Na manhã da última terça-feira (16), no município de Massaranduba, Agreste Paraibano, ocorreu uma audiência pública que reuniu educadores, mães e pais agricultores, vereadores, representantes da Secretaria Municipal de Educação, do Ministério Público, do Sindicato dos Trabalhadores Rurais, da Rede de Educação do Campo da Borborema, da Rede de Educação do Semiárido Brasileiro – RESAB, do Comitê Estadual de Educação do Campo e da Articulação do Semiárido Paraibano para discutir a proposta de nucleação das escolas rurais da gestão atual. A nucleação é a junção de duas ou mais escolas em um único prédio, deslocando as crianças do ensino fundamental I – de 4 a 11 anos – de uma comunidade para a outra ou até mesmo para uma escola do centro urbano. Esse processo tem provocado o fechamento várias das escolas rurais. Na Paraíba, dos 85 municípios onde a Articulação do Semiárido Paraibano executou o Programa Cisternas nas Escolas, cerca de 90 escolas já foram fechadas.
Massaranduba faz parte do território de atuação do Polo da Borborema, uma rede de 14 sindicatos de trabalhadores rurais da região. O Polo integra a Articulação do Semiárido Paraibano – ASA Paraíba, que através da parceria com a Articulação no Semiárido Brasileiro – ASA Brasil, e do Ministério do Desenvolvimento Social – MDS, construiu cisternas de 52 mil litros em 19 escolas rurais do município de Massaranduba. As cisternas vêm como uma solução para amenizar o problema da falta de água para o funcionamento das escolas rurais e muitas nem chegaram a ser utilizadas pela comunidade. Segundo o Sindicato dos Trabalhadores Rurais do município, das 19 escolas beneficiadas no município, oito já foram fechadas.
De acordo com Maria Leônia Soares, presidente do Sindicato, a entidade tem sido procurada por várias comunidades rurais preocupadas com o fechamento de suas escolas. No ano passado, a mobilização da comunidade de Jacu, com o apoio do Sindicato, ASA e Resab, entre outros parceiros, conseguiu evitar o fechamento da Escola João Pequeno da Silva. “É na comunidade que a criança constrói laços com a sua identidade camponesa, que ela tem o primeiro contato com a natureza. Fechar uma escola do campo não é só fechar uma estrutura, é fechar os caminhos para a oportunidade de educação”, afirma Maria Leônia.
Na audiência, após a coordenadora pedagógica de Massaranduba e a Secretária Municipal de Educação, Josilene Silva, apresentaram a proposta de nucleação do município, vários pais e mães se manifestaram, todos contrários à proposta. Maria do Socorro da Silva Diniz é mãe de dois filhos, o mais velho tem sete anos e estuda na Escola Emanuel Bezerra, na comunidade de Cachoeira de Pedra D’água, desde os quatro. Ela contou que, quando criança, estudou na Emanuel Bezerra e destacou a qualidade do ensino ao afirmar que a escola não deixa nada a dever à escola privada na qual seu filho estudou quando morou na capital, João Pessoa. “Me digam como é que uma mãe vai jogar seus filhos pequenos em um ônibus para um lugar distante, para quem está fora, é fácil falar. Eu vou ter que sair com o meu outro filho recém-nascido para ter que levar ele lá na escola, no meio de um sol quente, isso vai nos prejudicar muito”, disse. Outra grande preocupação dos pais e mães é com as estradas do município que não têm manutenção e ficam difíceis de serem transitadas no período de chuva, o que obrigaria crianças já a partir dos três anos e meio de idade a fazer longos e demorados deslocamentos.
A gestão municipal alega a preocupação com a redução no número de matrículas, a segurança das escolas rurais que são alvo de roubos e a quantidade de turmas multisseriadas, quando alunos de séries distintas são ensinados por um mesmo educador na mesma sala de aula.
A professora do curso de Licenciatura em Educação do Campo da Universidade Federal de Campina Grande – UFCG, Campus Sumé, integrante da Comissão Nacional de Educação do Campo do Ministério da Educação e do Comitê Estadual de Educação do Campo, Maria do Socorro Silva, acompanhou a audiência e lembrou que a gestão precisa ficar atenta ao marco normativo da educação no campo, sobretudo o parágrafo único do artigo 28 da Lei no 9.394, de 1996, (Lei de Diretrizes e Bases da Educação) que determina que o fechamento de uma escola rural só poderá ser feito após a aprovação da comunidade escolar mediante assinatura em ata.
A professora também rebateu o argumento que as turmas multisseriadas seriam por si só, motivo de precarização do ensino: “O rural é um espaço de baixa densidade demográfica. Portanto, o ensino não pode seguir as mesmas formas de organização que o urbano e nossa legislação permite que façamos isso. Na Finlândia, 30% das turmas são multisseriadas, em Portugal, todas as turmas do campo o são. Qual a diferença deles para nós? Lá o poder público assegurou condições para as famílias permanecerem no campo, garantiu estrutura, formação continuada de professores. Aqui, enquanto universidade, preciso fazer o mea culpa, não fomos capazes de formar educadores e gestores suficientemente preparados para lidar com essas realidades. Não somos contra a nucleação mas, segundo a lei, ela só deve acontecer para os anos finais do ensino fundamental ou para a oferta do ensino médio em parceria com os estados, justamente para evitar que o jovem saia do campo”. Por fim, ela lembrou que não existe uma legislação atual que limite o número mínimo de alunos por turma.
Diante dos apelos das comunidades, a gestão municipal prometeu rever algumas das propostas, porém deve seguir com o seu plano de nucleação, contrariando a vontade da maioria das famílias presentes. O Sindicato dos Trabalhadores Rurais, junto às famílias, vai denunciar a situação junto ao Ministério Público Federal, para evitar o nucleamento.
24 mil escolas do campo fechadas
No Brasil, desde o ano de 2002, mais de 24 mil escolas do campo foram fechadas. Os dados do Censo Escolar do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep), do Ministério da Educação, apontam que, no meio rural, existiam 107.432 escolas em 2002. Já em 2009, o número de estabelecimentos de ensino reduziu para 83.036.