Avaliar as potencialidades e limites da Resolução Inea 86/2014, vem sendo uma das prioridades para a Articulação de Agroecologia do Rio de Janeiro (AARJ), que segue com seu compromisso de promover conexões e diálogos entre o poder público, as experiências de agroecologia e as demais interfaces necessárias para a consolidação da agricultura de base camponesa no estado do Rio de Janeiro.
Como um dos desdobramentos do II Seminário de Práticas Agroflorestais e Pousio que ocorreu no dia 10 de julho de 2014, foram realizadas no último mês duas mini-oficinas com objetivo de exercitar a aplicação prática dos formulários, instrumentos de registro e comunicação, dessa nova normativa. A proposta central das mini-oficinas foi, a partir de aplicações concretas e baseada nas dinâmicas dos territórios, expandir o diálogo com agricultores e agricultoras inseridos em contextos representativos para a análise, conhecimento e apropriação da Resolução.
Como apontado pelos encaminhamentos do II Seminário, o grupo de trabalho, formado pela Associação Mico Leão Dourado, pela AS-PTA e por membros da Articulação de Agroecologia da Região Serramar, esteve em duas experiências distintas abordando o contexto da Resolução em áreas, recobertas por vegetação secundária de Mata Atlântica em estágio inicial de regeneração (Item IV do Artigo 4º) e pousio (Artigo 11). Outra atividade promovida pós o II Seminário, foi a divulgação da Resolução para os agricultores e assessores técnicos participantes do Projeto Profito Agrobiodiversidade, uma parceria da Fiocruz CFMA e a UFRRJ. Além destas duas possibilidades proporcionadas pela Resolução 86, a implantação, manejo e exploração de Sistemas Agroflorestais poderão ser autorizadas pelo INEA, nas áreas de preservação permanente localizadas em pequena propriedade ou posse rural familiar e na recomposição e manejo de Reservas Legais.
A primeira oficina, realizada no dia 19 de setembro, teve como principal objetivo a análise de implantação de SAFs no Projeto de Desenvolvimento Sustentável “Osvaldo de Oliveira”, assentamento rural localizado na região Serrana de Macaé. O grupo adentrou-se nas áreas ainda pouco exploradas do Assentamento e, com apoio de um grupo de cerca de 15 agricultores que participaram da atividade, percorreram as bordas das matas do assentamento, determinando um topo de morro como experiência para implantação de SAF em áreas recoberta por vegetação secundária em estágio inicial de regeneração.
Dentro do limite desta área, o Grupo reservou uma nascente, que conforme a referida Resolução, “os Sistemas Agroflorestais só poderão ser implantados visando à recuperação da função da área e quando não houver necessidade de supressão de vegetação nativa”. A área foi demarcada e o debate sobre as formas de convivência com as florestas que cobrem mais de 62,65% da área total do Assentamento que tem mais de 1.600 hectares, animaram a reunião com o grupo que se preparava para visitar a experiência da Cooperafloresta em Barra do Turvo (SP).
O Assentamento Osvaldo de Oliveira, uma conquista do MST recém reconhecida pelo INCRA (fevereiro de 2014), prossegue na construção de novos projetos e iniciativas que buscam consolidar as agroflorestas como uma relevante prática agroecológica e de produção em áreas de conservação ambiental. Durante a visita foi possível visualizar nas fazendas vizinhas, e ainda mantidas por grandes proprietários, clarões com queimadas e bois nas áreas de APP. Os assentamentos dizem que estão registrando essas ameaças e que apostam na agrofloresta como estratégia de vida e renda, demonstrando a potencialidade das áreas de Reforma Agrária como experiências de conservação e recuperação ambiental.
Trazendo o acúmulo do debate sobre pousio e demais técnicas da agricultura tradicional, o grupo de trabalho seguiu no dia 20 de setembro para a experiência movimentada pela Associação dos Agricultores Familiares de São Pedro da Serra e Adjacências (AFASPS), na propriedade do Jailton Eller, no distrito de São Pedro da Serra em Nova Friburgo.
O debate que reuniu a direção da Associação de Agricultores, assessores técnicos de entidades ligadas a AARJ, trouxe as preocupações dos agricultores sobre os prazos para retorno do INEA, os impactos das restrições sobre o uso de fogo e a aplicabilidade dos formulários, tendo em vista a limitação de técnicos diante do grande número de agricultores e territórios com práticas do pousio. Foi indicada a necessidade de construir, com o conjunto da Associação, uma primeira proposta de plano de uso das áreas de pousio, que possam avaliar de forma integrada as propriedades e permitir a apresentação unificada das demandas de uso das áreas de pousio.
Por fim, na reunião com a equipe técnica do Projeto Profito Agrobiodiversidade e os agricultores, o assessor técnico da AS-PTA e membro do Grupo de Trabalho que vem acompanhando os desdobramentos da Resolução no estado, aproveitou para divulgar a Resolução 86, uma vez que o projeto fortalece, na região do Maciço da Pedra Branca, sistemas agroflorestais com propósito de produção de plantas medicinais, implantados antes da publicação da Resolução, em janeiro de 2014.
Casos como este, de agroflorestas implantadas antes de janeiro de 2014, precisam ser comunicados ao INEA, conforme o Artigo 13. Nesse processo, no dia 05 de novembro, a Equipe Técnica do Profito irá promover uma Oficina de Dinâmicas de SAFs, ocasião em que será aproveitado para uma nova roda de divulgação da Resolução e preparação da documentação exigida para a regularização da área junto ao INEA.
A partir dessas experiências, uma reunião entre a Articulação de Agroecologia e o INEA, realizada no último dia 03 de outubro, apresentou as ponderações feitas pelo grupo de trabalho ao longo das reuniões e nas experiências de aplicação prática.
Além de sugestões inseridas no corpo da resolução, como encaminhamentos da reunião, três novas atividades foram agendadas buscando abordar as principais questões destacadas a partir do o diálogo entre: 1) o GELAF/INEA para entendimento do processo de licenciamento do pousio e uso do fogo, 2) o ICMBio, na perspectiva de articular parcerias interinstitucionais, e 3) com demais parceiros da pesquisa com a proposta de reunir, sistematizar e aprofundar estudos relacionados a prática de SAF e pousio do Rio de Janeiro, na perspectiva de implementar o artigo 14º indicado na resolução e propor uma nova redação para o Artigo 11.
O convívio entre florestas e agricultura, apesar de prática tradicional, vem perdendo espaço, sendo reprimida – no geral – pelos órgãos ambientais e paulatinamente esquecida com a pressão dos modelos convencionais de produção agrícola. A possibilidade de construir com o INEA os caminhos pelos quais essa Resolução irá se consolidar aponta-se como uma oportunidade de reduzir os desafios da agricultura camponesa e potencializar as práticas agroflorestais em todo o território Fluminense.
Leia aqui a Resolução Inea No. 86
Fonte: Articulação de Agroecologia do Rio de Janeiro