O Polo da Borborema na Paraíba iniciou no mês de fevereiro um novo ciclo de reuniões em preparação para a V Marcha pela Vida das Mulheres e pela Agroecologia, que acontecerá no município de Massaranduba. A quinta edição da Marcha, que é tradicionalmente realizada no 08 de março, dia internacional da mulher, acontecerá em 2014 excepcionalmente no dia 14 de março.
As reuniões preparatórias são momentos determinantes de mobilização, sensibilização e aprofundamento sobre temas como desigualdade de gênero, violência contra as mulheres e de como estas injustiças se expressam na vida das famílias agricultoras do território. Nestes momentos, as mulheres têm a oportunidade de conversar sobre os problemas comuns, ouvir e falar sobre as situações de desigualdade enfrentadas no seu cotidiano e de construir caminhos para superação dessa condição. Os encontros estão sendo realizados nos municípios que fazem parte do Polo e inspiradas pelo vídeo A vida de Margarida as mulheres saem com o compromisso de fazerem novos debates em suas comunidades. Em Massaranduba, o Sindicato vem promovendo reuniões também comunitárias, envolvendo o Conselho Municipal de Desenvolvimento Rural, a Prefeitura, as Secretarias de Educação e Saúde, a Câmara de Vereadores, a Igreja Católica.
No dia 21 de fevereiro, última sexta-feira, a Coordenação Ampliada do Polo da Borborema realizou uma reunião de sensibilização com as lideranças sindicais sobre o trabalho de mulheres e a realização da Marcha. “A gente acredita que o debate sobre as relações de gênero precisa ser compreendido não só pelas mulheres, mas também pelos homens. Por isso pensamos que momentos como este sejam importantes. À medida que as direções sindicais compreendem melhor estas relações de injustiça, o trabalho de acabar com a desigualdade passa a ser compartilhado por todos”, explica Roselita Vitor, da coordenação do Polo.
Emoção – A reunião foi iniciada com uma mística, onde uma mulher apareceu no centro da roda vendada, com a boca tampada e pés e mãos atados. “Por onde temos andado para realizarmos as reuniões preparatórias, temos encontrado muitas mulheres em situações como essa. Mulheres impedidas de terem uma vida plena”, explicou durante a mística Adriana Galvão, assessora técnica da AS-PTA que acompanha o trabalho com as mulheres. Em seguida os participantes foram se propondo a levantar e a “libertar” literalmente, aquela mulher. À medida que iam soltando uma de suas partes do corpo, diziam: “Liberto sua boca para que tenha o direito de falar, de opinar sobre o que pensa e decidir sobre a sua vida”, “Liberto seus pés para que possa caminhar e construir sua vida com seus próprios passos” e assim por diante, até que aquela mulher estivesse livre de suas amarras. O momento foi marcado pela emoção, que tomou conta de todas e todos, não contendo as lágrimas ao ver finalmente a mulher liberta chorando.
A mulher que protagonizou a mística é Ligória Felipe dos Santos, moradora do sítio Lagoa do Sapo, município de Esperança-PB e deu ao final um depoimento forte de superação: “Essa mulher era eu. Eu sofri um bocadinho, perdi muito almoço, muita janta, quando meu marido chegava bêbado em casa e jogava tudo fora, até as travessas, aí ninguém comia mais. Não tinha direto de sair de casa, nem de falar, de oferecer um almoço em casa. Aguentava tudo calada porque tinha medo dele vir pra cima de mim. Fugi muito pro mato com meus filhos, passava a noite nos lajedos, no escuro, com medo dele. Até que um dia minha filha com 14 anos arranjou um namorado que ele não queria, e ele correu pra tentar matar ela. Como eu já tinha começado a participar do movimento, da Marcha, arrumei coragem pra pedir ajuda e denunciei ele pra polícia. Foi difícil, o delegado ficou foi do lado dele, mas eu consegui evitar o pior. Hoje ele ainda não mudou 100%, mas eu creio que ele já é uma outra pessoa. E eu não tenho mais medo dele, se precisar, eu enfrento ele de novo, porque eu não me sinto sozinha. Vocês aqui me dão força e eu sinto como se tivesse uma segunda família”, disse em meio às lágrimas.
“A cada marcha é isto que está acontecendo, mais e mais mulheres estão se libertando, se superando. Mas ainda a gente vê muitas mulheres nessa situação, amarradas pela dominação, por isso que a Marcha é importante. E nós não realizamos a marcha só em um dia, mas o ano todo, com um conjunto de ações de valorização das mulheres”, avalia Marizelda Salviano, liderança do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Esperança-PB.
A reunião seguiu com uma rodada de impressões sobre a mística e a exibição seguida de debate do vídeo “Acorda Raimundo, acorda!”, do diretor Alfredo Alves. O curta-metragem provoca a reflexão quando mostra um dono de casa, grávido, que vive oprimido por sua mulher. Ela trabalha fora enquanto ele toma conta das crianças e da casa. O filme reproduz o machismo em uma situação inversa, mostrando a relação desigual comum entre as famílias de trabalhadores brasileiros. Homens e mulheres debateram sobre a proposta do vídeo e discutiram estratégias permanentes de organização e mobilização das mulheres do Polo.
A V Marcha pretende mobilizar cerca de 3.500 mulheres à partir das 8h30, na Vila Nicolândia, na entrada da cidade de Massaranduba.
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