A Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ) recebeu, no dia 11 de julho, as cores, sabores e aromas dos alimentos agroecológicos trazidos por agricultores familiares que participaram do Seminário de Avaliação da Campanha Produtos da Gente.
A Campanha nasceu no âmbito do projeto “Alimentos Saudáveis em Mercados Locais: aproximando consumidores e agricultores familiares na Região Metropolitana do Rio de Janeiro”, lançado pela AS-PTA, em 2013. Seu principal objetivo é aproximar produtores familiares e consumidores, mostrando para a sociedade que existe agricultura agroecológica urbana e periurbana, que seus produtos são acessíveis e possibilitam uma alimentação mais saudável.
Realizado no Instituto de Nutrição da UERJ (INU), o Seminário de Avaliação contou com a participação de cerca de 60 pessoas, representando 12 grupos de agricultores agroecológicos urbanos e diferentes instituições ligadas ao tema. Entre elas, estavam representantes do Campus Fiocruz Mata Atlântica, do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, da Associação da Feira da Roça de Nova Iguaçu (Aferni), da Rede Carioca de Agricultura Urbana, da Rede Ecológica e das Feiras Agroecológicas de Campo Grande, Freguesia, Vargem Grande, Olaria, Rio da Prata e Nova Iguaçu. Os participantes receberam as boas vindas da diretora do Instituto de Nutrição, Roberta Fontanive, e de professores do INU.
O objetivo do Seminário era analisar os resultados e os desafios da Campanha Produtos da Gente, além de lançar propostas para seu aperfeiçoamento. Para que essa reflexão desse frutos concretos, os participantes foram divididos em grupos de trabalho e apresentaram suas conclusões e contribuições para a continuidade da Campanha ao final da jornada.
Após a introdução feita por Claudemar Mattos, assessor técnico do Programa de Agricultura Urbana da AS-PTA, contextualizando como surgiu a Campanha, alguns participantes fizeram uso da palavra. Pedro Paulo Bello, agricultor e feirante da Feira Agroecológica de Campo Grande, lembrou a campanha “Xô, saco plástico”, que visa a reduzir o uso de bolsas plásticas: “Desde então, incentivamos o uso de sacolas de pano e não trabalhamos mais com as de plástico na nossa feira”. Já Alfredo Mager, do Ministério da Agricultura, ressaltou a importância de iniciativas como a da Campanha Produtos da Gente: “Acreditamos ser importante que existam diferentes experiências de produção agroecológica, que sejam certificadas ou não, de maneira que possamos ter uma maior oferta de alimentos saudáveis e sem agrotóxicos”.
Avanços e conquistas
Ao fazer um balanço da Campanha nesses três anos, Marcio Mendonça, coordenador do Programa de Agricultura Urbana da AS-PTA, elencou uma série de avanços. Entre eles, a ampliação da relação entre agricultores familiares e consumidores da Região Metropolitana do Rio de Janeiro, o fato dos produtos da agricultura familiar estarem sendo reconhecidos nos mercados locais e o aumento médio de 60% na renda agrícola de 100 agricultores familiares envolvidos no Projeto. Também destacou a participação de cerca de 200 agricultores, associados aos empreendimentos solidários, e de pelo menos 30 jovens comercializando suas produções em mercados locais, além da elaboração de oito projetos de venda para alimentação escolar, para as duas últimas chamadas públicas das escolas estaduais.
Os resultados não param por aí. Marcio resaltou ainda a importância da Escolinha de Agroecologia de Nova Iguaçu; a criação das identidades visuais que valorizam os produtos da agricultura familiar da Região Metropolitana; a organização de novos canais de comercialização, em parceria com grupos de consumidores; a elaboração de Planos de Negócios de cinco empreendimentos solidários da agricultura familiar e de duas propostas de políticas públicas de apoio aos empreendimentos solidários de agricultura familiar, formuladas e negociadas com gestores públicos.
O desafio de sair da “invisibilidade”
Se, por um lado, o Seminário mostrou que o saldo da Campanha Produtos da Gente tem sido muito positivo, por outro, não deixou de assinalar as dificuldades, de diferentes naturezas – econômicas, sociais, institucionais, culturais etc. –, que os agricultores agroecológicos urbanos e perirubanos enfrentam na Região Metropolitana do Rio de Janeiro.
“Um dos nossos grandes desafios tem sido a invisibilidade da agricultura urbana e periurbana, o que, dentre outros problemas, resulta na sua desvalorização como atividade econômica e no baixo acesso às políticas públicas destinadas à agricultura familiar”, assinalou Marcio Mendonça. Apesar desse contexto desfavorável, acrescentou, “ainda encontramos muitas hortas domésticas, quintais produtivos e sítios voltados para uma produção agroecológica”.
Outro desafio é ampliar o raio de distribuição e comercialização dos produtos agroecológicos, levando-os a novas comunidades e públicos. “Até agora, a Campanha alcançou, basicamente, quem já tinha algum interesse pelo assunto e, por isso, já busca produtos agroecológicos. A questão é como chegar nas pessoas que ainda não estão sensibilizadas para a importância de uma alimentação mais saudável e, por isso, não buscam as feiras agroecológicas”, questionou.
Por último, Marcio Mendonça enfatizou que a Campanha Produtos da Gente “não deve mais ser vista como uma ação da AS-PTA, mas ser totalmente ´abraçada` pelos parceiros, instituições e pessoas dedicadas à agroecologia urbana”.
Novo projeto: arranjos locais
O projeto a partir do qual nasceu a Campanha foi finalizado, mas um novo já está em andamento: “Arranjos locais no Rio de Janeiro e Nova Iguaçu”, reunindo redes locais de agricultores agroecológicos em comunidades urbanas.
Como explicou Claudemar Mattos, há hoje oito arranjos: em Guaratiba, Vargem Grande, Penha, Complexo do Alemão, Engenho da Rainha, Campo Grande, Realengo, Jacarepaguá (Colônia Juliano Moreira), além de Geneciano, em Nova Iguaçu.
A partir da articulação de grupos locais de agricultores, pastorais sociais, iniciativas culturais, escolas, unidades de saúde e atendimento social, são elaborados planos de ação locais, que fortalecem e implementam ações de agricultura urbana relacionadas à produção, beneficiamento, geração de saúde, alimentação e criação de ambientes saudáveis. A Campanha Produtos da Gente se insere nesse projeto como fator de mobilização e diálogo com as comunidades.
Agroecologia: uma filosofia de vida
Resumindo o espírito da Campanha Produtos da Gente, Marcio Mendonça destacou que “a agricultura, para nós, deve ser promovida a partir de uma abordagem participativa e com um enfoque agroecológico. Não estamos falando de produtos agroecológicos como ´nicho de mercado´, de maneira descolada da origem e do território. É fundamental sabermos a origem do produto e conhecer o agricultor, assim como aproximar produtores e consumidores”.
Foi nesse sentido também que a agricultora urbana agroecológica Vanessa Danciger deu um emocionado depoimento ao final do Seminário. Ela lembrou o que ouviu de uma senhora, há alguns meses, na Feira Agroecológica da Ilha do Governador, a quem havia acabado de explicar do que se tratava a Campanha: “Ah… entendi… Os alimentos de vocês não são apenas produtos sem agrotóxicos… Eles trazem histórias de vida!”.
E foi com uma confraternização entre pessoas com histórias de vida dedicadas à construção de um mundo melhor, onde os alimentos saudáveis sejam mais acessíveis a toda população, que o Seminário foi encerrado, em meio a uma Feira Agroecológica, com os Produtos da Gente, e um lanche servido pelas Mulheres do Sertão Carioca.