Com o intuito de conhecer o “Programa Cisterna e Programa Nacional de Apoio à Colheita de Água de Chuva e Outras Tecnologias Sociais para o Acesso à Água”, participar da 7a Feira Estadual das Sementes da Paixão e trocar experiências, representantes da AS-PTA do Paraná e do Coletivo Triunfo visitaram o Polo da Borborema na Paraíba.
A imagem estereotipada de que o sertão não pode ser produtivo e sustentável começa a ser descontruída, provando que com políticas públicas eficazes os agricultores nordestinos são capazes de continuar morando nas regiões semiáridas, produzindo alimento e superando a seca. Foi esta nova realidade que a AS-PTA – Agricultura Familiar e Agroecologia do Paraná e o Coletivo Triunfo foram conhecer. O grupo viajou na quarta-feira, 5 de outubro, até o Polo da Borborema, região entre o Sertão e o Litoral do estado da Paraíba.
O Polo da Borborema faz parte do Programa de Desenvolvimento Local do Agreste da Paraíba, conduzido pela AS-PTA, que abrange uma rede de 15 sindicatos de trabalhadores rurais (STRs) em 15 municípios, juntamente com 150 associações comunitárias e uma organização regional de agricultores ecológicos. Ao todo, mais de cinco mil famílias agricultoras são atendidas pelo Programa.
Na quinta-feira, 6, o grupo do Paraná iniciou as visitas na propriedade do agricultor José Nivaldo, conhecido como “Seu Niva” no município de Areial. O solo arenoso, o clima seco e a falta de água não foram motivos para Seu Niva desanimar. Utilizando iniciativas simples, mas funcionais em sua propriedade, ele tem conseguido produzir, respeitando a biodiversidade da região de maneira consciente. Seu Niva conta que a vida no local mudou muito depois da construção das cisternas (ele possui duas na propriedade), pois agora é possível tirar o sustento da família e permanecer no campo. O Programa de Cisternas tem como objetivo a promoção do acesso à água para o consumo humano e para a produção de alimentos por meio da implementação de tecnologias sociais simples e de baixo custo. O público do programa são famílias rurais de baixa renda atingidas pela seca ou falta regular de água, com prioridade para povos e comunidades tradicionais. Para participarem, as famílias devem necessariamente estar inscritas no Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal. O semiárido brasileiro é a região prioritária do programa. Para essa região, o programa está voltado à estruturação das famílias para promover a convivência com a escassez de chuva, característica do clima na região, utilizando principalmente a tecnologia de cisternas de placas. Esse programa, premiado pela ONU nesse ano, o Brasil está na lista junto com Austrália, China, região de Tigray da Etiópia, Jordânia e Níger.
Seu Nivaldo conta que possui as cisternas há 4 anos, cada uma com capacidade para 52 mil litros de água e que nesse período nunca conseguiu encher, a água chega apenas até a metade do reservatório. Mas, que isso já tem sido o suficiente para dar um alívio ao plantio na terra seca. Ele também é produtor de mel, utilizando abelhas nativas, recolhendo cerca de 90 kg por ano. Além disso, tem instalado em sua propriedade um biodigestor ecológico. O utensílio custou pouco mais de dois mil reais, possibilitando que a família não gaste com a compra de botijões de gás para o uso doméstico na cozinha. Além disso, a família faz parte da rede de guardiões de sementes da paixão. Na Paraíba, as sementes locais são chamadas de sementes da paixão. E é para preservar essa paixão que milhares de famílias na Borborema – e também em todo o estado – vêm criando e mantendo bancos de sementes familiares. Nesses bancos, toda a riqueza está armazenada em silos, garrafas pets ou em latões. As sementes da paixão são símbolos da vida em abundância, heranças deixadas pelos antepassados, cuidadas na atualidade para que as futuras gerações continuem tendo acesso a esse importante bem.
O Banco Mãe dessas Sementes foi inaugurado no dia 27 de setembro desse ano e está localizado no Sítio Quicé, entre os municípios de Lagoa Seca e São Sebastião de Lagoa de Roça. O espaço recebeu quase R$ 1,5 milhão de investimento, em parceria com o Governo Federal, e vai beneficiar cerca de 5 mil agricultores. Em 2017, foram monitorados, no território, 62 Bancos de Sementes Comunitários (BSC), envolvendo mais de 1.500 famílias. Elas catalogaram 27 espécies e 120 variedades diferentes de sementes estocadas. Juntos, os BSC armazenaram, nessa safra, quase 20 toneladas de sementes da paixão. Esse é um grande resultado considerando-se que os últimos 04 anos foram marcados por uma forte estiagem. O Banco Mãe consolida na região um programa de seguridade das sementes da paixão, como são conhecidas localmente, e irá exercer múltiplas funções: cumprirá papel na conservação da diversidade de sementes do território; na regulação dos estoques da Rede de Bancos de Sementes Comunitários; nas práticas de beneficiamento e comercialização das sementes crioulas; no acesso aos programas públicos de sementes.
Nos dias 6, 7 e 8, o grupo participou da 7a Feira de Sementes da Paixão, que teve como tema o “Fortalecendo a Resistência e Celebrando a Vida no Semiárido”. A festa foi realizada pelo grupo ASA – Articulação do Semiárido, com apoio da prefeitura municipal, BNDES, Ministério do Desenvolvimento Agrário, Brasil Agroecológico e Governo Federal. A festa marca a resistência diante das ameaças à conservação
das sementes crioulas, seja pelas secas sucessivas, pelas políticas de distribuição de poucas variedades de sementes em grande escala, ou pelo risco de contaminação de transgênicos. Nos últimos três anos, desde realização da última Festa, muitos avanços importantes no âmbito das políticas públicas foram conquistados e construídos dentro do Plano Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica (Planapo).
Por Priscila Ernst com informações AS-PTA/Paraíba
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