Exemplo disso é o trabalho que vem sendo desenvolvido na região Agreste da Paraíba. Desde 1993, a AS-PTA vem atuando em estreita cooperação com organizações da agricultura familiar articuladas pelo Pólo da Borborema, tendo alcançado impactos significativos no que se refere à implementação de inovações nos campos da gestão dos recursos hídricos e da conservação da agrobiodiversidade. Embora tenham demonstrado resultados econômicos e ambientais positivos, atingindo um número considerável de famílias (cerca de 5 mil), as inovações técnicas vêm sendo adotadas em escala ainda pouco expressiva.
Buscando reverter esse quadro de pouca visibilidade e consolidar práticas adotadas isoladamente, surge o projeto Agroecologia na Borborema – conversão ecológica da agricultura no Agreste da Paraíba, patrocinado pela Petrobras por meio do Programa Petrobras Ambiental. O objetivo é construir uma agenda socioambiental assumida por organizações da agricultura familiar de 15 municípios do Agreste da Paraíba para a implementação e divulgação de iniciativas demonstrativas de recuperação de áreas degradadas, reconversão produtiva de estabelecimentos familiares e uso ecoeficiente de lenha. O projeto também prevê ações de sensibilização ambiental junto a crianças e jovens rurais.
Para tanto, foram traçados os seguintes objetivos específicos:
- Implementação de sistemas agroflorestais em 150 estabelecimentos familiares;
- Redução da extração de lenha de remanescentes de caatinga em 50 estabelecimentos familiares;
- Redução da pressão de pastejo sobre os remanescentes de caatinga e aumento da disponibilidade alimentar para os rebanhos nos períodos secos do ano em 250 estabelecimentos familiares; e
- Desenvolvimento de um programa de educação ambiental para 1.800 crianças e jovens de 36 comunidades rurais de 13 municípios.
A ideia é propiciar maior segurança produtiva frente às instabilidades climáticas e a melhoria das rendas agrícolas, além de promover, simultaneamente, a prestação de serviços ambientais, no âmbito local e global, por meio da fixação e retenção de carbono atmosférico nos agroecossistemas em volumes bastante superiores aos atuais. As famílias agricultoras contarão com mudas e equipamentos para implementarem as inovações e participarão de oficinas, intercâmbios e seminários, seguindo a metodologia já aplicada com sucesso pela AS-PTA e parceiros envolvidos no projeto, a exemplo do Pólo da Borborema, da ONG Arribaçã, da Embrapa Algodão e da Universidade Federal da Paraíba (Campus de Bananeiras).
A primeira atividade desse plano de capacitação aconteceu nos dias 15 e 16 de Abril, no município de Solânea, com 30 participantes das comunidades de Palma, Bom Sucesso e Goiana, que estão à margem do Rio Bom Sucesso. A oficina abordou a importância da intensificação dos processos de arborização dos sistemas agrícolas para revitalizar a paisagem da região, tão degradada pelos ciclos econômicos que ali se sucederam: algodão, sisal e pecuária. Essa reconstituição histórica da ocupação da região, inclusive no que se refere à questão fundiária, é primordial para que se compreendam os mecanismos de produção e reprodução da condição de degradação atual. Como bem expressou João Macedo, da AS-PTA: Achei fundamental entender o processo de desarborização associado à concentração de terra e aos ciclos econômicos da agricultura no local.
Em seus depoimentos, os agricultores declararam ter percebido que o desmatamento causava desequilíbrios na natureza, tais como aumento de pragas e doenças, empobrecimento dos solos, inclusive com muitos sinais de erosão por toda comunidade, e alterações no clima e no regime das chuvas.
O grupo em seguida se dedicou a levantar o repertório das plantas nativas que ainda permanecem na região e suas funções: a macambira e o cumaru, muito usados como cerca-vida; a aroeira, remédio natural e melífera; o juazeiro e a baraúna, ótimos para criar sombras; o jucá e o marmeleiro, bons para lenha; o pereiro, usado como estaca; o Frei Jorge, serve como cabo de ferramenta; a imburana, o feijão brabo e o cardeiro, como forragens. Também foram ressaltadas as experiências de muitos agricultores que já cultivam diversas plantas forrageiras, como leucena, nim e gliricídia, e plantam o sabiá e até o pau d’arco.
No dia seguinte, os participantes foram convidados a visitar a propriedade da família de Zé de Pedro e Maria do Carmo. Em pequenos grupos, percorreram a área analisando como a família vem valorizando a árvore em seu sistema de produção, quais são as espécies usadas, em quais espaços foram plantadas, quais as funções que cumprem no sistema. Após a visita, os participantes trocaram suas impressões com a família, reconhecidamente a melhor forma de aprendizado.
À luz da visita e das discussões do dia anterior, cada família decidiu planejar seu processo de experimentação particular, mas também a comunidade priorizou o desenvolvimento de um projeto piloto de rearborização da mata ciliar em um trecho crítico do Rio Bom Sucesso.
Ainda para o mês de maio, estão previstas oficinas em outros municípios: Remígio (Assentamento Queimadas, Assentamento Doroth e Comunidade Caiana); Casserengue (Assentamento Santa Paula); Queimadas (Comunidades Catolé I e II) e Areial.
Com o aumento da abrangência do uso social das tecnologias inovadoras, o projeto Agroecologia na Borborema espera atingir a escala necessária para ampliar a capacidade demonstrativa das experiências para outras famílias agricultoras e para formuladores e executores de políticas públicas, mostrando como realmente o conhecimento local pode contribuir para o global.