Entre os dias 28, 29 e 30 de julho, a Articulação de Agroecologia do Rio de Janeiro (AARJ) e o Núcleo Interdisciplinar de Agroecologia (NIA) da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, promoveram o Primeiro Módulo sobre “Análise do Agroecossistema”, do curso Gestão Econômica da Transição Agroecológica, que terá pelo menos mais dois módulos. O curso ocorreu na Fazendinha Agroecológica Km 47, em Seropédica, e em quatro experiências agroecológicas de famílias localizadas no entorno (Japeri e Seropédica). A oficina foi realizada no âmbito do Projeto “Ambientes de Interação Agroecológica: Ensino, Pesquisa e Expressões da Agroecologia no Estado do Rio de Janeiro” e teve como objetivo a formação de multiplicadores desta metodologia. Neste sentido, técnicos de ATER (Assistência Técnica e Extensão Rural), estudantes, pesquisadores e alguns agricultores oriundos de várias localidades do estado do Rio de Janeiro formam a primeira turma do curso, que será replicado a partir da realidade e das demandas mais localizadas em algumas das regionais da AARJ no estado (Norte, Serramar e Metropolitana).
Para Paulo Petersen, Coordenador da AS-PTA e facilitador da oficina, um dos aspectos centrais dessa técnica é valorizar as estratégias socioeconômicas, construídas pela agroecologia. Para ele: “A agricultura familiar tem vários mecanismos que são desconsiderados pelos sistemas convencionais. São estratégias diferenciadas do sistema mercantil capitalizado. É exatamente essa capacidade de articulação social, cultural e familiar, que permite que agricultura de base camponesa – diferente de como foi apontado por diversos especialistas – se mantenha, contrariando a ideia de que o agricultor/a camponês tem sua atuação em decadência ou perto de seu fim”.
As metodologias exercitadas na oficina são resultado de acúmulos de pesquisas e análises de experiências que buscam expor os caminhos pelos quais, diferentes estratégias econômicas – de base familiar e comunitária- são utilizadas para a manutenção da produção agroecológica, onde as diferenças existentes com os sistemas convencionais compreendem uma das dimensões de análise. Para Fabrício Walter, envolvido diretamente com experiências agroecológicas em Guapimirim por meio da Associação dos Produtores Rurais, Artesãos e Amigos da Microbacia do Fojo – AFOJO, o desempenho econômico da produção baseada no modelo convencional de produção expõe suas fragilidades, quando “ao visitar uma experiências percebe-se que o agricultor recebe há anos o mesmo valor por sua produção, mas teve que, ao longo do tempo, ampliar de quatro para 25 o número de aplicações de agrotóxicos”, relata ele trazendo outras vivências semelhantes.
Catarina das Chagas, agricultora da região Norte, também expressa a transformação pela qual seu lote passou e o papel do agricultor camponês no processo de construção de outras relações econômicas não contabilizadas pelo sistema convencional, “quando cheguei na área era só pasto, uma terra degradada, morta. Hoje usamos esse processo que você apontou aí, a conversão. Mudamos, junto com a natureza, as condições para produzir melhor, de forma saudável. Hoje, onde era pasto improdutivo, é área para produção de mudas e de alimento”, reforça ela que está assentada em Campos dos Goytacazes, no Assentamento Che Guevara.
Para Mariana Rocha, bolsista do NIA/UFRRJ e uma das organizadoras do evento, é importante promover oficinas como essa para promover a agroecologia no Estado. “Existem algumas temáticas que são muito importantes e devem ser trabalhadas por pessoas experientes, de forma a estimular todos os parceiros a multiplicarem os conhecimentos em suas regiões, em todo o Sudeste brasileiro”, argumenta, em depoimento veiculado no portal da Embrapa, onde o curso também foi divulgado.
No segundo dia da oficina, o trabalho foi dedicado as visitas às experiências agroecológicas em transição e até mesmo em sistemas convencionais. Isabel Yamagushi, moradora do Assentamento Eldorado, em Seropédica, é um dos exemplos de que a agroecologia é sobretudo uma forma de resistência que evidencia o papel da agricultura camponesa. Das 72 famílias que viviam no assentamento, poucas resistiram à pressão da especulação imobiliária, à construção do Arco Metropolitano e ao Aterro Sanitário, que está instalado nas proximidades do Assentamento. Em um dos seus depoimentos indica que “Daqui a 20 anos, a gente vai sentir a falta da juventude hoje no campo. A minha geração está acabando aqui. A ligação com a terra está em risco, o agricultor, da terra mesmo, está no fim. Daqui a pouco essa história acaba”, relata ela, compartilhando sua preocupação com o futuro. Uma das propostas da oficina é exercitar um novo olhar sobre as práticas desenvolvidas nos territórios.
Magno dos Santos, extensionista da Emater de Itaguaí, aponta essa dimensão ao relatar que “esta foi a primeira vez, em seis anos de acompanhamento no Sítio São Jerônimo, em Mazomba-Itaguaí, que ele observou a dimensão das trocas. Conseguiu, a partir da colaboração das pessoas, visualizar outras questões que ele ainda não tinha percebido, não só nas práticas econômicas, mas também a partir de algumas informações que a prática convencional da assessoria muitas vezes não permite perceber”. Por fim, ele relata que o retorno do projeto para as famílias é central nesse processo de troca e construção.
Temas como os fluxos econômicos, o diálogo com as experiências acumuladas pelos agricultores e agricultoras e o fortalecimento de espaços de troca entre articuladores da agroecologia nas regiões, dentre outros elementos, marcaram o desenvolvimento desse primeiro módulo do curso. Cabe destacar também a percepção sobre a autonomia das famílias, uma das principais contribuições da metodologia.
Agora, a proposta é a replicação das oficinas em diversos territórios é um dos compromissos do Projeto Ambientes de Interação Agroecológica. Irradiar nos territórios fluminenses os conhecimentos trocados e construídos ao longo dos três dias de oficinas, de maneira que as metodologias empregadas auxiliem a monitorar e estimular o viés econômico das experiências, valorizando a diversidade, o potencial de ampliação e as relações sociais tecidas pela produção orientada pela agroecologia. Para saber mais sobre a proposta e se integrar às regionais da AARJ, escreva: [email protected] e [email protected].
Fonte: www.aarj.wordpress.com