Cerca de 90 agricultores e agricultoras representantes dos 60 Bancos de Sementes Comunitários no Território da Borborema se reuniram no dia 14 de abril, em uma oficina de formação sobre os transgênicos e suas ameaças, realizada no Santuário Santa Fé de Padre Ibiapina em Arara-PB. Preocupado com o avanço dos transgênicos no território, o encontro buscou iniciar um diagnóstico de possíveis contaminações de milho transgênico a partir das amostras trazidas dos vários BSC do Polo da Borborema, além do lançamento de uma campanha sobre as ameaças das sementes transgênicas no território da Borborema.
O encontro partiu da contextualização da atual conjuntura de ameaça às Sementes da Paixão pelos transgênicos e também do resgate sobre a trajetória de combate e crítica aos transgênicos realizadas na região pelos agricultores e agricultoras da região. Foi relembrado um seminário semelhante, realizado em 2014, quando 36 amostras de milho foram examinadas não foi encontrada nenhuma variedade contaminada. Já em 2015 alguns materiais transgênicos começaram a ser identificados e este ano, de 66 amostras, 9 apresentaram transgenia. Analisou-se que avanço vem acontecendo, sobretudo em virtude das seguidas seca vividas nos últimos quatro anos e consequentemente da baixa na produção dos estoques de milho na região. As famílias que não estão organizadas nos BSC foram obrigadas a recorrer à aquisição de sementes para plantar em seus roçados no mercado convencional onde a grande maioria é transgênica. Outra ameaça fortemente debatida está ligada ao Programa Venda de Balcão da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), onde todo o milho comercializado é transgênico e mesmo sendo grãos algumas famílias por não ter estoque acabam plantando essas sementes em seus roçados.
“Não estamos começando esse debate agora, nós já prevíamos esses avanços dos transgênicos no Território, por isso que entregamos em 2014 uma carta a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) denunciando que o milho vendido pela Companhia na Paraíba era transgênico, além disso, fizemos atos de denúncia em Campina Grande durante a VI Festa das Sementes da Paixão em 2015”, relembra Emanoel Dias, assessor técnico da AS-PTA.
Ainda no primeiro momento, guardiões e guardiãs das Sementes da Paixão foram convidados a falar sobre a importância de suas sementes. “Essas são sementes da resistência”, disse Severina da Silva Pereira, conhecida como “Silvinha”, agricultora do Sítio Maracajá II, em Queimadas. Uma das responsáveis pelo Banco de Sementes de sua comunidade, Silvinha tem como Semente da Paixão a variedade de milho jabatão. “Se nós perdemos essa semente, perdemos a identidade da gente”, disse a guardiã. Além de patrimônio histórico e cultural, as falas desse momento ressaltaram a importância das Sementes da Paixão na autonomia e soberania alimentar das famílias agricultoras.
Mas, o que são transgênicos? – Foi no segundo momento do encontro que essa e outras dúvidas foram elucidadas para os agricultores e agricultoras. Dúvidas como: a quem interessa os transgênicos? Como são produzidas as sementes transgênicas? Como acontece a contaminação das sementes crioulas?
“Para que possamos entender como são produzidos as sementes transgênicas , elas recebem características de animais ou bactérias, na perspectiva de fazer aquela variedade possa ter maior produção e resistência”, explicou Emanoel Dias. Em contrapartida a essa aparente vantagem, Emanoel explicou que essas sementes além de precisarem de uso intensivo de agrotóxicos e outros químicos em sua produção, o agricultor acaba se tornando escravo de um mercado. “Além de não ser mais detentor de sua semente, o agricultor que planta essas sementes tem que comprar sementes todos os anos, é como se ele ‘alugasse’ essa semente”, completa o técnico.
Testes de Transgenia – Amostras de variedades de milho foram trazidas pelos guardiões e guardiãs para que testes fossem feitos durante o evento. Das 19 amostras, 4 foram identificadas com contaminação de transgênicos.
“Alguns agricultores acabam perdendo seus estoques, e ao adquirem sementes de origem desconhecida acabaram contaminando suas sementes”, disse o técnico. Após analises, algumas dessas sementes acabaram sendo identificadas como transgênicas, o que pode acarretar a curto prazo, a contaminação dos estoques no Polo da Borborema.
Medida importante para preservação das Sementes da Paixão são os Bancos de Semente Comunitários, que segundo levantamento feito em 2015 mantém cerca de 17 toneladas de sementes de feijão, milho, fava e outras variedades. Esses espaços coletivos de armazenamento garantem que as famílias agricultoras possam atravessar esse momento de crise de forma autônoma.
Campanha Territorial – Pensando em como ampliar o diálogo sobre o tema, uma campanha no território da Borborema foi pensada durante a tarde. Além de levar esses debates a escolas, conselhos municipais de desenvolvimento sustentável, comunidades que não têm bancos de sementes e dentro dos próprios STRs, os participantes pensaram ainda em materiais gráficos que pudessem auxiliar nessa divulgação.
Através dos programas de rádio do Polo, da multiplicação de matérias de panfletos sobre a temática, além da criação de materiais para as redes sociais, os participantes acreditam que conseguirão alcançar um maior número de pessoas e continuar nesse combate aos transgênicos, não só entre os agricultores e agricultoras ligados a dinâmica de trabalho, mas em todo o território.
Outra ação para proteger as variedades de sementes do avanço dos transgênicos no território construída pelos agricultores e agricultoras foi a criação de campos de multiplicação de sementes de milho nas propriedades famílias nos municípios de Alagoa Nova, Remígio, Casserengue, Areial e Lagoa Seca.
“Plantar transgênicos é apagar a história da agricultura, das sementes crioulas. Não só no território da Borborema, mas onde se quer fazer agroecologia e uma agricultura sustentável”, resume Emanoel.