entrega nas cooperativas.
Outros agricultores reclamam já a dificuldade de achar sementes convencionais para comprar. Porque os custos da segregação dos produtos ficarão com os que não querem plantar transgênicos? Afinal, quem “polui” as culturas alheias são os produtores de transgênicos. A Lei de Biossegurança não garante estes direitos. O resultado vai ser uma enxurrada de processos na justiça devido à contaminação de transgênicos e prejuízos para todos os produtores. É isso que quer o governo e a bancada ruralista?
Jean Marc von der Weid
AS-PTA e membro do CONDRAF.