A novidade, porém, reside no fato de que esses setores hoje tentam manipular a opinião pública ao assumir uma roupagem diferente, levantando a bandeira da justiça social em detrimento da preservação da natureza, como se fossem incompatíveis.
Além disso, recorrem a argumentos em que se colocam como guardiões da “soberania nacional”, que estaria ameaçada por uma conspiração internacional encabeçada por ONGs e ambientalistas. Com isso, polarizam posições, quando, na verdade, sabe-se que são justamente os pequenos agricultores que mais sofrem com as instabilidades e alterações climáticas. Portanto, os rumos do desenvolvimento do país só ganharão sustentabilidade quando houver preservação ambiental, justiça social e instituições verdadeiramente democráticas.
E é nessa perspectiva que Paulo Petersen, Diretor-Executivo da AS-PTA e Vice-presidente da Associação Brasileira de Agroecologia (ABA Agroecologia), aponta que, se aprovadas as alterações, o código deixará de ser florestal para ser ruralista. Veja artigo publicado no site da OAB-RJ.
O código ruralista
Para ser compreendida em todo o seu alcance, a proposta de alteração do Código Florestal, em tramitação no Congresso Nacional, deve ser contextualizada no pacto de economia política que vigora no mundo rural brasileiro. Vigente desde o governo FHC, esse pacto associa a estratégia governamental de realimentar o crescimento da economia com divisas captadas pela via da exportação de commodities agrícolas com os interesses de maximização do lucro por parte de grupos do agronegócio. É no quadro dessa aliança que um conjunto amplo de medidas legislativas vem sendo engendrado no sentido de remover “obstáculos legais” à expansão territorial das monoculturas industrializadas.
O foco central da proposta de mudança do Código está na desobrigação da função ambiental da propriedade rural prevista na Constituição Federal e, na esteira, a anistia dos crimes ambientais cometidos até 2008. A tese que a fundamenta parte do princípio de que florestas em propriedades privadas não podem ser consideradas bem público sujeito à regulação do Estado.
Tanto nessa como nas demais medidas legislativas pró-agronegócio, a bancada ruralista se vale do desgastado artifício ideológico que antepõe conservação ambiental a desenvolvimento para justificar suas posições perante a opinião pública. Só que, desta vez, os ruralistas contaram com o inusitado apoio de Aldo Rebelo, deputado federal pelo PC do B. Frente à enxurrada de críticas que vem recebendo dos mais variados setores da sociedade civil, o comunista que se colocou do lado do latifúndio e do capital transnacional dissimula ao invocar a existência de uma suposta conspiração internacional arquitetada por ONGs que pretendem manter o país no atraso.
Em uma época na qual os grandes dilemas socioambientais ocupam as manchetes, os mais elementares compromissos com a causa democrática e com a sustentabilidade são traídos em nome de uma opção de desenvolvimento que nos faz regredir ao reposicionar internacionalmente o país como exportador de produtos primários. E tudo isso a partir de uma política de aliança com o setor mais reacionário e parasitário da sociedade, cuja sobrevivência depende de pesados subsídios públicos na forma de créditos seguidos de perdões de dívidas, do uso predatório dos recursos naturais e da expropriação de enormes contingentes da população rural.
Paulo Petersen
Diretor-Executivo da AS-PTA e Vice-presidente da Associação Brasileira de Agroecologia (ABA Agroecologia)