A Rede de Fundos Rotativos Solidários da Paraíba, dentro da sua proposta de realizar encontros itinerantes, esteve reunida nos dias 23 e 24 de outubro, segunda e terça-feira, no município de Maturéia, Médio Sertão da Paraíba, na Área Experimental do Centro de Educação Popular e Formação Social – CEPFS, entidade que compõe a ASA Paraíba. No local, foi compartilhada a experiência do Fundo Rotativo Solidário do Assentamento Poços de Baixo, município de Teixeira-PB, que tem o apoio do CEPFS.
Os agricultores Verônica Teles Leite e Francisco de Assis Martins dos Santos, conhecido como “Preto”, compõem a comissão gestora do fundo e falaram sobre a experiência, que nasceu oficialmente em outubro de 2016, embora já estivesse viva há muito tempo nas práticas da comunidade e em outras experiências no município de Teixeira. Preto contou que, antes mesmo da criação do Fundo, a associação comunitária, que existe desde 2001 quando o assentamento foi criado, tinha a prática de fazer girar os recursos arrecadados com a contribuição dos seus sócios. “Em Teixeira, os fundos rotativos toda vida foram muito fortes. Eu sempre tive vontade que tivesse um na nossa comunidade. Em 2016, a partir de um diagnóstico dos fundos existentes no município, resolvemos criar. Iniciamos em outubro, com 21 pessoas, e uma contribuição mensal de 10 reais. Eu achava que era pouco, mas, ao mesmo tempo, não podia aumentar porque a gente precisava olhar para as condições de cada um. Em janeiro, já começamos os empréstimos”, lembra.
Preto se refere ao Projeto “Sertão Agroecológico e Solidário”, desenvolvido pelo CEPFS, com o apoio da entidade de cooperação internacional Misereor, que deu um aporte no valor de três mil reais para o fundo do assentamento. Segundo Verônica, todas as decisões do grupo são registradas em ata: as pessoas interessadas em adquirir, o valor dos empréstimos, a negociação sobre o parcelamento e as devoluções. Eles se reúnem durante a reunião mensal da associação comunitária ou quando sentem necessidade.
Ainda segundo a liderança, das atuais 28 pessoas que fazem parte do fundo, 21 já foram beneficiadas, algumas mais de uma vez, sempre priorizando naquele mês quem ainda não foi comtemplado: “Em um ano, pelo nosso fundo já circularam 10.365 reais, contando o apoio de 3 mil do projeto e mais de 7 mil das contribuições de sócios”.
Preto explica que o recurso do fundo já serviu para as mais diversas finalidades na comunidade, reparo de telhados, despesas com saúde, inclusive a atividades geradoras de renda: “É muito bom ter um empréstimo para forrar ou rebocar a casa, mas quando a gente pega um recurso para uma horta, uma criação de galinhas, aquilo já é uma renda que retorna para você. Esse fundo é um orgulho para nós. Todas as comunidades que vão bem, são as que tem fundos rotativos”, avalia.
Em seguida, José Rêgo, agente educador do CEPFS, fez uma contextualização do trabalho com os Fundos Rotativos Solidários na região do Médio Sertão, desde o seu início, por volta do ano de 1993: “O que a gente queria, a partir de uma ação mais concreta junto às comunidades, era resgatar práticas de solidariedade que aconteciam nas comunidades e que vinham se perdendo a exemplo dos mutirões, das rodas de conversa, da própria partilha”. José Rêgo lembra que no início, a principal demanda das comunidades era por tecnologias de captação e armazenamento de água e que a gestão dos fundos era feita por uma comissão formada por um membro de cada comunidade e um representante do CEPFS. Com o tempo, se percebeu a necessidade de descentralizar a gestão destes fundos, permitindo que cada comunidade fosse a gestora dos seus recursos, a partir das suas demandas. “Temos que lembrar que o fundo rotativo solidário não é uma imposição, é convencimento. As comunidades que mais se destacam, são as onde as pessoas estão mais convencidas”.
Após as apresentações, foi feita uma rodada de dúvidas e comentários sobre a experiência: “Temos que saber que as pessoas jamais vão colocar o seu dinheiro nas mãos de quem não confiam. E a experiência que conhecemos mostra que confiança se adquire com transparência, a inadimplência de quase zero de vocês mostra que só funciona quando as pessoas estão preparadas para se colocar no lugar do outro. Se não existir isso, de nada vai adiantar ter o carnê, o termo”, frisou Ivanilson Estevão, assessor técnico da AS-PTA Agricultura Familiar e Agroecologia.
Foram tirados ainda encaminhamentos para os próximos encontros da rede como iniciar um debate sobre a moeda social nos fundos rotativos da Paraíba e a participação da Rede em espaços como o Fórum Estadual de Economia Solidária – FEES/PB.
Os Fundos Rotativos Solidários (FRS)
O fundo rotativo solidário é uma poupança comunitária gerida coletivamente por meio da doação voluntária de recursos por cada membro participante do fundo ou ainda pode ser constituída a partir de ações e recursos externos destinados à comunidade. Os recursos se destinam a melhorias na produção da agricultura familiar e nas mais variadas necessidades dos sócios. Os fundos podem ser divididos entre temáticos e comunitários, a depender da finalidade a que se destinam.
Funciona assim: quando uma família adquire um benefício (cisterna, biodigestor, fogão ecológico, tela, etc.), assume a responsabilidade de contribuir mais adiante com a poupança devolvendo o valor do bem recebido (ou aquela quantia determinada pelo grupo) para que ela ou outra família possa ser beneficiada novamente. Dessa forma, o fundo nunca fica vazio.