Agrobiodiversidade – AS-PTA https://aspta.org.br Agricultura Familiar e Agro­ecologia Mon, 04 Dec 2023 14:17:59 +0000 pt-BR hourly 1 Tem semente crioula nas compras públicas, sim! A retomada do PAA-Sementes no Polo da Borborema, Paraíba https://aspta.org.br/2023/11/16/tem-semente-crioula-nas-compras-publicas-sim-a-retomada-do-paa-sementes-no-polo-da-borborema-paraiba/ https://aspta.org.br/2023/11/16/tem-semente-crioula-nas-compras-publicas-sim-a-retomada-do-paa-sementes-no-polo-da-borborema-paraiba/#respond Thu, 16 Nov 2023 20:37:54 +0000 https://aspta.org.br/?p=20396 A compra de sementes crioulas por meio do Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) foi uma conquista das guardiãs, guardiões, dos movimentos sociais e de base que atuam na conservação, resgate e reprodução da agrobiodiversidade. Desde 2003, na criação do Programa, tem sido operada a modalidade de doação de sementes. As experiências pilotos aconteceram na … Leia mais

O post Tem semente crioula nas compras públicas, sim! A retomada do PAA-Sementes no Polo da Borborema, Paraíba apareceu primeiro em AS-PTA.

]]>
Foto: Josemar Gonçalves

A compra de sementes crioulas por meio do Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) foi uma conquista das guardiãs, guardiões, dos movimentos sociais e de base que atuam na conservação, resgate e reprodução da agrobiodiversidade. Desde 2003, na criação do Programa, tem sido operada a modalidade de doação de sementes. As experiências pilotos aconteceram na Paraíba, visando fortalecer a autonomia das famílias e recompor os Bancos de Sementes após um longo período de seca. As experiências cotidianas influenciaram o arranjo das políticas públicas, evidenciando o enraizamento nos territórios como fundamental e necessário às políticas de fortalecimento da agroecologia.

Ainda que reconhecida internacionalmente como uma estratégia de enfrentamento à fome e fortalecimento da agricultura de base familiar, pela conexão entre quem produz alimentos saudáveis e de qualidade e as pessoas em situação de vulnerabilidade social, o PAA entrou em um processo de desmonte. O Programa foi alvo de criminalizações iniciadas em 2013 e alvo de um arsenal antidemocrático que se alastrou pelo país nos últimos, sobretudo, sete anos. Desde então o PAA sofreu sucessivos cortes orçamentários, além de redefinição do escopo através do programa Alimenta Brasil, que, dentre outras coisas, previa o corte da modalidade de doação de sementes.

Em 2023, na retomada democrática do Brasil, o PAA foi relançado, animando e reafirmando que sem democracia não há agroecologia. Na Paraíba, mais uma vez os Bancos de Sementes e as famílias guardiãs se tornaram parte dessa história, conectando sementes, alimentos e segurança e soberania alimentar e nutricional. O último projeto havia sido aprovado em 2011, devido a uma série de restrições impostas, o que foi reduzindo a possibilidade de participação das famílias.

Ainda que sem acesso a recursos públicos, o trabalho com as sementes seguiu sendo realizado no território. Os diferentes mercados, nos quais as sementes da “paixão” são comercializadas, seja em grãos ou por meio de beneficiamentos, como é o caso do cuzcuz e do fubá, se tornaram estratégias cotidianas. Estes têm se constituído entre as comunidades, assim como de forma mais ampla.  Nas feiras e Quitandas, foram comercializadas em 2022 mais de 14.600 kg de milho para a produção dos derivados de milhos e 4.264 kg de sementes empacotadas. Mercados que se caracterizam pela governança coletiva, por meio da atuação das associações e cooperativas da agricultura de base familiar.

Esses acúmulos e a ação coletiva ganharam novos contornos em 2023 com o novo acesso do território ao PAA, na modalidade Doação Simultânea de Sementes. Juntas, as famílias irão comercializar um volume de 8.490 kg, totalizando 05 variedades de feijão (carioca, mulatinho, faveta, preto, rosinha)  e 02 de milho (pontinha e jabatão), movimentando R$103.146,60. O Projeto aprovado foi proposto pela CoopBorborema e a entidade beneficiária é o Polo da Borborema e sua rede de 60 Bancos de Sementes.

A ação em rede e territorializada organizada no Polo da Borborema têm tanto permitido a qualificação das políticas públicas, incentivando desenhos criativos e novos arranjos dos instrumentos, quanto construído caminhos em momentos críticos, como os atravessados recentemente. As políticas públicas constituídas a partir dos territórios demonstram sua resiliência ao se valerem do encontro profícuo entre Estado e sociedade, neste caso, quem ensina e aponta caminhos são as sementes e as famílias guardiãs.

 

O post Tem semente crioula nas compras públicas, sim! A retomada do PAA-Sementes no Polo da Borborema, Paraíba apareceu primeiro em AS-PTA.

]]>
https://aspta.org.br/2023/11/16/tem-semente-crioula-nas-compras-publicas-sim-a-retomada-do-paa-sementes-no-polo-da-borborema-paraiba/feed/ 0
6ª edição da Partilha Solidária une Agroecologia e Solidariedade https://aspta.org.br/2023/11/14/6a-edicao-da-partilha-solidaria-une-agroecologia-e-solidariedade/ https://aspta.org.br/2023/11/14/6a-edicao-da-partilha-solidaria-une-agroecologia-e-solidariedade/#respond Tue, 14 Nov 2023 18:27:01 +0000 https://aspta.org.br/?p=20392 O sol do último sábado, 11/11, movimentou a Feira Orgânica de Palmeira, que acontece há 23 anos na Praça do Cemitério. Organizada pelo Grupo São Francisco de Assis de Agroecologia, as manhãs são momentos de aproximar quem produz de quem consome. O intuito é valorizar o trabalho da agricultura familiar agroecológica, reforçando a importância de … Leia mais

O post 6ª edição da Partilha Solidária une Agroecologia e Solidariedade apareceu primeiro em AS-PTA.

]]>
O sol do último sábado, 11/11, movimentou a Feira Orgânica de Palmeira, que acontece há 23 anos na Praça do Cemitério. Organizada pelo Grupo São Francisco de Assis de Agroecologia, as manhãs são momentos de aproximar quem produz de quem consome. O intuito é valorizar o trabalho da agricultura familiar agroecológica, reforçando a importância de comprar direto de quem produz, reconhecendo a origem dos alimentos.

Nesta edição, houve a 6ª Partilha da Agroecologia, com alimentos produzidos pelo grupo, convidando aos que passavam ali a conhecer a produção agroecológica. Para expressar a diversidade das propriedades foi construída, coletivamente, a tradicional mandala da agrobiodiversidade. Os feirantes trouxeram para o centro seus alimentos, sementes, mudas, flores e ervas medicinais. Ao final a mandala foi partilhada.

“É uma opção com qualidade de vida, você poder comprar o produto orgânico e saber que não tem uso de agrotóxico, você aproveita tudo, desde a casca às folhas, eu aproveito tudo o que dá dos produtos orgânicos, além de encontrar as pessoas, formar amizades, hoje eu conheço todos os feirantes, se eu não posso vir na feira, eles me entregam ou reservam os alimentos pra mim”, comenta Solange, uma consumidora assídua da feira.

Um momento importante na programação da partilha foi a benção interreligiosa dos alimentos e da produção dos agricultores, foi um ponto de união, agradecimento e benção feita por representantes da igreja católica, menonita, luterana e religião de matriz africana.

Destacamos como caráter importante desta partilha o olhar solidário para as famílias em vulnerabilidade do município, onde lançamos a Campanha do Alimento Solidário. Os consumidores são convidados a doar alimentos, de preferência agroecológica dos próprios feirantes, e depositar nas caixas de coleta que ficarão permanentemente junto a feira. Ao final da feira estes alimentos são destinados as famílias em situação de vulnerabilidade, possibilitando acesso a alimentos saudáveis, de qualidade e sem o uso de agrotóxicos, produzidos de forma socialmente justa, ambientalmente correta e economicamente viável.

Neste primeiro ato da campanha a entidade que recebeu as doações foi o Serviço de Fortalecimento de vínculos da Associação Menonita Brasileira (AMB). A expectativa é que a campanha se espalhe em mais locais e envolvendo mais organização do município.

O post 6ª edição da Partilha Solidária une Agroecologia e Solidariedade apareceu primeiro em AS-PTA.

]]>
https://aspta.org.br/2023/11/14/6a-edicao-da-partilha-solidaria-une-agroecologia-e-solidariedade/feed/ 0
Feira evidencia potencial da Borborema Agroecológica como território produtor de alimentos saudáveis https://aspta.org.br/2023/10/23/feira-evidencia-potencial-da-borborema-agroecologica-como-territorio-produtor-de-alimentos-saudaveis/ https://aspta.org.br/2023/10/23/feira-evidencia-potencial-da-borborema-agroecologica-como-territorio-produtor-de-alimentos-saudaveis/#comments Tue, 24 Oct 2023 01:05:26 +0000 https://aspta.org.br/?p=20323 Antes das 7h da manhã, muitas barracas da feira já estavam recheadas de alimentos sagrados produzidos pelas agricultoras e agricultores familiares que fazem parte da dinâmica do Polo da Borborema. Realizada dois dias depois do Dia Mundial da Alimentação (16/10), a feira fez parte da programação da 2ª Festa da Colheita das Famílias Guardiãs das … Leia mais

O post Feira evidencia potencial da Borborema Agroecológica como território produtor de alimentos saudáveis apareceu primeiro em AS-PTA.

]]>
Antes das 7h da manhã, muitas barracas da feira já estavam recheadas de alimentos sagrados produzidos pelas agricultoras e agricultores familiares que fazem parte da dinâmica do Polo da Borborema. Realizada dois dias depois do Dia Mundial da Alimentação (16/10), a feira fez parte da programação da 2ª Festa da Colheita das Famílias Guardiãs das Sementes da Paixão do Polo da Borborema.

Aconteceu em Remígio, um dos 13 municípios que integram o território da Borborema Agroecológica, área de atuação do Polo e da AS-PTA na Paraíba. E foi uma feira e tanto. A animação estava tão forte quanto o sol do Semiárido que esquentava o asfalto e fazia subir um calor mais devastador do que o que vinha do céu.

Eram 20 barracas de feira ocupadas por uma diversidade de sementes da paixão, além de alimentos cultivados e beneficiados em nove municípios. Dez delas continham instalações pedagógicas e materiais informativos que denunciavam as ameaças à agricultura familiar de base agroecológica no território, assim como anunciavam ações e pesquisas que fortalecem e valorizam o trabalho de quem se dedica a cultivar o solo. 

Entre os/as participantes, destaque especial para os/as guardiões e guardiãs da biodiversidade, chamadas na Paraíba, de sementes da Paixão. Em muitas barracas e tendas, as sementes crioulas de variedades diversas tinham lugar de honra.

Dona Ritinha, da comunidade Benefício, no município de Esperança, levou 16 saquinhos com sementes de rosa do deserto para vender. Uma das principais fontes de renda dela são as plantas ornamentais, suculentas e medicinais. Ela vende tanto mudas, quanto as sementes, que garantem uma renda contínua, que se soma ao apurado da venda dos ovos de capoeira e das galinhas e das polpas de acerola e maracujá, que reforça o orçamento no período da estiagem.

Para essa feira, dona Ritinha tinha uma expectativa: levantar R$180,00 para comprar um carro pipa de 11 mil litros para regar suas plantinhas. O tanque, a fonte de água para matar a sede delas, secou. “Só tenho a água da minha cisterna. Eu gasto, em oito dias, cerca de 1,3 mil litros de água com as plantinhas. Não dá pra usar da água da cisterna”, contou ela. Antes do final da manhã, Dona Ritinha já tinha superado a meta de arrecadação. E não cabia de felicidade.

Outro guardião feliz da vida na feira foi seu Paulo Alexandre, de Lagoa do Jogo, em Remígio. Ele conseguiu adquirir novamente uma semente que tinha perdido lá pros idos de 1995. E, como dona Ritinha, era só felicidade. 

“Faz tempo que eu queria encontrar esse feijão”, disse ele. E como é o sabor dele, seu Paulo? “É muito saboroso. Tem uma pele bem fininha, muito bom de se comer. E é um feijão enramador, que se espalha. Dá para colher umas 10 a 12 vezes sem o pé morrer. É uns dois meses de colheita. O feijão que não tem rama, dá pra apanhar só duas vezes”, disparou.

E o senhor vendeu alguma semente hoje? “Sim! Eu trouxe 18 garrafas PET (de dois litros) com feijão carrapato, mulatinho de cacho e carioca tochinha, e só tenho duas agora”, assegurou quando o relógio marcava um pouco mais das 11h da manhã. Levando em consideração que a feira se estendeu até 15h, é bem provável que tenha vendido as garrafas restantes.

Na frente das barracas de alimentos, estavam as tendas informativas sobre vários assuntos: impactos das indústrias de energia renovável na produção dos alimentos e na vida das famílias rurais; atividades desenvolvidas pela juventude camponesa; ações do Polo e da AS-PTA direcionadas para crianças e adolescentes do campo; formas de controle biológico de doenças e pragas nos cultivos agroecológicos, em vez do uso de defensivos químicos com alto teor de toxicidade prejudicial para a vida.

Participações especiais – Também havia barracas disponíveis para apresentação de ações do poder público municipal nas áreas da educação e agricultura. A tenda da educação estava ocupada pelos alunos do ensino médio da Escola Cidadã Integral Técnica (ECIT) José Bronzeado Sobrinho.

A professora Christina Lima e alguns estudantes apresentaram diversos experimentos. Um deles era uma maquete que tornava visível os danos causados pelos parques eólicos depois de alguns anos de funcionamento. A miniatura reproduzia uma comunidade rural com casas e cisternas rachadas ladeadas pelos gigantes aerogeradores.

“Chegamos aqui por conta das Marcha”, afirmou Kayky dos Santos, 17 anos, aluno do 2ª ano do colégio. “Nós participamos, junto à professora Christina, da Marcha de Solânea e Montadas e estamos discutindo sobre o tema na escola”.

Depois de vocês falarem sobre os impactos, o que as pessoas comentam? “Apesar delas pensarem que é uma energia boa, quando a gente começa a falar, eles começam a ter dúvidas (com relação da certeza anterior)”, respondeu Kayky, que nasceu e mora na rua de Remígio e seus avós maternos e mãe são de sítio em Algodão de Jandaíra. “Eu ia sempre pro sítio nos finais de semana. Minha mãe plantava roçado”, contou. De uns tempos pra cá, por conta da violência, seus avôs já aposentados também migraram pra rua.

Comida de chefs – Outros convidados de honra foram dois ecochefs, Eliane Régis, natural de Campina Grande, e Adilson Santana, de João Pessoa. Eles fazem parte do movimento Slow Food que entende o ato de alimentar-se relacionado à identidade cultural, ao território, às memórias, à história, ao patrimônio. Ou seja: a alimentação como um ato político que está inserido num contexto econômico, social e político.

Acompanhados pela cozinheira de Remígio, Lourdes Rodrigues, os dois ecochefs prepararam petiscos a partir dos alimentos cultivados e beneficiados no território, como o Fubá da Paixão, um dos produtos elaborados a partir do milho livre de agrotóxicos e transgênicos cultivados na Borborema Agroecológica.

Visitantes latinos americanos – O terceiro grupo de convidados especiais são jovens de vários territórios do Semiárido brasileiro, espalhados tanto na Paraíba como em mais sete estados – SE, BA, PE, RN, CE, PI e MA – além de hermanos y hermanas da Argentina, El Salvador e Guatemala.

Essa juventude faz parte das ações da iniciativa DAKI – Semiárido Vivo, um programa de formação e intercâmbio de conhecimentos entre populações rurais das regiões secas da América Latina: Semiárido brasileiro, o Chaco Argentino e o Corredor Seco da América Central.

Financiado pelo FIDA (Fundo Internacional de Desenvolvimento Agrícola), o DAKI é uma ação realizada pela Articulação Semiárido Brasil e Plataforma Semiáridos, ambas são redes de organizações da sociedade civil que atuam no fortalecimento da agricultura familiar de base agroecológica.

O post Feira evidencia potencial da Borborema Agroecológica como território produtor de alimentos saudáveis apareceu primeiro em AS-PTA.

]]>
https://aspta.org.br/2023/10/23/feira-evidencia-potencial-da-borborema-agroecologica-como-territorio-produtor-de-alimentos-saudaveis/feed/ 1
“Nosso território é de resistência” https://aspta.org.br/2023/10/22/nosso-territorio-e-de-resistencia/ https://aspta.org.br/2023/10/22/nosso-territorio-e-de-resistencia/#respond Sun, 22 Oct 2023 23:56:30 +0000 https://aspta.org.br/?p=20315 Independente do assunto tratado no 1º dia da Festa da Colheita, em Remígio/PB, a síntese sempre reforçava essa certeza  Como não há alimentação saudável, sem semente livre de veneno e transgênicos, nada mais adequado do que celebrar as Sementes da Paixão na semana do Dia Mundial da Alimentação (16.10).  No território da Borborema Agroecológica, no … Leia mais

O post “Nosso território é de resistência” apareceu primeiro em AS-PTA.

]]>
Independente do assunto tratado no 1º dia da Festa da Colheita, em Remígio/PB, a síntese sempre reforçava essa certeza 

Como não há alimentação saudável, sem semente livre de veneno e transgênicos, nada mais adequado do que celebrar as Sementes da Paixão na semana do Dia Mundial da Alimentação (16.10). 

No território da Borborema Agroecológica, no Semiárido da Paraíba, na terça e quarta-feira passadas (17 e 18), foi realizada a 2ª Festa da Colheita das Famílias Guardiãs das Sementes da Paixão da Borborema. Dos 13 municípios de atuação do Polo da Borborema, o que sediou o evento foi Remígio.

O primeiro dia da Festa da Colheita reuniu gestores e gestoras dos bancos comunitários de sementes para olhar para as estratégias de proteção e multiplicação das Sementes da Paixão, assim como para as ameaças ao patrimônio genético guardado pelas famílias agricultoras.

No dia 17 pela manhã, os/as participantes circularam por carrossel de experiências sobre quatro temáticas: acesso a mercado e o direito humano à alimentação saudável; mulheres em defesa do território ameaçado pelas indústrias de energia renovável; leis municipais de compra e distribuição das sementes crioulas de Montadas e Lagoa Seca; e as sementes crioulas e o resgate das culturas de renda do território, através dos consórcios agroecológicos.

“Pra mim, a maior lição do carrossel é a resistência. Estamos num país capitalista, no qual as indústrias que produzem as sementes, produzem também o veneno e os medicamentos. Os venenos nos adoecem. Os remédios são para tratar as doenças provocadas pelos agrotóxicos. Num país desse, a gente tem conseguido implantar uma ação de proteção das sementes crioulas e tem colocado o poder público contra esse sistema. Em nossa região, temos três municípios com leis e programas de compras de nossas sementes crioulas para distribuição para as famílias agricultoras. Isso só existe por conta da nossa resistência. E a chefe de tudo é a nossa organização social. Se não tiver ela, não há resistência”, comentou Seu Manoel Oliveira, conhecido como Nequinho, presidente do Sindicato de Alagoa Nova, da coordenação do Polo da Borborema, e uma das lideranças mais antigas da luta pela terra na região.

“O bom militante não pode abandonar a luta por conta das ameaças”, acrescentou ele trazendo à lembrança os tempos em que conviveu com Margarida Maria Alves. A sindicalista foi assassinada porque defendia os direitos dos trabalhadores rurais no início da década de 1980, numa época em que o poderio dos coronéis era a lei local. Hoje, as ameaças que o território passa são outras, mas são forças potentes, que têm o poder econômico e político nas mãos, como as megacorporações internacionais do setor de energia renovável e de alimentação.

Pesquisas participativas – Na tarde do primeiro dia, foram apresentados os percursos de pesquisas participativas feitas pelas universidades públicas da região – estadual e federal da Paraíba – com envolvimento das famílias agricultoras. Tais pesquisas foram realizadas para superar desafios enfrentados nos cultivos da batata inglesa, por exemplo. Desde 2014 que a UEPB vem desenvolvendo estudos para fortalecer o cultivo desse tubérculo que já foi uma forte fonte de renda para as famílias locais.

A outra pesquisa apresentada é o monitoramento dos estoques dos bancos de sementes comunitários, que são cerca de 60 na região de atuação do Polo da Borborema. A pesquisa levanta informações para a tomada coletiva de decisão sobre algumas questões como as estratégias para ‘salvar’ algumas variedades do estoque em estado crítico – com menos de dois quilos e localizado em apenas um banco comunitário de sementes. “A comissão de sementes do Polo deve se reunir e decidir o que fazer para não perder essas sementes”, comentou a professora e doutora em Engenharia de Produção, Christine Saldanha, da Universidade Federal da Paraíba (UFPB).

No final dessa mesa, uma frase de Roselita Vitor, uma das lideranças do Polo da Borborema, sintetizou bem a grandiosidade das iniciativas de construção do conhecimento agroecológico e fez referência à ameaça que ronda o território e pode pôr tudo a perder: “O dinheiro que as empresas estão oferecendo não dão conta da riqueza que estamos vendo aqui.”

Incidência política – Na segunda metade da tarde, houve mais uma mesa dedicada aos programas e políticas públicas que fortalecem as sementes da Paixão e os conhecimentos tradicionais associados a elas. Foi a vez de ouvir o secretário de Agricultura de Lagoa Seca, Nelson Anacleto, que pôs em prática a compra e distribuição das sementes crioulas das e para as famílias agricultoras do município; o representante da Conab na Paraíba, Anderson Nascimento, que levou um contrato do Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), na modalidade Sementes, para ser assinado pela CoopBorborema no valor de mais de R$ 103 mil.

Esse contrato prevê a compra de Sementes da Paixão para o Banco Mãe do território que, por sua vez, distribuirá para os bancos comunitários a partir das necessidades apresentadas. “Esse é o terceiro contrato assinado pela CoopBorborema. Isso nos diz que os/as agricultores/as sabem administrar muito bem os recursos, inclusive, os de políticas públicas”, pontuou a presidenta da cooperativa, Gizelda Beserra. A Coop começou a operar no início de 2021, no meio da pandemia e durante o governo que deixou de apoiar a agricultura familiar e a agroecologia.

Nesta mesa, também falaram o representante da Secretaria Estadual da Agricultura Familiar e Desenvolvimento do Semiárido, Jaílson Lopes, que apresentou as iniciativas em construção para acessar recursos públicos até então direcionados para empresas de sementes. Uma destas iniciativas é a Lei da Agrobiodiversidade, aprovada no primeiro semestre deste ano, e que tem duas vertentes: um programa de fortalecimento da rede de bancos comunitários de sementes da Paraíba e a construção de um plano de estímulo às sementes crioulas.

Por fim, a representante da Vert, empresa francesa de tênis, Valdirene de Sá, falou do que significa comprar da CoopBoborema a produção de algodão agroecológico da Borborema. 

A última fala da tarde reforçou o que disse Nequinho, no encerramento das atividades da manhã. Desta vez, foi Luciano Silveira, da AS-PTA, quem ressaltou o tamanho da resistência que o Polo da Borborema orquestra no território, tendo parcerias importantíssimas como as instituições públicas de ensino e pesquisa. 

“Estamos resistindo a grandes corporações que querem controlar a produção de alimentos no mundo. É um projeto grande e poderoso. E nosso trabalho formiguinha diz ‘não’ a tudo isso. Construímos um movimento de resistência alinhado à universidade, que vem promovendo a ruptura com o projeto de privatização dos recursos naturais. Hoje, passamos o dia falando que o nosso território é de resistência”.

Clique AQUI e saiba como foi a Feira da Festa da Colheita.

O post “Nosso território é de resistência” apareceu primeiro em AS-PTA.

]]>
https://aspta.org.br/2023/10/22/nosso-territorio-e-de-resistencia/feed/ 0
Dia Mundial da Alimentação: Quando famílias agricultoras se livram dos atravessadores, não é só a renda que melhora. A alimentação também. https://aspta.org.br/2023/10/16/dia-mundial-da-alimentacao-quando-familias-agricultoras-se-livram-dos-atravessadores-nao-e-so-a-renda-que-melhora-a-alimentacao-tambem/ https://aspta.org.br/2023/10/16/dia-mundial-da-alimentacao-quando-familias-agricultoras-se-livram-dos-atravessadores-nao-e-so-a-renda-que-melhora-a-alimentacao-tambem/#respond Mon, 16 Oct 2023 23:59:02 +0000 https://aspta.org.br/?p=20310 Onde há pobreza, há fome. Desde 2010, a ONU alerta que 70% das pessoas em situação de extrema pobreza, em todo o mundo, estão na zona rural. No Brasil, não é diferente: nos lugares onde vivem os agricultores familiares é onde se concentra grande parte das pessoas que passam fome. Uma das grandes contradições dos … Leia mais

O post Dia Mundial da Alimentação: Quando famílias agricultoras se livram dos atravessadores, não é só a renda que melhora. A alimentação também. apareceu primeiro em AS-PTA.

]]>
Onde há pobreza, há fome. Desde 2010, a ONU alerta que 70% das pessoas em situação de extrema pobreza, em todo o mundo, estão na zona rural. No Brasil, não é diferente: nos lugares onde vivem os agricultores familiares é onde se concentra grande parte das pessoas que passam fome. Uma das grandes contradições dos tempos atuais.

Para além das políticas Um dos caminhos que reduz a fome e a pobreza na zona rural são os mercados territoriais, como as feiras agroecológicas e pontos fixos que vendem alimentos produzidos nas redondezas, sem uso de veneno de nenhum tipo e com cuidado com o meio ambiente, com as mulheres e os/as jovens.

Esses mercados territoriais são locais onde as famílias agricultoras podem vender os alimentos que produzem, livrando-se dos atravessadores. Além disso, dispor de um lugar de comercialização de seus produtos por preços justos também estimula as famílias agricultoras a diversificar a produção.

Isso aconteceu com a família de Seu Severino Marques, 50 anos, e dona Rosélia Marques, 38, da comunidade Xique-Xique, em Remígio. A vida deles mudou bastante quando passaram a vender o que cultivavam na Quitanda da Borborema de Remígio e também na Feira Agroecológica do mesmo município.

Antes disso, o que produziam – algumas frutas, como laranja, e raízes como batata-doce e macaxeira – eram vendidos para atravessadores. “A preço de banana”, contou ele. “Desde 2020, vendo meus produtos na Quitanda de Remígio. E, há um ano e dois meses, tenho minha barraca na feira agroecológica. Se soubesse que era bom assim, tinha entrado na feira há mais tempo”, acrescentou.

Ele estima que, desde então, sua renda aumentou cerca de 50%. Além disso, eles começaram a produzir mais alimentos: cebolinha, tomate, coentro, espinafre e couve. Essa produção vai tanto pra mesa deles, quanto para a Quitanda e a feira.

“Antes, eu comprava tomate na feira (livre) para consumir em casa. Agora, como da minha roça mesmo. Quase não compro mais o que a gente come. Só trago de fora a carne, bolacha, açúcar, café. Até o cuscuz, o munguzá e o arroz, eu procuro comprar na Quitanda”, comentou ele destacando a qualidade dos produtos vendidos lá, livres de venenos e de transgênicos.

Na Feira Agroecológica de Remígio, além de seu Severino e dona Rosélia, a filha mais velha Simone (23), casada há mais de dois anos, passou a ter seu banco. A especialidade dela são os alimentos cozidos: galinha guisada, macaxeira, cuscuz, batata-doce e inhame. “Ela tem um mês na feira e está super satisfeita. Antes, o que ela produzia era para consumo da família e vendia as galinhas da criação para os atravessadores”, explicou seu Severino.

Na semana do Dia Mundial da Alimentação, a família vai ter mais um local de venda de seus produtos. Na quarta-feira, dia 18, das 7h às 15h, Remígio vai sediar a 2ª Festa da Colheita das Famílias Guardiãs das Sementes da Paixão da Borborema.

O evento, que acontecerá na rua da prefeitura do município, vai funcionar como uma feira do mangaio, de tudo vai ter. Barracas para comercialização de alimentos saudáveis in natura ou beneficiados; barracas para venda e trocas de sementes; e barracas para divulgação de pesquisas desenvolvidas pelas universidades da Paraíba (estadual e federal) em parceria com as famílias agricultoras para desenvolver controles biológicos (sem veneno) de fungos e pragas em cultivos como o da batata inglesa e erva-doce.

Também vai ter barracas para denunciar as ameaças a toda essa produção de alimentos saudáveis, como a chegada das indústrias de energia eólica e solar no território da Borborema. Outras barracas vão mostrar as ações que os/as jovens agricultores/as estão envolvidos/as, como a criação de animais de raças nativas, criação de abelhas e os fundos rotativos solidários. E, para encerrar, vai ter uma ala de barracas para divulgar ações públicas nas áreas de educação, assistência social e agricultura.

Além disso, ainda estão previstas na Festa da Colheita: a Mesa da Fartura cheia de sementes da paixão para trocas; apresentações de grupos artísticos locais como uma dupla de violeiros e uma banda de forró e uma cozinha onde dois EcoChefs vão elaborar comidinhas a partir dos alimentos regionais que fazem parte da cultura alimentar da região.

A 2ª Festa da Colheita está sendo organizada pelo Polo da Borborema e pela AS-PTA, com apoio da Prefeitura de Remígio, Fundação Laudes, Vert, ActionAid, Misereor, terre des hommes e CCFD.

O Polo da Borborema é um coletivo que envolve 13 sindicatos rurais e cerca de 150 associações comunitárias dos seguintes municípios: Queimadas, Massaranduba, Alagoa Nova, Lagoa Seca, São Sebastião de Lagoa de Roça, Esperança, Montadas, Remígio, Areial, Casserengue, Solânea, Matinhas, Algodão de Jandaíra.

Estudo sobre os mercados territoriais – Os benefícios que os mercados territoriais trazem para as famílias agricultoras foram objeto de estudo realizado pela Rede ATER Nordeste de Agroecologia, que envolve 12 organizações de seis estados da região. Na Paraíba, duas ONGs fazem parte: a AS-PTA e o Patac.

Do estudo, foi feita uma publicação “Mercados Territoriais: trajetórias, efeitos e desafios”. Acesse aqui a publicação em PDF: https://aspta.org.br/files/2022/06/Mercados_Territoriais.pdf

O post Dia Mundial da Alimentação: Quando famílias agricultoras se livram dos atravessadores, não é só a renda que melhora. A alimentação também. apareceu primeiro em AS-PTA.

]]>
https://aspta.org.br/2023/10/16/dia-mundial-da-alimentacao-quando-familias-agricultoras-se-livram-dos-atravessadores-nao-e-so-a-renda-que-melhora-a-alimentacao-tambem/feed/ 0
O sítio virou parque eólico https://aspta.org.br/2023/09/11/o-sitio-virou-parque-eolico/ https://aspta.org.br/2023/09/11/o-sitio-virou-parque-eolico/#respond Mon, 11 Sep 2023 18:16:30 +0000 https://aspta.org.br/?p=20250 Dados recentes do IPCC, o Painel Intergovernamental da ONU sobre Mudanças Climáticas, revelam que os setores de energia, indústria, transporte e construção são responsáveis juntos por 79% das emissões de gases de efeito estufa, que contribuem diretamente para a alteração do clima. Essa situação coloca na ordem do dia a busca por fontes energéticas renováveis … Leia mais

O post O sítio virou parque eólico apareceu primeiro em AS-PTA.

]]>
Dados recentes do IPCC, o Painel Intergovernamental da ONU sobre Mudanças Climáticas, revelam que os setores de energia, indústria, transporte e construção são responsáveis juntos por 79% das emissões de gases de efeito estufa, que contribuem diretamente para a alteração do clima. Essa situação coloca na ordem do dia a busca por fontes energéticas renováveis e menos poluentes, como a solar e a eólica, entre outras.

Já há alguns anos a região nordeste do país vem sendo apontada como grande candidata a produtora de energias limpas em razão da presença de sol e ventos constantes ao longo do ano. Poderia ser uma oportunidade não só de reduzir a dependência do país em relação ao petróleo como também mudar o padrão da matriz energética, projetando um sistema descentralizado e ao mesmo tempo integrado de geração de energia a partir de fontes renováveis. Mas não é bem isso o que está acontecendo.

A região Nordeste é hoje responsável por 86% da produção de energia eólica do Brasil, com destaque para a Caatinga, que abriga 78% de todas as turbinas instaladas no país. São 890 desses parques no Brasil, responsáveis por 13% de toda energia elétrica gerada. Até o fim do ano, a expectativa do setor é chegar a mil usinas. Os parques eólicos e as fazendas solares chegaram ao Semiárido com uma promessa de energia limpa, com retornos ambientais e financeiros para as comunidades. No entanto, os relatos das famílias que receberam torres eólicas em suas áreas ou na redondeza são o extremo oposto.

Famílias agricultoras do agreste pernambucano relatam infertilidade de animais, mortes e desaparição de espécies nativas. “Depois da implantação muitos animais cismaram e fugiram daqui”, declara uma agricultora da região que tem os aerogeradores instalados a apenas 150 metros de sua casa. Devido ao barulho dos aerogeradores, problemas de saúde como insônia, ansiedade, depressão e perda da audição se tornaram comuns entre os agricultores do local. O barulho dos motores é ininterrupto e perturbador. Para muitos, dormir agora só é possível com a ajuda de remédios. “O remédio para dor de cabeça era de 25 miligramas, agora é de 100. O para ansiedade era de 10, agora é de 150. O remédio para dormir era só um, agora são quatro. E, mesmo assim, não consigo dormir”, relata uma agricultora de Caetés, Pernambuco, atingida por um empreendimento eólico. Mesmo casas que não recebem as torres podem ser afetadas pela proximidade das instalações em casas vizinhas. Há casas em Caetés que estão a 150 metros de uma torre eólica. (Para conhecer mais as comunidades de Caetés assista Vento Agreste)

Há ainda situações em que as casas são afetadas e sofrem rachaduras causadas por explosões de pedras que são removidas para a instalação das torres. Moradores relatam que nunca obtiveram retorno das empresas responsáveis. Há também relatos de rachaduras nos solos e nas cisternas e casas dos moradores da região, que em alguns casos levou os agricultores a abandonarem suas casas e se mudarem para a cidade.

Relatório Anual do Desmatamento (RAD), divulgado pelo MapBiomas, revelou que, em 2022, mais de 4 mil hectares da caatinga foram desmatados devido às atividades das usinas de energia eólica e solar, incluindo as linhas de transmissão. Destes, segundo o relatório, os empreendimentos eólicos respondem por 1.087 ha. Em Pedra Lavada, na divisa RN-PB, a instalação do parque eólico da pode desmatar 1.600 ha de Caatinga, afetando a infiltração da água e recarga do lençol freático e aumentando a erosão.

Além da questão dos ruídos que não param, famílias atingidas relatam aumento do rompimento de laços comunitários por conta das negociações com as empresas. A abordagem das empresas é individual e sem dialogar com entidades representativas ou coletivas. A presença de representantes das empresas nos territórios enseja boatos de que um morador ou outro possa já estar negociando o arrendamento ou de que o valor do arrendamento de um terreno seja superior aos demais.

“É uma estratégia da empresa e isso é preocupante, porque muitas famílias estão sofrendo caladas”, adiciona. “Os que estão recebendo foram recomendados a não dar depoimento. As famílias não querem falar, porque o contrato de reforma assinado com a empresa também indica isso”, revelou um agricultor de Pernambuco ao Brasil de Fato. Os contratos de cessão de uso retiram das famílias agricultoras a autonomia sobre a gestão do uso do seu território. Espécies como coco, manga e caju são proibidas de ser cultivadas para não interferirem na captação dos ventos (confira aqui fotos produzidas pela ONG Conectas de empreendimentos eólicos na Chapada do Araripe).

Também na região, pesquisa com os moradores identificou o caso de uma comunidade que havia ingressado com o pedido para seu reconhecimento enquanto comunidade remanescente de quilombola. Mas representantes das empresas passaram a sugerir que o reconhecimento da comunidade como quilombola poderia atrapalhar no arrendamento dos terrenos. Como resultado, os próprios moradores passaram a evitar seguir com o processo e a suspender o envio da documentação necessária para a emissão do certificado. (Assista a respeito Os donos dos ventos).

A BBC News Brasil teve acesso a dois contratos oferecidos a agricultores por duas empresas diferentes em cidades do Nordeste. Além de autorizar a transferência da terra para outra empresa sem a necessidade do aval do proprietário, um dos documentos afirma que o contrato tem duração de 49 anos e informa que só pode ser rescindido pelo agricultor em “comum acordo” com a companhia. Por outro lado, as empresas têm o direito de quebrar o contrato a qualquer momento, sem custos, se o imóvel tiver algum problema que atrapalhe a produção. Ainda segundo a matéria da BBC, caso o proprietário descumpra obrigações que tenham força para rescindir o contrato, como o pagamento de taxas e impostos, a empresa pode cobrar uma multa de 30 vezes o valor recebido por ano pela energia gerada.

Isso tem acontecido porque como os empreendedores do setor geralmente não possuem terras no Brasil rural, o arrendamento por longos períodos é a forma mais comum de acesso aos territórios para a instalação das turbinas. Os territórios tradicionais nunca regularizados pelo poder público passaram então a ser alvo dessas empresas. Um mapeamento realizado pela UFBA identificou 585 associações de fundo de pasto e 1.092 comunidades vinculadas a elas na Bahia, mas o número pode ser muito maior.

Duas questões-chave nesse processo são a desorganização das comunidades e coletivos a partir da chegada das empresas no território e a obrigatoriedade de sigilo absoluto em torno da assinatura dos contratos, o que mantém as famílias isoladas com medo das altas multas contratuais. Na Paraíba, Ministério Público e Defensoria foram acionados pela sociedade civil para interceder contra medida do Conselho de Proteção Ambiental do Estado que derrubou a exigência constitucional de apresentação do estudo de Impacto ambiental e do relatório de impacto ao meio ambiente (EIA/Rima) na fase do requerimento de licença prévia.

Para o MPF, a consulta às comunidades tradicionais sobre licenças concedidas sem estudo de impacto ambiental deve ser feita pelos órgãos competentes e as licenças devem ser suspensas até que uma consulta prévia livre e informada seja realizada. As comunidades tradicionais têm formas próprias de organização social, ocupam e usam territórios e recursos naturais como condição para sua reprodução cultural, social, religiosa, ancestral e econômica. Por isso, é fundamental que sejam consultadas previamente sobre projetos que possam impactar suas vidas, como manda a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho.

Em março último, pelo segundo ano consecutivo, a Marcha Pela Vida das Mulheres e pela Agroecologia, organizada pelo Polo da Borborema e AS-PTA, na Paraíba, levou milhares de mulheres às ruas para denunciar os impactos causados pelo atual modelo de exploração da energia eólica na região. A Marcha foi mobilizada pelo depoimento de mulheres atingidas pelos empreendimentos de “energia limpa” e pela defesa de um modelo energético que não seja concentrado em grandes obras e nas mãos de um punhado de investidores que fazem uso de financiamento público. A resistência aponta como caminho a produção de energia de forma descentralizada, com placas de captação dos raios do sol instaladas nos telhados das casas dos moradores e a venda do excedente energético. Assim como a água foi descentralizada no Semiárido a partir de ampla mobilização de organizações da sociedade civil e recursos públicos orientados para a implementação de cisternas de captação de água de chuva ao lado de cada casa rural, as famílias da Borborema pleiteiam esse mesmo princípio oriente a política energética e os investimentos na região. (Leia aqui a carta política da 14a. Marcha Pela Vida das Mulheres e Pela Agroecologia)

O post O sítio virou parque eólico apareceu primeiro em AS-PTA.

]]>
https://aspta.org.br/2023/09/11/o-sitio-virou-parque-eolico/feed/ 0
Feira Regional reforça compromisso com preservação da agrobiodiversidade https://aspta.org.br/2023/09/11/feira-regional-reforca-compromisso-com-preservacao-da-agrobiodiversidade/ https://aspta.org.br/2023/09/11/feira-regional-reforca-compromisso-com-preservacao-da-agrobiodiversidade/#respond Mon, 11 Sep 2023 16:47:37 +0000 https://aspta.org.br/?p=20241 19ª edição do maior encontro de sementes crioulas do Centro-Sul do Paraná coroou o final de agosto, marcando novo ano agrícola Centenas de variedades de milho crioulo, feijão, abóbora, hortaliças, flores. Pacotes com as mais diversas espécies de “miudezas”, como são chamadas no Paraná as sementes pequenas de tamanho, mas gigantes na importância. Elas representam … Leia mais

O post Feira Regional reforça compromisso com preservação da agrobiodiversidade apareceu primeiro em AS-PTA.

]]>
19ª edição do maior encontro de sementes crioulas do Centro-Sul do Paraná coroou o final de agosto, marcando novo ano agrícola

Centenas de variedades de milho crioulo, feijão, abóbora, hortaliças, flores. Pacotes com as mais diversas espécies de “miudezas”, como são chamadas no Paraná as sementes pequenas de tamanho, mas gigantes na importância. Elas representam a soberania e segurança alimentar e nutricional tanto das famílias guardiãs, que as conservam e multiplicam, quanto das famílias que as consomem – seja em forma de semente ou de alimento, após a colheita. 

Inaugurando o Parque de Exposições Francisco Rutcoski, em Palmeira, região centro-sul paranaense, toda essa diversidade genética, de conhecimentos e territórios, esteve presente na 19ª Feira Regional de Sementes Crioulas e da Agrobiodiversidade. Nas fileiras de mesas, organizadas em mutirão no dia anterior, 115 famílias expositoras preencheram o barracão com sua riqueza única de sementes, mudas, flores e artesanatos. 

Realizada nos dias 25 e 26 de agosto, esta edição da feira recebeu milhares de pessoas e  trouxe como lema “Cuidando dos Bens Comuns: Alimentos Saudáveis, Saúde Popular e Resgate de Tradições”.. Os trabalhos relacionados aos cuidados estão profundamente conectados às mãos das mulheres, em total sinergia com o lema de 2023, e um reflexo da crescente participação feminina, que protagonizou 66% das bancas este ano.

As delegações vieram de mais de 30 municípios  de diferentes regiões do estado do Paraná, além de São Paulo, Santa Catarina e Rio de Janeiro, entre estudantes, povos indígenas, comunidades quilombolas e organizações populares do campo e da cidade. O papel das feiras é central na animação das redes territoriais de agroecologia, ao ser um ponto de encontro entre diferentes sujeitos comprometidos com a preservação da agrobiodiversidade, com o combate à fome, à produção de alimentos e a construção de sistemas agroalimentares saudáveis, justos e territorializados. 

Algumas tradições importantes acompanham e fortalecem as feiras de sementes. Para os milhos foram realizados rigorosos testes de transgenia, assegurando que apenas variedades crioulas circulassem pela feira, compondo uma das estratégias de enfrentamento à contaminação por variedades transgênicas. Em 2023 foram realizados nove testes de transgenia para detectar contaminação, todos com resultados positivos da pureza dos milhos. Outra tradição importante está associada à realização da feira no mês de agosto, celebrando o aguardado momento de preparar a terra e semear novamente, iniciando mais um ano agrícola.  A banda oficial é a Filhos da Mãe Terra, de Mandirituba, trazendo músicas autorais de valorização da cultura popular e da agrobiodiversidade.

Uma novidade de 2023 foi o Espaço da Saúde Popular, organizado pelo Grupo de Mulheres do Coletivo Triunfo. Aromas, texturas e o chá quente, confortando os dias frios do final do inverno, acompanharam este espaço ao longo da feira. Na oficina sobre plantas medicinais e sua importância nas comunidades, partilha de histórias de vida acompanhadas de processos de cura física, emocional, espiritual. Mais de 200 mudas de plantas medicinais, flores e frutíferas foram doadas, como também fitoterápicos produzidos pelo grupo em encontro preparatório para a feira. 

Para Miriane Serrato, assessora da AS-PTA, “as feiras regionais acontecem historicamente por uma construção coletiva das famílias guardiãs e suas organizações de base, com o principal intuito de fortalecer a luta camponesa e preservar a agrobiodiversidade da nossa região, que cada vez mais é engolida pela lógica do agronegócio. Ver a diversidade nas mesas dos expositores em cada feira regional é um símbolo de resistência dos povos do campo.”

As feiras regionais, assim como os demais encontros que dão vida ao calendário de festas e feiras de sementes, têm o intuito de promover processos de preservação e multiplicação da agrobiodiversidade. Funcionam como bancos genéticos itinerantes, que carregam em si sementes crioulas, flores, mudas de árvores e plantas medicinais, ramas e tubérculos, raças de animais, criando também mercados territoriais e processos de incidência política.

Na região centro-sul, elas são convocadas pelo Coletivo Triunfo e seus mais de 25 grupos comunitários e organizações da agricultura familiar, como cooperativas, sindicatos e associações, e assessorado pelo Programa Local Paraná da AS-PTA.

Durante a abertura oficial, na manhã de sábado (26), após a benção ecumênica das sementes, as falas marcam a presença e valorização da cultura tradicional dos povos e o momento de retomada do Brasil, com políticas públicas voltadas à promoção da soberania e segurança alimentar e nutricional.

Joel Anastácio, Kaingang da Terra Indígena de Mangueirinha, sudoeste do Paraná, e agrônomo formado pela Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG), afirmou a importância da produção da agricultura familiar na erradicação da fome. “Viemos para a feira com alguns indígenas, eles trouxeram suas artes para expor, e nesta fala quero deixar uma mensagem aos agricultores e aos guardiões de sementes em nome do nosso povo, para que se sintam orgulhosos, por que vocês sustentam nosso Brasil com alimentos saudáveis, vocês se preocupam de verdade com a segurança alimentar”, disse Joel.

Para a coordenadora-geral do Escritório Estadual do Ministério do Desenvolvimento Agrário e Familiar (MDA) no Paraná, Leila Klenk, é urgente a necessidade de políticas públicas voltadas para a agricultura familiar e a distribuição de recursos. “É um orgulho enorme prestigiar esta Feira Regional, eu coloco o ministério à disposição de todos, reitero que precisamos nos unir para que, juntos, deputados estaduais e federais possamos fazer o direcionamento das emendas parlamentares de forma coletiva, que venha a atender as necessidades dos agricultores familiares, para que os recursos a exemplo do Pronaf sejam colocados para aqueles que mais precisam. Estou muito emocionada em ver que vocês, guardiões das sementes, guardam a vida e o tempo. A primavera se anuncia, e com ela, uma nova safra, uma nova vida, uma nova esperança, na luta sempre juntos”, afirmou a coordenadora.

Os encontros que a Feira Regional possibilita são culminâncias de múltiplos e variados processos animados por diversas redes e grupos no Paraná e no país. Ou seja, ela ocorre pela ação conjunta de sujeitos coletivos que, desde os seus lugares de atuação, cuidam dos bens comuns e contribuem para a restauração dos sistemas agroalimentares. 

Fotos:  Fernando Angeoletto e Vinícius Luiz Correia

 

O post Feira Regional reforça compromisso com preservação da agrobiodiversidade apareceu primeiro em AS-PTA.

]]>
https://aspta.org.br/2023/09/11/feira-regional-reforca-compromisso-com-preservacao-da-agrobiodiversidade/feed/ 0
19ª Feira Regional de Sementes Crioulas traz cuidado com os bens comuns como lema de 2023 https://aspta.org.br/2023/08/23/19a-feira-regional-de-sementes-crioulas-traz-cuidado-com-os-bens-comuns-como-lema-de-2023/ https://aspta.org.br/2023/08/23/19a-feira-regional-de-sementes-crioulas-traz-cuidado-com-os-bens-comuns-como-lema-de-2023/#respond Wed, 23 Aug 2023 12:51:20 +0000 https://aspta.org.br/?p=20213 O encontro acontecerá nos dias 25 e 26 de agosto, em Palmeira/PR, reunindo centenas de expositores e participantes As festas e feiras de sementes crioulas e da agrobiodiversidade da região centro-sul do Paraná são tradicionalmente organizadas no mês de agosto para celebrar o aguardado momento de preparar a terra e semear novamente, iniciando mais um … Leia mais

O post 19ª Feira Regional de Sementes Crioulas traz cuidado com os bens comuns como lema de 2023 apareceu primeiro em AS-PTA.

]]>
O encontro acontecerá nos dias 25 e 26 de agosto, em Palmeira/PR, reunindo centenas de expositores e participantes

As festas e feiras de sementes crioulas e da agrobiodiversidade da região centro-sul do Paraná são tradicionalmente organizadas no mês de agosto para celebrar o aguardado momento de preparar a terra e semear novamente, iniciando mais um ano agrícola. Realizada de forma itinerante entre os municípios da região, anima a rede de famílias guardiãs, que mobilizam suas comunidades rurais, urbanas e organizações de base da agricultura familiar, fortalecendo as redes territoriais de agroecologia por onde passa.

A 19ª Feira Regional de Sementes Crioulas e da Agrobiodiversidade, o encontro mais esperado do ano, acontece na próxima sexta e sábado, dias 25 e 26 de agosto, no Parque de Exposições Francisco Rutcoski, em Palmeira, Paraná. Já são mais de 90 expositoras e expositores inscritos de 27 municípios do Paraná e de outros estados como Rio de Janeiro e Santa Catarina.

Sementes crioulas de centenas de espécies e diversidades, mudas de árvores nativas, frutíferas, flores e plantas medicinais, alimentos beneficiados, produtos de milho crioulo, panificados, erva-mate, doces e artesanatos darão vida ao lema desta edição da feira regional:  “Cuidando dos bens comuns: alimentos saudáveis, saúde popular e resgate das tradições”.

Convocadas pela Coletivo Triunfo, formado por mais de 25 grupos comunitários e organizações da agricultura familiar, como cooperativas, sindicatos e associações, e assessorado pelo Programa Local Paraná da AS-PTA, as feiras regionais têm o intuito de promover processos de preservação e multiplicação da agrobiodiversidade. O Grupo Coletivo Triunfo está presente em pelo menos 15 municípios da região centro-sul e sudeste do estado, articulando uma grande rede de famílias agricultoras e comunidades guardiãs das sementes, conhecimentos e tradições.

Para Miriane Serrato, assessora da AS-PTA, “as feiras regionais acontecem historicamente por uma construção coletiva das famílias guardiãs e suas organizações de base, com o principal intuito de fortalecer a luta camponesa e preservar a agrobiodiversidade da nossa região, que cada vez mais é engolida pela lógica do agronegócio. Ver a diversidade nas mesas dos expositores em cada feira regional é um símbolo de resistência dos povos do campo. Elas são um poço de esperança, em que depositamos nossa água, que é o trabalho que realizamos, mas também bebemos dessa mesma água, que é a resistência das famílias guardiãs, para continuarmos juntas e juntos na caminhada.”

Inscrições e programação

As inscrições para expor na feira regional são gratuitas e ainda podem ser realizadas através de formulário online, clicando aqui, seguindo importantes critérios de participação, assegurando um espaço livre de transgênicos e agrotóxicos, de comida de verdade, que expresse a diversidade e riqueza da produção agroecológica.

Dentre os critérios de participação estão a realização de teste de transgenia em todas as sementes de milho. Se for constatada a contaminação, as sementes deverão ser imediatamente retiradas da banca e da feira. Todas as bancas expositoras devem ter ligação direta com a conservação da agrobiodiversidade, e dentre os produtos devem constar no mínimo cinco variedades crioulas de sementes ou mudas. Só são permitidos produtos (alimentos, artesanatos e insumos) que comprovem sua origem de produção familiar, ou, no caso de implementos agrícolas, que comprovem sua utilidade nas práticas agroecológicas de produção e conservação da agrobiodiversidade. Não será permitida a revenda de produtos industrializados, salvo quando estes produtos forem de origem de agroindústrias ligadas à agricultura familiar.

O alimento é central nas feiras regionais, e, por isso, os encontros sempre começam com o café da partilha, em que a cultura alimentar dos diferentes territórios está presente. Na sexta, 25/08, é dia de visita da comunidade escolar de instituições do ensino básico ao superior, possibilitando o contato e troca de conhecimentos entre diferentes gerações. Neste dia também acontecerão oficinas temáticas e uma noite cultural, embalada pela banda Filhos da Mãe Terra, de Mandirituba/PR.

A abertura oficial da 19ª Feira Regional, será no sábado pela manhã, seguida da benção ecumênica das sementes e apresentações culturais após o almoço. A partilha da mandala  encerra o encontro, espalhando as sementes em terras férteis cuidadas por famílias que cotidianamente lutam por um futuro mais justo, com comida de verdade e muita fartura na colheita.

O post 19ª Feira Regional de Sementes Crioulas traz cuidado com os bens comuns como lema de 2023 apareceu primeiro em AS-PTA.

]]>
https://aspta.org.br/2023/08/23/19a-feira-regional-de-sementes-crioulas-traz-cuidado-com-os-bens-comuns-como-lema-de-2023/feed/ 0
Mutirão da Partilha: Unindo Tradição Camponesa, Solidariedade e Agrobiodiversidade https://aspta.org.br/2023/08/19/mutirao-da-partilha-unindo-tradicao-camponesa-solidariedade-e-agrobiodiversidade/ https://aspta.org.br/2023/08/19/mutirao-da-partilha-unindo-tradicao-camponesa-solidariedade-e-agrobiodiversidade/#respond Sat, 19 Aug 2023 15:42:37 +0000 https://aspta.org.br/?p=20207 No coração do Paraná, floresce uma tradição ancestral: o Mutirão da Partilha. Criado pelo Coletivo Triunfo em Fernandes Pinheiro, esse movimento fortalece a união entre agricultores rurais, resgatando práticas ancestrais e promovendo o desenvolvimento sustentável da comunidade. Na Casa das Sementes, a família Santos, composta por Dona Terezinha, Seu Silvestre e Jaqueline, semeia a ideia … Leia mais

O post Mutirão da Partilha: Unindo Tradição Camponesa, Solidariedade e Agrobiodiversidade apareceu primeiro em AS-PTA.

]]>
No coração do Paraná, floresce uma tradição ancestral: o Mutirão da Partilha. Criado pelo Coletivo Triunfo em Fernandes Pinheiro, esse movimento fortalece a união entre agricultores rurais, resgatando práticas ancestrais e promovendo o desenvolvimento sustentável da comunidade.

Na Casa das Sementes, a família Santos, composta por Dona Terezinha, Seu Silvestre e Jaqueline, semeia a ideia de colaboração. Desde 2018, esse espaço acolhe encontros e atividades do Coletivo Triunfo, celebrando a agroecologia como base para uma agricultura sustentável.

A verdadeira essência da solidariedade se revelou em 2021, quando Seu Silvestre sofreu um acidente. O Coletivo Triunfo mobilizou mais de 40 pessoas para limpar suas roças, destacando a força da comunidade e o poder da ajuda mútua.

Da solidariedade à inovação, o Mutirão da Partilha floresceu. Em 2022/2023, em parceria com a AS-PTA, nasceu a iniciativa que conecta tradição e agrobiodiversidade. Sementes e conhecimento são compartilhados, promovendo uma troca vital de saberes entre comunidades e gerações.

No campo, famílias cultivaram não apenas sementes, mas também conexões profundas. O milho São Pedro, com mais de 70 anos de história, foi resgatado, livre de transgênicos.  O feijão ganhou espaço com 12 variedades, protegendo espécies em risco. A horta mandala floresceu, mostrando que o manejo consciente e a diversidade caminham lado a lado.

O Mutirão da Partilha também se enraizou no solo, explorando práticas agroecológicas. A seleção massal do milho e a trincheira para análise do solo abriram espaço para conhecimento e cuidado.

Mas o Mutirão da Partilha é mais do que plantar e colher; é celebrar. A tradição camponesa ganha vida com festas, danças e pratos típicos.

 

Assista ao vídeo aqui.

O post Mutirão da Partilha: Unindo Tradição Camponesa, Solidariedade e Agrobiodiversidade apareceu primeiro em AS-PTA.

]]>
https://aspta.org.br/2023/08/19/mutirao-da-partilha-unindo-tradicao-camponesa-solidariedade-e-agrobiodiversidade/feed/ 0
Viver nas “terras do patrão”: sementes e a luta por autonomia no semiárido https://aspta.org.br/2023/07/20/viver-nas-terras-do-patrao-sementes-e-a-luta-por-autonomia-no-semiarido/ https://aspta.org.br/2023/07/20/viver-nas-terras-do-patrao-sementes-e-a-luta-por-autonomia-no-semiarido/#respond Fri, 21 Jul 2023 00:24:27 +0000 https://aspta.org.br/?p=20189 É na afirmação dos agricultores cearenses de que as “Casas de sementes trouxeram autonomia dos patrões” que se inspira este texto. Autonomia que só se experiencia de forma coletiva, pelo trabalho compartilhado no cuidado com as sementes, do plantio ao armazenamento, que tem no ritmo das chuvas seu compasso. De forma quase contraditória essa autonomia, … Leia mais

O post Viver nas “terras do patrão”: sementes e a luta por autonomia no semiárido apareceu primeiro em AS-PTA.

]]>
Foto: Acervo Esplar

É na afirmação dos agricultores cearenses de que as “Casas de sementes trouxeram autonomia dos patrões” que se inspira este texto. Autonomia que só se experiencia de forma coletiva, pelo trabalho compartilhado no cuidado com as sementes, do plantio ao armazenamento, que tem no ritmo das chuvas seu compasso. De forma quase contraditória essa autonomia, se confunde com morar e plantar em terras que pertencem a outrem, revelando possibilidades de (re)pensar dimensões associadas à questão agrária, na qual a terra precisa ser lida entremeada às relações ecológicas e de poder.

Ainda hoje, agricultores familiares do semiárido cearense, mas não só, vivem no que chamam “terras do patrão”, uma terra dominada por outro, assim como tudo que ali habita, cursos d’água, matas e solos. Ao mesmo tempo, é nessa terra que os agricultores constituem suas famílias, criam seus filhos, cultivam roçados e produzem alimentos. Sem dúvidas, historicamente essas condições foram se transformando em meio a conflitos e conquistas, como é o caso das leis trabalhistas, dos processos de reforma agrária, das expulsões e ocupações.

Em um sobrevoo histórico é possível identificar que viver nas “terras do patrão” se constitui por meio da combinação de moradia e trabalho [1]. Assim, ainda que presente, o “patrão” não é uma invenção atual, mas parte do processo de formação social e ocupação do semiárido. É aquele para quem se trabalha, para quem se deve deixar parte da produção, com quem se contrai dívidas, mas também quem é padrinho e provedor.

A essa figura “boa” e “ruim” se assomam as especificidades da região semiárida. “Está bonito para chover” é uma das expressões utilizadas pelos agricultores ao olharem as nuvens se formando no céu. A chuva é um momento desejado, pois inaugura o período de plantio nos roçados. Além do plantio, a chuva garante o abastecimento das cisternas, a água estocada que permitirá a travessia durante o verão, estação da estiagem.

É a partir da compreensão e conexão com o calendário das chuvas que os agricultores afirmam que “quando chove tem que plantar, não dá para esperar”. Assim, durante as chuvas, ter ou não sementes para levar à terra é definidor da possibilidade de plantar e colher e, logo, se alimentar. Sementes engendram, dessa forma, possibilidades imediatas e futuras para as populações camponesas. Os frutos colhidos são estocados e garantem a segurança alimentar das famílias. As sementes nas mãos dos agricultores, contudo, nem sempre foram uma realidade. As sementes, como as terras, outrora, eram “sementes do patrão”, termo que expressa o domínio refinado combinando controle sobre o trabalho e os bens da natureza.

Casas de Sementes e a luta por direitos no campo em um “salãozinho discreto” no Alto Brilhante: uma história cearense

Nas inúmeras e tão agradáveis conversas com os agricultores da região de Sobral, no Ceará, se aprende que guardar sementes não é facilmente datável, o tempo é alargado para essa prática – “desde sempre”. Contudo, isso não se dá de forma contínua. As secas e os patrões impõem arranjos específicos.

As secas prolongadas, especialmente as da década de 1970 e 1980, acarretaram bruscas reduções nos estoques das sementes cultivadas pelos camponeses. A pouca chuva não permitia o desenvolvimento das sementes e frutos, além disso, muitas vezes a quantidade armazenada se tornava alimento em momentos críticos. Findas as secas ou diante um pequeno anúncio de chuvas, o acesso às sementes passava a ser pela compra nos mercados locais. Nessas décadas, para conseguir acesso às sementes era preciso que os camponeses trabalhassem primeiro para o “patrão”, recebendo o pagamento, em dinheiro ou em sementes, para, então, iniciarem seus roçados.

De acordo com relatos referentes às décadas de 1970 e 1980, grafados no relatório de 1992 da ONG Esplar, ela mesma parte da história narrada, “era aí que se instalava a dependência. Quando chovia, ao invés do trabalhador ir para sua própria roça, ia trabalhar primeiro na roça do patrão. Fazer primeiro a planta dele para depois fazer a sua. E, nessa agonia, os trabalhadores vinham quase perdendo a safra” [2].

Duas formas complementares pelas quais os “patrões” utilizavam as sementes como instrumento de exploração podem ser identificadas. A primeira, trata-se da obrigação imposta aos camponeses de trabalhar previamente para, então, receber e comprar sementes. A segunda, se caracteriza por um sistema de dívidas, na qual os camponeses tomavam sementes emprestadas do “patrão” para serem pagas após a colheita ou na próxima safra. O que é identificado pelos agricultores, numa perspectiva histórica, como constituição de um ciclo vicioso.

Foram essas condições impostas aos camponeses que motivaram nos sertões de Tauá/CE, a organização coletiva dos chamados, à época, bancos de sementes. Padres da Diocese de Crateús, sindicalistas e agricultores se organizaram para fortalecer “qualquer coisa que fosse quebrando aquele cabresto curto”. No caso das sementes – “se o pessoal tivesse a semente, aí não precisava pedir dinheiro emprestado ao patrão. E aí poderia trabalhar com um pouco mais de liberdade” [3].

“Quebrar o cabresto curto”, porém, era tarefa delicada. O contexto é o de Ditadura Militar e de repressão, no qual o Batalhão de Emergência [4] se fazia presente, não para garantir água ou provimentos durante secas prolongadas, ao contrário, atuava “desorganizando o povo todo”. As sementes eram compreendidas como bons pretextos de mobilização social porque representavam um problema real enfrentado pelos camponeses, “a dependência das sementes do patrão”, além disso, possuíam uma espécie de neutralidade política, tratava-se de garantir alimentos, o que poderia funcionar como um disfarce à constante vigilância.

Começam assim as reuniões, todos os sábados, “num salãozinho discreto lá no Alto Brilhante, cada um trazia um pouquinho de feijão, de jerimum, o que tinha para partilhar na hora do almoço”. Nesses encontros se conversava de tudo, questões específicas sobre as sementes, onde consegui-las, como armazená-las, os desafios da seleção, a dificuldade de conseguir ferramentas e também análises da conjuntura municipal, quem eram os donos da terra, o mapa fundiário da região, o Estatuto da terra e suas obrigações.

Práticas coletivas nos Bancos de Sementes: armazenamento e organização política

Com a identificação das sementes enquanto elemento parte da reprodução da vida camponesa e da organização política, o próximo passo foi adquiri-las, criando condições de armazenamento, empréstimo e devolução. As sementes foram compradas nos comércios locais através de parceria entre a Diocese da região e os Sindicatos de Trabalhadores Rurais.

O instrumento comumente utilizado para gestão era um caderno no qual se anotava o nome das pessoas, a quantidade emprestada e, depois, devolvida. A simplicidade do processo era estratégica, porque havia muita resistência e medo em atuações coletivas, os envolvidos avaliavam que exigências excessivas poderiam afastar as pessoas.

Desafios técnicos também fazem parte do início do trabalho com as Casas de Sementes, como a mistura de variedades, a ausência de vasilhames adequados para o armazenamento, os processos de seleção e devolução. Ainda que entre desafios, resultados já iam sendo apontados

Quais os resultados que isso trouxe? Ainda hoje continuam em algumas regiões [as Casas de Sementes]. Houve uma maior preocupação com o associativismo […] Outro resultado que foi bom, é que o pessoal passou a se preocupar mais com a questão da seleção das sementes. Vão aparecendo sementes e o pessoal vai juntando, vai criando sementes novas e fazendo as seleções […] Além da questão sindical que foi muito forte (ESPLAR, 1992, p. 17).

Em um ambiente de repressão e de condições assimétricas de poder, ainda tão atuais, o armazenamento coletivo de sementes foi capaz de mobilizar fazeres entre os camponeses, inclusive ressignificando as práticas, como a maior preocupação com a seleção das sementes e reconhecimentos sobre a situação fundiária. Isso se evidencia pela vitalidade das Casas de Sementes nos dias de hoje, organizadas pela Rede Sementes da Vida, ora outra, nos anos 1990, conhecida como Rede de Intercâmbio de Sementes (RIS), que envolve 215 Casas de Sementes e mais de 4.700 sócios.

As Casas de Sementes têm sido um vínculo de autonomia, ainda que historicamente o “patrão” siga sendo uma figura presente e que exerce controle sobre os bens da natureza e os modos de vida camponeses. Assim, ainda que possa se dizer que isso ocorre de forma precária, já que o acesso à terra e ao que nela também habita não foi radicalmente modificado, as Casas permitiram outras formas de se relacionar com as sementes, de cultivar a terra, de não ter que trabalhar primeiro para o “patrão” e só depois acessá-las, muitas vezes em sistemas de dívidas. A qualidade desses laços abriu outras formas de fazer ser. Transformações em curso pela coragem de frequentar o Alto Brilhante, de tomar emprestadas sementes que não pertenciam aos “patrões”, enquanto, sobretudo nas décadas de 1970 e 1980, grande parte da vida se associava a eles. Nesse compasso, a luta pelas sementes e pela terra seguem vivas no semiárido.

 

[1] BARREIRA, C. Trilhas e atalhos do poder: conflitos sociais no Sertão. Rio de Janeiro: Rio Fund Ed., 1992.

[2] Todas as citações do texto foram retiradas de: ESPLAR. I Encontro da Rede de Intercâmbio de Sementes (RIS-CE). Relatório de Projeto (Programa de resgate, conservação e controle de recursos genéticos) Novib. Fortaleza: Acervo documental do ESPLAR, 1992.

[3] Referência ao Exército e suas ações de enfrentamento às secas.

[4] Essa matéria foi escrita com base em: Lopes, H. R. (2023). Seed Houses and the “Master’s Land”: A Study of the Ecology of Practices and Autonomy in Brazil’s Semi-arid Region. Agrarian South: Journal of Political Economy, 12(2), 206–226. https://doi.org/10.1177/22779760231171903

O post Viver nas “terras do patrão”: sementes e a luta por autonomia no semiárido apareceu primeiro em AS-PTA.

]]>
https://aspta.org.br/2023/07/20/viver-nas-terras-do-patrao-sementes-e-a-luta-por-autonomia-no-semiarido/feed/ 0