– “Manhê! Quero morar no mato”. Foi com essa frase que o jovem Adryan Almeida demonstrou à sua mãe o quanto estava satisfeito em participar do 5º Tira Caqui. Seu irmão, igualmente feliz com a atividade, não fez diferente. Pediu vitamina da fruta e ainda criou uma receita para sua mãe, Rosilane Almeida. Se fosse apenas pelo vínculo demonstrado por esses adolescentes já seria válida a criação e manutenção desse evento.
O Tira-Caqui foi organizado pela primeira vez no ano de 2011 numa parceria entre o Projeto Profito e a Rede Ecológica. Desde então, o dia 21 de abril tem sido dedicado à colheita solidária dessa fruta, que é uma demonstração da vitalidade da agricultura na cidade do Rio de Janeiro. A Rede Carioca de Agricultura Urbana (CAU) tem gestado e aperfeiçoado esse evento com muita eficiência e carinho com agricultores e consumidores. A Rede CAU é um movimento social que enfatiza a agroecologia na cidade do Rio de Janeiro. Como tal trabalha em convergência com a economia solidária como setor e em sua forma mais tradicional que denominamos dádiva. Esse é o princípio fundante do Tira Caqui. O feriado de Tiradentes é então, pelo quinto ano consecutivo, dedicado à dádiva do caqui e da agricultura local.
Desde sempre ouvimos dos agricultores e agricultoras do Maciço da Pedra Branca que há falta de mão-de-obra, que a colheita e a logística são difíceis e consequentemente há um grande desperdício dessa fruta. Essa necessidade gerou então a novidade do evento. Enquanto consumidores organizados, homens, mulheres, jovens e crianças subiram a montanha para a colheita. Foi um ato de solidariedade, não como algo piegas ou moralista, mas como um fluxo de informação, de força de trabalho e como resposta da organização à resistência dos agricultores da região.
Em 2014 foram colhidas 120 caixas da fruta no sítio do seu Tiago. Este ano o grupo colheu 10 caixas. Não foi a falta de disposição ou de entusiasmo dos consumidores participantes do evento que provocou a redução da colheita. Segundo Jorge Cardia, diretor da Agrovargem e um dos guias do evento, o dono do sítio visitado esse ano, seu Gá, ficou muito feliz com a visita e o trabalho em equipe. No entanto pediu que não colhessem tanto caqui. Não havia como transportar ou como comercializar grande quantidade. Esse episódio nos dá três desafios. Um ligado aos mercados, o segundo ligado à próxima safra do caqui e uma terceira provocação ligada ao fatalismo do pensamento dual.
Há então uma margem para ampliar a comercialização e distribuição do caqui no entorno do Maciço da Pedra Branca. Acho que todos devem pensar em como contribuir para que esse rico alimento, essa comida de verdade não se perca. As estratégias de beneficiamento em curso têm seu papel na medida em que o caqui é muito frágil. Uma vez colhido, em poucos dias se torna impróprio ao consumo. Relembramos o papel da agricultora Sampaia do Rosário que criou o vinagre de caqui hoje amplamente produzido por outros agricultores da Agroprata. O vinagre é muito apreciado pela ecogastronomia. Ele atualmente passa por processos de melhoramento com parcerias em torno da Embrapa, Universidade Rural e outras organizações. A Agroprata também produz o caqui-passa, já conhecido por alguns. Convidamos as parcerias para ampliarmos as novidades relacionadas ao caqui.
Em segundo lugar encontramos espaço para a ampliação do agroturismo voltado à colheita. Ainda nesta safra, os grupos que quiserem colher caqui podem entrar em contato, Há guias de turismo agroecológico prontos a organizarem grupos de colheita do caqui. Se unirmos a esse interesse algumas estratégias de acesso a mercados talvez se reduza ainda mais o desperdício, mais renda seja gerada e comida de verdade chegue com mais facilidade na mesa do carioca.
Por fim, o terceiro aspecto citado diz respeito a coexistência da dádiva e da solidariedade com as estratégias mercantis de puro e simples comércio. Não se trata de dádiva ou mercado. O pensamento crítico amadurecido não permite certos dualismos do tipo isto ou aquilo. Entender que vivemos em uma sociedade capitalista é assumir que até atos de solidariedade “pagam passagem”, ou seja, tem seu custo. Por outro lado os mercados sempre se organizaram a partir da sociabilidade humana. Nesse sentido, iluminar a dádiva típica das sociedades originárias como fundamento da agroecologia apenas solidifica o acesso aos mercados justos, solidários e sustentáveis.
A cada ano entre os feriados de 21 de abril e o início de maio, temos dez dias para saborear essa complexidade. Este ano ainda há tempo de participar. O 1º de maio é dia da Festa do Caqui onde experimentaremos, além do caqui-passa, outras iguarias e a fruta em si. Esse segundo evento dedicado a essa maravilha carioca será realizado no Sítio Farol da Prata, Estrada da Batalha, 202, Rio da Prata, Campo Grande (RJ/RJ). Para saber mais sobre esses eventos escreva para [email protected] [email protected]. Contamos com o teu consumo ético.
Fonte: www.aarj.wordpress.com/
Foto: Rosilane Almeida