Nesta quinta-feira, 19 de setembro, uma mobilização reuniu mais de 300 pessoas entre estudantes, trabalhadores rurais, autoridades políticas e representantes de mais de 30 entidades da sociedade civil que integram o Comitê de Solidariedade Ana Alice. A manifestação lembrou um ano do desaparecimento e assassinato de Ana Alice de Macedo Valentim, adolescente de 16 anos, moradora do sítio Bodopitá, em Queimadas. A jovem, que era agricultora e militante do Polo da Borborema, foi raptada quando chegava em casa depois da aula, sendo estuprada e violentamente assassinada, tendo seu corpo sido encontrado apenas 50 dias depois, quando o assassino fez nova vítima, que conseguiu sobreviver e o denunciou.
Uma caminhada saiu às 9h da sede do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Queimadas e seguiu até o Fórum da Comarca do município. No local estava acontecendo uma audiência do caso Ana Alice onde foram ouvidas quatro testemunhas: a ex-mulher do assassino, a sua última vítima e os ex-patrões do acusado, donos da fazenda onde ele morava e onde o corpo de Ana Alice foi encontrado. Na ocasião também foi feito um interrogatório do criminoso.
Segurando faixas, cartazes e distribuindo panfletos as manifestantes pararam por alguns minutos em frente ao Fórum e usando apenas suas vozes, gritaram palavras de ordem, exigindo justiça para este e para os outros casos de violência contra a mulher. Após esse momento, a caminhada seguiu pelas ruas centrais da cidade até o largo da Igreja Matriz onde, em um palco montado, foi realizado um ato público e uma celebração, com a participação da família de Ana Alice e das famílias das duas mulheres, Isabella Monteiro e Michelle Domingos, assassinadas após o bárbaro estupro coletivo acontecido em Queimadas em fevereiro de 2012. Na ocasião também foi lembrada a morte de Elaine de Souza, adolescente de 16 anos assassinada pelo próprio pai, este ano também em Queimadas: “Precisamos dar um basta a tanta violência contra a mulher, a tanto machismo. Que Ana Alice e todas as outras vítimas sejam nossa inspiração para continuar lutando pelo direito de viver sem sermos violentadas”, afirmou Roselita Vitor, da coordenação do Polo da Borborema.
A celebração foi conduzida pelas lideranças do Polo da Borborema e pelo Frei Anastácio, também Deputado Estadual (PT-PB), que tem uma história de envolvimento com as lutas dos trabalhadores rurais do Estado: “Somos poucos, mas é um pingo d’água que faz com que a planta cresça e assim o povo vai tomando consciência e a realidade vai se transformando. Que Ana Alice, que já se tornou uma mártir, interceda por todos nós junto a Deus, para nos dar força para continuar lutando por justiça”, afirmou o religioso. Com cânticos e palavras de ordem a manifestação lembrou os 127 assassinatos de mulheres cometidos na Paraíba só em 2012 e os 45 homicídios cometidos entre os meses de janeiro e agosto de 2013.
Depoimentos – Muito emocionada, Angineide Macedo, mãe de Ana Alice, deu o seu depoimento: “Eu não consigo acreditar que aquilo seja um ser humano e sim um monstro”, disse se referindo ao homem que tirou a vida de sua filha. “Infelizmente sabemos que ainda existem muitos ‘Leônios’ por aí, é por isso que a nossa luta é importante. Enquanto eu tiver pernas e voz, eu estarei aqui para que a morte dela e das outras mulheres não fique impune”, concluiu. A irmã de Isabella Monteiro e a mãe de Michelle Domingos também se pronunciaram: “Mesmo que os mentores do crime cometido contra minha irmã estejam presos e a sociedade tenha a sensação de justiça sendo feita, o criminoso de Ana Alice agiu acreditando na impunidade, ainda temos muito a fazer. Hoje relembrando um ano do desaparecimento dela revivemos o momento terrível em que encontramos Isabella e Michelle”, disse Isania Monteiro. “Cada vez que acontece uma coisa dessas com uma mulher, a gente sofre junto. Estamos engajadas nessa luta por justiça. Agora estamos esperando o júri popular do assassinato das meninas e lutando pela condenação máxima, convocamos todas vocês para se juntar a gente mais uma vez”, enfatizou Maria José Domingues, mãe de Michelle.
O caso – Ana Alice foi raptada quando voltava para casa depois da aula, sendo estuprada e violentamente assassinada pelo vaqueiro Leônio Barbosa de Arruda, de 21 anos. Seu corpo foi enterrado próximo a residência do assassino, na fazenda onde ele trabalhava, na zona rural do município de Caturité. A adolescente permaneceu desaparecida até que nas imediações de sua comunidade, uma nova mulher foi raptada e violentada, sendo encontrada apenas no dia seguinte com marcas de esganadura, inúmeras escoriações e amputação parcial da orelha direita. Ainda muito traumatizada, ela foi capaz de reconhecer o criminoso (e vizinho) e o denunciou à polícia com a ajuda do Comitê de Solidariedade Ana Alice. Graças ao empenho do Comitê e à coragem desta vítima, o assassino foi preso e confessou o crime contra sua vizinha e contra Ana Alice. Confessou inclusive que, no crime contra Ana Alice, não agiu sozinho, teve a ajuda de um cúmplice, à época, menor de idade.
Ana Alice e a outra mulher, que tem medo de se identificar, não foram as únicas vítimas. No início de 2012, ao sair de um baile de carnaval, ele violentou uma jovem de Boqueirão. De posse de uma arma, obrigou que ela entrasse em seu carro e a estuprou. Um mês depois, após prestar depoimento do primeiro caso na delegacia desse município, tentou fazer nova vítima também em Boqueirão, agora uma adolescente de 14 anos que teve sorte diferente, quando um amigo a libertou da tentativa de estupro.
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