Cerca de 50 agricultoras integrantes da Comissão de Saúde e Alimentação do Polo da Borborema participaram, nos dias 18 e 19 de abril, no município de Arara-PB, do IV Seminário Regional de Beneficiamento. A Comissão é formada por mulheres agricultoras dos municípios de atuação do Polo, que é uma articulação de 14 sindicatos rurais da região da Borborema na Paraíba, e é acompanhada pelo Núcleo de Saúde e Alimentação da AS-PTA Agricultura Familiar e Agroecologia, que assessora o Polo há mais de 20 anos.
O Seminário debateu boas práticas de acondicionamento e embalagem dos alimentos da agricultura familiar beneficiados, em sua maioria pelas mulheres, que os comercializam para os programas governamentais de compra direta, nas comunidades e na rede de 12 feiras agroecológicas da região da Borborema. São bolos, doces, polpas de frutas, geleias, compotas, cocadas, bolos, beijos e tapiocas, responsáveis pela geração de renda para milhares de agricultoras da região.
A programação foi iniciada com a socialização do conhecimento acumulado nos seminários que já ocorrem desde 2015, quando teve início o processo de formação no sentido de aumentar o aproveitamento dos alimentos, elevar a qualidade dos produtos beneficiados, por meio do aprimoramento das técnicas de processamento e da adequação às normas da vigilância sanitária vigentes.
Pela segunda vez, o evento contou com a contribuição da professora de tecnologia de produtos agropecuários Márcia Roseane Targino de Oliveira, do Centro de Ciências Agrárias da Universidade Federal da Paraíba (UFPB) Campus de Areia-PB. Márcia falou sobre a importância de uma higiene rigorosa no acondicionamento, momento de envasilhar os alimentos, inclusive como forma de aumentar a sua validade e garantir a sua qualidade e sabor.
A professora ensinou as técnicas de higienização e da pasteurização de potes de vidro e de plástico para o acondicionamento de doces, o que segundo ela, podem garantir uma validade de oito a 12 meses para o produto. Tratou ainda das embalagens e que tipo de informação é fundamental para os rótulos, além de mostrar os diversos tipos de lacres, suas vantagens e desvantagens.
Para demonstrar, na prática, as técnicas apresentadas, as agricultoras Adailma Ezequiel e Márcia Patrícia Silva, do Sítio Lutador em Queimadas, ambas integrantes do grupo de Beneficiamento “As Marianas”, prepararam um doce de mamão, que foi acondicionado em potes de vidro, esterilizados com água fervente ainda vazios e depois de cheios, colocados submersos em água para ferver, segundo a técnica da pasteurização. As participantes do Seminário puderam observar, fazer anotações e tirar dúvidas.
Soraya Henrique, assessora especializada no beneficiamento dos produtos da agricultura familiar, esteve presente no Seminário e falou sobre a importância do debate com os poderes públicos acerca da legislação para a comercialização dos produtos da agricultura familiar: “Infelizmente, nossa legislação não tem uma certificação para produtos artesanais. Entendo que o espaço de produção pode ter os parâmetros de qualidade e de higiene da indústria, mas com uma identidade de artesanal. Essa política precisa ser discutida com o nosso prefeito, com o nosso vereador, o nosso deputado, para que ela possa atender as exigências e seja viável para a realidade da agricultura de cada local”.
Um novidade da quarta edição do Seminário de Beneficiamento, foi o diálogo iniciado com a Vigilância Sanitária Municipal, por meio da presença do agente e atual Coordenador da Vigilância Sanitária do Município de Massaranduba Aldair José Martins. Ele falou sobre o processo dialogado de construção do selo S.I.M (Serviço de Inspeção Municipal) em seu município, provocado pela direção do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Massaranduba, pois as agricultoras estavam enfrentando dificuldades para vender produtos para a merenda escolar.
Finalizando o primeiro dia de evento, Adriana Galvão Freire, assessora técnica da AS-PTA, socializou com as participantes, a trajetória de criação da linha “Do Roçado – produtos da agricultura familiar da Borborema”, que traz uma identidade visual comum e uma padronização de etiquetas, rótulos e embalagens para os produtos comercializados na rede de feiras agroecológicas da EcoBorborema, associação que organiza a comercialização da produção de famílias agricultoras do Polo da Borborema, seja nas suas 12 feiras agroecológicas, seja nas compras governamentais de alimentos.
Após a apresentação, foi feita uma rodada de debates sobre a importância da padronização das embalagens e sobre como fazer para multiplicar o recurso inicial que adquiriu as primeiras embalagens, por meio da criação de fundos rotativos, a exemplo do que já acontece para a compra de sacolas plásticas biodegradáveis com a marca da EcoBorborema.
Joancely Gomes, do Sítio Nova Canaã, em Esperança-PB, acredita que as embalagens e rótulos padronizados não são uma despesa a mais, elas vem para agregar valor ao produto: “Acho que se a gente está investindo para agregar valor ao produto, aquele produto não pode mais ser vendido pelo mesmo preço de antes, é justo que esse valor seja repassado no preço final, eu tenho certeza de que o consumidor entende que isso é uma segurança, é uma melhoria naquilo que ele está levando pra casa”, afirmou.
O segundo e último dia do Seminário foi dedicado à apresentação do monitoramento que a Comissão de Saúde e Alimentação realizou acerca da produção das agricultoras no tema do beneficiamento, o quantitativo produzido, consumido e comercializado, bem como o impacto dessa produção na renda das famílias.
Os resultados preliminares desse estudo impactaram as mulheres que conseguiram reconhecer a importância econômica do seu trabalho. Dos 16 estudos realizados, foram levantados de setembro ao final de março, um longo período marcado pela forte estiagem, o beneficiamento de mais de 30 produtos diferentes, utilizando 17 tipos de frutas, 5 produtos do roçado e 5 de origem animal. Durante os 8 meses de estudo, essas mulheres produziram pouco mais 27 mil reais. A partir dos resultados, perceberam a importância da diversidade de produtos para a segurança alimentar e para a venda nas feiras; o papel dos programas de compra direta no fortalecimento da agricultura familiar; mas também perceberam que a diversidade de mercados é muito importante para a economia da mulher e por fim, puderam debater sobre a importância da economia não monetária, aquela representada pela melhoria da alimentação da casa e a responsável pela solidariedade. As mulheres que participaram do encontro saíram animadas para continuar o monitoramento da sua produção.
O trabalho da Comissão de Saúde e Alimentação do Polo da Borborema conta com o apoio do Projeto “Agroindustrialização caseira por mulheres camponesas no semiárido brasileiro”, com recursos financeiros da entidade de cooperação internacional espanhola Manos Unidas.