Entre notícias de mais agrotóxicos liberados para uso no Brasil, eis uma boa nova. Foi lançado ontem, na Paraíba, no território da Borborema, um projeto que vem reforçar mais ainda a capacidade e coragem dos guardiões e guardiãs de sementes crioulas. Trata-se do Projeto Agrobiodiversidade do Semiárido, que realizará ações em cinco estados da região. Na Paraíba, o projeto vai atuar em 13 municípios. A iniciativa é fruto da parceria entre a Articulação Semiárido Brasileiro (ASA) e a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) e conta com o apoio da Fundação Eliseu Alves e do Banco de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).
Na terça passada (12), o evento que marcou o início das ações do projeto teve a presença de 50 guardiões e guardiãs de sementes, assessores técnicos e representantes da Rede de Sementes da Articulação do Semiárido Paraibano (ASA Paraíba). O momento aconteceu no Banco de Sementes Comunitário do Sítio Campos, em Montadas, no Agreste da Paraíba.
Os agricultores e agricultoras presentes fazem parte de articulações territoriais de sindicatos, organizações comunitárias e organizações não-governamentais que promovem o fortalecimento da agricultura camponesa: o Fórum de Lideranças do Agreste (Folia) e o Polo da Borborema, que é uma rede de 13 sindicatos de trabalhadores rurais, parceiros da AS-PTA Agricultura Familiar e Agroecologia. Na Paraíba, o Projeto Agrobiodiversidade do Semiárido é executado pela AS-PTA.
“Este projeto vai na contracorrente de um modelo capitalista de desenvolvimento que vê as sementes como mercadoria, o modelo que distribui poucas variedades de sementes em grandes volumes e geralmente produzidas em outros sistemas de produção que não representam a realidade da agricultura familiar de base agroecológica, sem considerar a realidade e o trabalho de conservação e melhoramento das sementes da paixão realizado pelas famílias agricultoras”, pontuou Emanoel Dias, assessor técnico do Núcleo de Sementes da AS-PTA. O Agrobiodiversidade do Semiárido se soma às estratégias que já acontecem nos territórios para fortalecer e valorizar a agrobiodiversidade dos biomas Caatinga e Cerrado a partir de ações coordenadas com redes locais.
“É muito importante a comunidade não ficar submissa às coisas que venham de fora. Os projetos que vem tem que ser uma injeção de ânimo para aquilo que já existe na comunidade”, comentou seu Joaquim Santana, um dos guardiões presentes que veio do Sítio Campos, Montadas.
A região onde o projeto vai ser implementado é recheada de iniciativas que se reforçam com relação às sementes crioulas. Só para citar dois exemplos, em Lagoa Seca, um dos municípios beneficiados com a ação, há o Banco Mãe de Sementes, que alimenta a rede com 60 bancos comunitários de sementes de toda o território da Borborema. E, em Lagoa Seca, está sendo implantada também a Unidade Regional de Beneficiamento do Milho Livre de Transgênico, que produzir derivados do milho livres de transgênicos, como fubá, xerém, mungunzá e em breve, flocão.
As frentes de ação estão voltadas para a formação dos guardiões e guardiãs, estruturação de sistemas de produção e beneficiamento de sementes, implantação de campos de multiplicação de sementes crioulas e fortalecimento de redes e canais de comercialização.
Durante o evento, foram apresentadas duas experiências de gestão de Bancos de Sementes Comunitários, o da Comunidade Canoa de Dentro, em Pedra Lavrada, e do Sítio Furnas, em Montadas. A partir das experiências apresentadas, foram debatidos os desafios para ampliar a conservação do material genético que alimenta quem vive na região.
Um dos desafios é a sensibilização dos agricultores sobre os riscos da contaminação do seu material pelas sementes transgênicas de milho. “Mesmo com as dificuldades, precisamos fazer a nossa parte para garantir a nossa semente limpa, porque sabemos que a semente transgênica, não adaptada, ela dá um ano ou dois, depois vai acabando, e, com a contaminação, vai acabar com as nossas também. Precisamos continuar nosso trabalho de convencimento”, disse Rosemary Alves, da comunidade Canoa de Dentro, Município de Pedra Lavrada.
“Nossa intenção é que as sementes guardadas nos bancos não sirvam só para os sócios, mas para toda a comunidade, justamente para evitar que venham as sementes de fora que possam contaminar as nossas”, frisou Antônio Fernandes, do município de Aroeiras, território do Folia.
No final do encontro, os guardiões e guardiãs levantaram estratégias para enfrentar o avanço dos transgênicos, entre elas a necessidade de ampliar a atuação da campanha “Não Planto Transgênicos para Não Apagar a Minha História”, desenvolvida pelo Polo da Borborema e pela AS-PTA e que se espalhou por toda a Paraíba por meio do trabalho da Rede de Sementes da ASA.