As sementes tradicionais são fundamentais para a reprodução da agricultura familiar camponesa. Elas não só garantem a autonomia, como também representam o patrimônio genético e cultural de milhares de agricultores e agricultoras brasileiros. Em função dessa importância, na Paraíba, elas receberam o nome de Sementes da Paixão.
Para preservar essa riqueza, as organizações agricultoras que compõem o Polo da Borborema começaram a criar os Bancos de Sementes Comunitários (BSCs), que hoje já totalizam 80 em todo o Território da Borborema, que abrange 16 municípios, envolvendo diretamente 3.000 famílias agricultoras. Esse é um dos resultados do processo desenvolvido há 17 anos de parceria entre o Polo da Borborema e a AS-PTA, sempre buscando estimular o surgimento e a capilarização de processos sociais de inovação agroecológica na região.
A partir de 1999, o Polo da Borborema inicia diálogo com diversos órgãos do governo para fortalecer essa rede de bancos comunitários. Esta ação se deu de forma articulada com a Rede de Bancos de Sementes da ASA Paraíba, conformando um total de 220 bancos de sementes comunitários. Um marco nessa busca foi a aprovação da Lei n. 7.298 de 27 de dezembro de 2002, criando o Programa Estadual de Bancos de Sementes Comunitários e autorizando o Governo do Estado a adquirir sementes de variedades locais para abastecimento e ampliação dos BSCs.
Além disso, a expectativa é que outras políticas públicas também possam fomentar o desenvolvimento dessa iniciativa, sobretudo o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), da Conab, que desde 2003 vem permitindo que a rede de bancos compre sementes de variedades locais das famílias agricultoras, apoiando a recomposição dos estoques dos BSCs.
Em 2004, visando promover ainda mais esse processo de conservação do patrimônio genético das famílias agricultoras da Borborema, o Fórum de Desenvolvimento Territorial Sustentável da Borborema, atual Território da Cidadania, colocou como prioridade a construção do Banco Mãe de Sementes e um Centro de Atividades. O projeto inclui um galpão para armazenamento com capacidade para 20 toneladas de sementes, um almoxarifado, escritório e sala de aula. Além disso, a previsão é que o equipamento conte com um centro de atividades múltiplas, alojamento para 30 pessoas, refeitório e cozinha. Porém, apesar dos esforços do Polo, que protagonizou sucessivas mobilizações, a obra não foi concluída no percurso dos últimos seis anos, evidenciando descaso, irresponsabilidade e descompromisso dos governos anteriores.
Mas no último dia 27 de abril, no município de Lagoa Seca, o Governador Ricardo Coutinho finalmente inaugurou a primeira etapa da obra e se comprometeu a concluir o projeto.
As famílias agricultoras comemoraram a inauguração da sede do Banco Mãe de Sementes e o estabelecimento de um canal mais permanente de diálogo com o Governo do Estado. A realização de uma audiência pública com o governador em janeiro, que contou com a presença de diversas instituições públicas, como Emater, Emepa e Interpa, demonstrou a disposição da atual gestão de contribuir para a potencialização da agricultura familiar da região. Naquele momento, houve uma cerimônia de distribuição de sementes para o fortalecimento dos BSCs e foi firmado o compromisso do governo de executar a obra, integrando-a no plano dos 100 primeiros dias desde que Coutinho assumiu.
Em seu discurso em Lagoa Seca, Coutinho reconheceu a importância da obra: Mais do que um espaço a ser administrado pelo governo, será um espaço de compartilhamento e de libertação. O governo não quer fazer fila de agricultores para que ele próprio entregue as sementes não mão de cada agricultor (…) Nós queremos é estimular as organizações, queremos que esses espaços se transformem em grandes espaços de revitalização de nossa cultura.
As organizações agricultoras e parceiras entregaram na ocasião um documento em que apontam alguns problemas estruturais nas instalações, mas estão confiantes de que serão resolvidos e que o projeto será concluído na atual gestão. Como afirma Nelson Anacleto, representante do Polo da Borborema, os agricultores acreditam no compromisso assumido pelo atual governador: Antes nós víamos os movimentos sociais serem sempre enrolados, mas hoje o governo do estado já assumiu o compromisso com as organizações do Território.
Para Luciano Silveira, da AS-PTA: A importância dessa estrutura vai além do fortalecimento dos bancos, pois ela vai dar suporte ao papel que o Polo vem cumprido no fortalecimento da agricultura familiar e da Agroecologia no território. Portanto, o Banco Mãe de Sementes e o Centro de Atividades contribuirão para a articulação das ações, tais como o programa de criação animal, a rede de feiras agroecológicas, a rede de viveiros de mudas, entre outras iniciativas no território.
Tradicionalmente, a agricultura familiar camponesa reconstitui seus estoques de sementes a partir da produção própria de variedades locais, plantadas a cada ano. Porém, o tamanho reduzido das áreas de plantio e, sobretudo, a irregularidade climática têm comprometido as colheitas e, não raras vezes, as famílias acabam consumindo o estoque e não conseguem garantir a disponibilidade de sementes para plantar no ano seguinte. Daí a importância de iniciativas como a do Banco Mãe de Sementes para a autonomia e reprodução da agricultura familiar camponesa, desde que privilegie a sintonia entre todos os atores: famílias e organizações agricultoras, sociedade civil e poder público.