O Núcleo de Infância e Juventude da AS-PTA Agricultura Familiar e Agroecologia está encerrando mais um ciclo dos chamados “Mutirões” da Campanha de Valorização da Vida na Agricultura Familiar, realizada desde 2003 em parceria com os 14 sindicatos de trabalhadores rurais que compõem o Polo da Borborema. Os mutirões são atividades que acontecem duas vezes por ano reunindo crianças de duas ou mais comunidades rurais, com uma proposta de trabalhar de uma maneira lúdica com as crianças, filhos e filhas de agricultores familiares, temas que dizem respeito a sua vida e o seu dia-a-dia como: água, sementes, arborização, espécies animais, alimentação, biodiversidade, etc. Com o uso do teatro, da dança, da música e das brincadeiras tradicionais, os conteúdos são trabalhados de forma a valorizar o conhecimento trazido pelas crianças com o objetivo de despertar nelas o respeito e a valorização pelo trabalho na agricultura familiar.
Em 2017, o tema escolhido para ser trabalhado foram os direitos e os deveres de homens e mulheres, dentro e fora de casa. “Nós vimos percebendo que esse tema sempre aparecia por dentro de outros que nós já trabalhamos, como no tema da água, em que alguns afazeres como as tarefas de lavar roupa e de ir buscar água para o consumo só eram remetidos à mulher. Então percebemos a necessidade de refletir sobre isso também com os filhos e filhas dos agricultores”, afirma Maria Denise Pereira, pedagoga e assessora técnica da AS-PTA.
Neste primeiro semestre de 2017, aconteceram 53 mutirões, envolvendo mais de 70 comunidades de 13 municípios da região da Borborema, na Paraíba. As atividades acontecem com o envolvimento da comunidade e das escolas do campo, nas sedes de associações e também nos prédios de escolas rurais, em 2017, os mutirões aconteceram em 18 escolas.
Caracterizada como “Super Margarida”, Maria do Socorro Santos, ou Coka, como é conhecida, a assessora técnica da AS-PTA interage com as crianças, as convidando a conhecer a casa de um casal de bonecos de pano, que neste caso foram chamados de João e Maria. Com o auxílio de um mural de pano, ela vai mostrando as tarefas da família como cozinhar, passar, dirigir, lavar, trabalhar na roça e pede que as crianças dividam entre os dois moradores. Com as tarefas afixadas ao lado da pessoa a quem lhe corresponde e o painel montado. Coka vai questionando as crianças sobre como é a divisão dentro de suas casas e assim as crianças vão questionando antigas e falsas ‘verdades’.
José Alisson Marques da Silva, de 14 anos, era um dos mais participativos. Ele comenta que em sua casa, com três filhos meninos e duas meninas, o painel formado seria diferente, com as tarefas bem distribuídas entre homens e mulheres. “Eu lavo louça, arrumo minha cama e também varro a casa, às vezes, não tem nada a ver, não”, conta. Maria Denise explica que nos mutirões tem surpreendido bastante a reação de muitos jovens e crianças e o resultado após as discussões: “A gente conheceu um local onde as meninas tinham vergonha de ir a escola usando bonés, por causa de apelidos maldosos que recebiam. Depois da atividade da campanha, elas começaram a usar, sem se preocupar”, comenta.
Tássia Pereira de Souza tem 19 anos e, desde os quatro, participa dos mutirões da Campanha em sua comunidade, Cachoeira de Pedra D’água, no município de Massaranduba-PB. Hoje a jovem faz parte da Comissão de Juventude municipal e avalia a importância do tema escolhido em 2017: “Em muitos espaços as mulheres eram desvalorizadas em relação ao homem. A mulher é quem era sempre privada de fazer certas coisas. E eu acho que o que é certo é que não existam diferenças de tratamento, é importante as crianças já crescerem não tendo o preconceito. Chegar lá na juventude já sabendo que os direitos são iguais”, disse.
A AS-PTA e o Polo da Borborema já tem uma caminhada na luta contra o machismo e a violência contra a mulher, há oito anos realizam, no dia Internacional da Mulher, a Marcha pela Vida das Mulheres e pela Agroecologia, que em sua última edição, levou as ruas mais de cinco mil mulheres agricultoras, lutando pelo fim da violência e pela afirmação do papel das mulheres no campo. A marcha é a expressão de um movimento que acontece durante todo o ano de mobilização de uma rede de mulheres agricultoras experimentadoras, que tem, através do seu trabalho e das suas capacidades, superado desafios, melhorado a sua vida e vencido a violência, em muitos casos.
Neste segundo semestre de 2017, haverá um novo ciclo de mutirões aprofundando a temática. A Campanha de Valorização da Vida na Agricultura Familiar acontece desde 2003 com o apoio da organização de cooperação internacional ActionAid.