BRASIL QUER VENDER GATO POR LEBRE EM MONTREAL
Posiçoes defendidas pela delegaçao brasileira na reunião sobre o Protocolo de Cartagena abandonam considerações ambientais
Durante as discussões sobre regras internacionais para a identificação das exportações de produtos transgênicos de um país para outro, o Brasil se recusou a apoiar a maioria esmagadora dos países que desejam que os exportadores de transgênicos indiquem claramente nos seus carregamentos qual o tipo ou tipos de transgênicos que podem estar presentes.
O Brasil prefere apoiar a Nova Zelândia e outros países que querem aplicar um rótulo geral dizendo “pode conter transgênicos”, de modo a “não criar dificuldades para o comércio de biotecnologia”. Tal rótulo genérico impede que países identifiquem se há realmente transgênicos em uma determinada importação e se esses transgênicos estão entre aqueles eventualmente autorizados por suas autoridades.
O recente caso em que milho transgênico de um certo tipo não autorizado acabou sendo enviado à União Européia, junto com outros tipos autorizados, ilustra a necessidade de que o país exportador indique claramente se há e, em caso positivo, que tipo de transgênicos se encontram presentes em suas exportações, de modo que o país importador possa decidir se aceita ou recusa a carga.
O Brasil porém, junto com outros produtores de transgênicos como os EUA, a Argentina e o Canadá parece preferir a posição de enganar seus compradores, escondendo exatamente o que está vendendo, ao se recusar a indicar precisamente o que vai dentro da carga. A posição brasileira não parece muito inteligente nem do ponto de vista ambiental, nem comercial.
O Protocolo de Cartagena é antes de tudo um acordo para proteger a biodiversidade e a saúde dos importadores, impedindo o ingresso involuntário e inadvertido de transgênicos. Por isso mesmo, não rotular a carga de transgênicos pode trazer prejuízos comerciais ao exportador – como a devolução de cargas, indenizações, multas – dos quais já há alguns exemplos internacionais.
Em Montreal, a União Européia e a China, os maiores importadores de soja do Brasil, declarararam justamente que vão exigir uma completa identificação dos tipos de transgênicos importados. Só este fato deveria bastar para convencer o Brasil a não vender gato por lebre, ou seja desistir de querer disfarçar suas exportações sob um rótulo ambíguo de “pode conter transgênicos”.
Mas não é isto que está acontecendo esta semana em Montreal. Não apenas para as ONGs mas até para aliados megadiversos e outros países de cujo apoio o Brasil depende em instâncias como o G-20, é desconcertante testemunhar como o país, em um acordo ambiental como o Protocolo de Cartagena, abandona todas e quaisquer considerações ambientais. Tudo isto em troca da ilusória perspectiva de impor aos seus grandes clientes internacionais o consumo de produtos transgênicos que não querem comprar, e cuja origem, se fosse sabida, comprometeria até a balança comercial do país.