Mais de cinco mil agricultoras e lideranças rurais da região do Polo da Borborema e de outras partes da Paraíba, marcharam pela sexta vez na Marcha Pela Vida das Mulheres e pela Agroecologia, na manhã da quinta-feira, 12 de março. Desta vez, no município de Lagoa Seca, região metropolitana de Campina Grande-PB. A marcha é uma atividade realizada desde 2010 pelo Polo da Borborema, um fórum de sindicatos e organizações da agricultura familiar que congrega 14 municípios e mais de cinco mil famílias do Agreste da Borborema, com a assessoria da AS-PTA Agroecologia e Agricultura Familiar.
A manhã de muito sol foi iniciada com a concentração e acolhida às caravanas, em um palco montado no Centro Marista de Eventos, localizado na entrada da cidade, às margens da BR 104. A atividade recebeu mais de 50 ônibus, vindos dos municípios do Polo da Borborema e de outras regiões da Paraíba com representantes de organizações que compõem a Articulação do Semiárido Paraibano (ASA Paraíba), o Coletivo Estadual de Mulheres do Campo e da Cidade, entre outros movimentos de mulheres.
Feita a acolhida, a vice-presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Lagoa Seca e liderança do Polo, Marlene Pereira, abriu oficialmente a marcha: “Estamos marchando por saúde, por qualidade de vida, por políticas públicas. Nós mulheres, temos a capacidade de fazer qualquer coisa. Eu tenho capacidade e qualquer uma de vocês aqui tem. Não podemos nos menosprezar, dizendo ‘eu não posso, eu não devo’. Você pode, você consegue, basta você acreditar nisso, por isso estamos aqui, pra dar apoio umas às outras”, disse.
Após a abertura, houve a apresentação da peça intitulada “Zefinha vai casar”, encenada pelo Grupo de Teatro Amador do Polo da Borborema. O espetáculo mostrou a história de Zefinha, uma jovem que espera encontrar no casamento a liberdade que não possui em sua casa, com um pai e um irmão machistas e dominadores. No fim, a moça descobre que seu noivo, Zé, não é muito diferente dos dois e entra em um dilema: “caso ou não caso?”. Após a peça houve interação com a plateia, que se manifestava eufórica e indignada, ao presenciar as diversas formas de violência vivenciadas pela jovem.
Em seguida, a agricultora Maria Zélia de Oliveira, do município de São Sebastião de Lagoa de Roça, subiu ao palco para partilhar com as presentes com o seu depoimento. Dividiu com as outras mulheres a história triste de uma mãe que engravidou na adolescência, foi expulsa de casa e teve o seu bebê doado a uma família desconhecida, perdendo o contato com a filha.
Antes da saída, a cantora paraibana Sandra Belê cantou ”Apelo de Mulher”, música de autoria de Gilvanisa Maia, que se tornou o hino da Marcha, animando as mulheres na preparação para a saída da caminhada. A passeata cruzou a BR 104 em direção à Praça da Igreja Matriz. Em pouco mais de um quilometro de percurso, a marcha atraiu muitas pessoas, muitas delas mulheres, que das portas ou das janelas de suas casas, se somaram ao movimento. A caminhada foi conduzida com o apoio de dois minitrios elétricos, com a animação das lideranças femininas do Polo, mas foi sobretudo, foi impulsionada pela força, consciência e alegria de cada mulher.
Cantando canções, entoando gritos de guerra, segurando faixas, bandeiras e estandartes coloridos, as mulheres caminharam levando produtos do seu trabalho e distribuindo panfletos com a população. Comparecerem à marcha representações de diversos movimentos sociais e sindicais rurais e urbanos, autoridades políticas estaduais e municipais, movimento de mulheres, estudantes e professores da rede pública municipal e de universidades, religiosos, associações comunitárias entre outras entidades.
A agricultora Fátima Monteiro, veio da Comunidade Riacho do Meio, em Queimadas-PB, ela diz que todos os anos participa da marcha para que as mulheres que “vivem no cativeiro, escravas de seus maridos, se unam para lutar e mudar essa realidade”. Fátima é um exemplo de superação: “Sofri muito violência com as minhas filhas dentro de casa. Depois que entrei no Sindicato, levantei a cabeça e me firmei”, disse a agricultora.
Na Praça da Igreja Matriz foram montados um segundo palco e uma feira de saberes e sabores para apresentação de produtos e experiências construídas por mulheres. A feira é um espaço de visibilidade da contribuição técnica, social, econômica e política das agricultoras na construção da agroecologia na Borborema. No local as mais de 30 barracas, ornamentadas com banners, painéis e boletins e fartamente recheadas, as agricultoras comercializaram bolos, doces, sucos, hortaliças, frutas, remédios a base de plantas medicinais e também artesanato.
No palco, a animação foi feita pelo trio de forró “Mistura de Gerações”, do município de Esperança-PB. Sandra Belê emocionou a plateia cantando um repertório de músicas regionais. Roselita Vitor, da coordenação do Polo da Borborema, fez uma fala sobre a conjuntura política atual na perspectiva das mulheres agricultoras. Lembrou da penosidade do trabalho das mulheres, principalmente num período longo de estiagem tal qual vivemos. E também ressaltou as muitas melhorias na vida das agricultoras construídas pelas mãos das mulheres ali presentes, os projetos construídos pelos movimentos sociais como as cisternas e que contaram com a sensibilidade de um governo que soube ouvir: “Eu queria destacar a construção desse diálogo com o governo, que gerou essas conquistas. Mas isso ainda é pouco, frente aos desafios que nós temos. No entanto, a gente não pode aceitar qualquer ameaça ao nosso sistema democrático, nós não aceitamos a corrupção, mas também não podemos acreditar nessa publicidade distorcida que a mídia faz de que o que está aí foi criado pelo governo atual. Vamos à luta para não permitir que as nossas conquistas sejam ameaçadas”, afirmou.
Em seguida, vários movimentos que apoiaram a Marcha se manifestaram: Luzenira Linhares, da Secretaria de Mulheres da Central Única dos Trabalhadores da Paraíba (CUT-PB), Dilei Schiochet pela coordenação estadual do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST-PB) e Madalena Medeiros pelo GT Mulheres da ASA Paraíba e pelo Coletivo Estadual de Mulheres do Campo e da Cidade. Os movimentos puderam reforçar as pautas nacionais como a reforma política, a reforma agrária, o fim do patriarcado e da impunidade dos crimes contra mulher
Para finalizar, a cantora Sandra Belê, acompanhada pelo sanfoneiro Lucas Carvalho, voltaram a se apresentar. O evento foi encerrado com uma mística, que trouxe a valorização das mãos das mulheres, mãos que colhem que plantam, que benzem, que semeiam. Várias mulheres subiram ao palco segurando os símbolos do seu trabalho ao som da música “Terra, vida, esperança” de autoria de Jurandir da feira, eternizada na voz de Luiz Gonzaga. Foram lançadas sementes na plateia, numa forma simbólica de semear a mensagem da Marcha nas comunidades de onde cada um e cada uma veio.
Este ano, a Marcha pela Vida das Mulheres e pela Agroecologia contou com o apoio do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Lagoa Seca, CCFD, Misereor, Action Aid, CESE, Secretaria de Estado da Mulher e da Diversidade Humana, Secretaria de Estado da Agricultura Familiar e do Desenvolvimento do Semiárido e Prefeitura Municipal de Lagoa Seca.
Veja como foi a marcha:
Matérias sobre a VI Marcha pela Vida das Mulheres e pela Agroecologia