Nos dias 31 de agosto e 01 de setembro, um grupo formado por nove visitantes, representantes de organizações do Senegal, Índia, Peru e Holanda que integram a AgriCultures Network (rede dedicada a apoiar atividades de sistematização e divulgação de experiências em agroecologia pelo mundo), visitou duas propriedades de agricultores da região de atuação do Polo da Borborema, uma rede de 14 sindicatos de trabalhadores rurais, que com a assessoria da AS-PTA Agricultura Familiar e Agroecologia, trabalha desde 1993 pelo fortalecimento da agricultura familiar de base agroecológica na região.
A primeira experiência visitada foi a de Marinalva Berlarmino, mais conhecida como “Nalva”, moradora do Assentamento Junco, município de Remígio-PB. Com o apoio do Sindicato dos Trabalhadores Rurais do município e da Comissão de Saúde e Alimentação do Polo da Borborema da qual faz parte, Nalva diversificou a sua produção de frutas, hortaliças, plantas medicinais e roçados, além de fortalecer a sua criação de galinhas de capoeira e de gado com a ajuda de tecnologias sociais como as cisternas de placas e a cisterna-calçadão para produção. Além de ter se aberto para um mundo novo, onde seu saber e sua capacidade são valorizados e reconhecidos, a agricultora colhe outros frutos a partir da sua nova forma de organização comunitária e produção, que impactaram a qualidade da alimentação e a saúde da sua família: “Criei três filhos muito saudáveis. Sempre que eles viajam, eu tenho a preocupação e recomendo o cuidado com a alimentação. Aqui em casa em caso de doença a gente recorre primeiro às plantas medicinais antes que qualquer coisa”, afirma Nalva.
Um grupo de mulheres agricultoras experimentadoras do Polo da Borborema acompanhou a visita e ajudou a contextualizar a experiência de Nalva, que tratou sobre temas como o enfrentamento à violência contra a mulher, o beneficiamento de frutas e outros produtos da agricultura familiar e o acesso aos mercados e às políticas públicas pelas mulheres. Perguntada pelos visitantes sobre se os consumidores das feiras agroecológicas não estariam dispostos a pagar um preço a mais pelos produtos orgânicos, Anilda Pereira, da Coordenação da Ecoborborema, associação que reúne os feirantes do Polo da Borborema, respondeu: “O nosso propósito não é apenas vender, é ser solidário, pois a gente não quer que o nosso alimento vá apenas para a mesa de quem tem condições. O nosso público é de pessoas pobres também, por isso o nosso preço é justo”, disse.
As mulheres também falaram sobre o movimento criado em torno da luta pelo fim de todas as formas de violência contra a mulher, com a realização pelo sexto ano consecutivo, da Marcha pela Vida das Mulheres e pela Agroecologia, que reúne milhares de mulheres agricultoras da região: “O trabalho e os momentos de formação específicos para as mulheres surgiram porque, em muitos espaços, a gente não enxergava o trabalho e a contribuição da mulher na agricultura, as mulheres experimentavam, mas estavam isoladas. Hoje a gente diz que mal dá tempo de guardar as nossas bandeiras, pois a gente termina uma marcha e já está marchando de novo”, disse Gizelda Bezerra, liderança do Polo da Borborema. A experiência das mulheres impressionou os visitantes: “Estou muito impressionada com a sua alegria em fazer a agricultura e o amor que têm pelo que fazem, pela sua força, o que eu tenho ouvido aqui, fazem de vocês um exemplo para o mundo inteiro”, afirmou Janneke Bruil, do Ileia – Centre for Learning on Sustainable Agriculture, da Holanda.
Na tarde do dia 31/08, os visitantes se reuniram na sede da AS-PTA, onde o Polo da Borborema apresentou a forma como organiza o seu trabalho na região, que envolve 5 mil famílias, por meio de comissões temáticas: saúde e alimentação, que engloba o trabalho com as mulheres; recursos hídricos; criação animal; sementes e manejo da fertilidade dos solos; agrobiodiversidade; infância e juventude e acesso a mercados. Encerrando o primeiro dia de visita, o grupo participou do lançamento do vídeo “Minha vida é no meio do mundo”, produzido pela AS-PTA e pelo Polo no Cine RT, em Remígio-PB.
A segunda propriedade visitada foi a da família dos irmãos Fernanda e Alex da Silva Marques, adolescentes da Comissão de Jovens de Massaranduba, moradores do Sítio Cachoeira de Pedra D’água. Os dois jovens são coordenadores do núcleo de juventude de sua comunidade: “Depois que passamos a participar, mudamos a nossa forma de trabalhar e colocamos em prática aqui o que aprendemos lá fora. Nós tentamos trazer cada vez mais jovens para participar e hoje na comissão municipal já temos mais ou menos 100 jovens participando”, avalia Fernanda.
Os visitantes conheceram experiências como a da esterqueira, tecnologia para o beneficiamento de esterco, produção ao redor da cisterna-calçadão, campo de multiplicação de sementes feito por meio de mutirão de jovens agricultores e criação de pequenos animais como caprinos e galinhas com apoio do Fundo Rotativo Solidário voltado para a juventude, entre outras. “O Fundo Rotativo Solidário, além de contribuir com a vida de muitos jovens, ajuda a organizar nossas comunidades, diante do desafio de aumentar as criações com propriedades tão pequenas, foi que surgiu o FRS de galinhas de capoeira, também como uma forma de enfrentar uma ameaça que nós temos que são as galinhas caipiras. A luta pela terra é importante para nós, mas primeiro a gente precisa reafirmar a importância que a terra tem nas nossas vidas: pra quê a gente quer terra? Essa reflexão vem dar um sentido à luta pela terra pelos jovens”, afirmou Maria Gabriela Galdino dos Santos, liderança da comissão de jovens municipal.
Mais de 20 jovens da comissão municipal participaram da apresentação da experiência e falaram sobre a importância que o tema da juventude tem ganhado dentro do trabalho do Polo da Borborema: “A juventude hoje ocupa vários espaços, está presente nas comissões temáticas, nas feiras agroecológicas. Eu mesma sou o exemplo de uma jovem que achava que precisava sair do campo, mas a partir do momento em que comecei a participar, eu fui me enxergando enquanto agricultora e vi que o jovem também faz parte da agricultura”, disse Mônica Lourenço, liderança jovem do Assentamento Caiana, em Massaranduba.
AgriCultures Network – A atividade mais conhecida da AgriCultures Network é a produção de revistas dedicadas à divulgação e análise de iniciativas de agroecologia. A revista Agriculturas: experiências em agroecologia, editada pela AS-PTA – Agricultura Familiar e Agroecologia, corresponde à edição brasileira do projeto editorial da rede. Produzida desde 2004 e com tiragens trimestrais, a revista é distribuída para milhares de subscritores de todas as regiões do país.
O grupo que visitou a região da Borborema é composto por representantes de organizações que editam revistas similares em países da África, Ásia, América Latina e Europa. As revistas produzidas pela rede chegam regularmente a mais de um milhão de leitores por meio de edições publicadas em inglês, francês, espanhol, português e 5 línguas locais da Índia.