2022 começou com formação de três dias em comunicação digital para a juventude do Polo da Borborema
No território da Borborema, o ano de 2022 começou com dois quentes e um fervendo. Cerca de 30 jovens ligados ao movimento sindical participaram de uma oficina de três dias – 19, 20 e 21 de janeiro – sobre comunicação digital focada em temas super urgentes para o debate como capitalismo de vigilância, segurança no uso dos dispositivos móveis e aplicativos e fakenews. A oficina também ofereceu um dia para os/as participantes produzir, roteirizar e editar vídeos de um minuto a partir de seus próprios celulares.
A iniciativa faz parte de um processo de formação dos/as jovens em cidadãos e cidadãs digitais. O objetivo foi apresentar a lógica e a intenção por trás das redes sociais para que eles/as, como usuários de aplicativos como WhatsApp, Instagram, YouTube, tik tok, entre outros, possam fazer uso consciente destes dispositivos e a favor da coletividade.
“Nós queremos formar pessoas críticas frente às fakenews, entendendo mais sobre o ambiente digital, conhecendo os desafios no âmbito da segurança dos dados e construindo estratégias para a gente aprimorar a disputa por este espaço a partir da construção de conteúdos e imagens sobre o que fazemos no território”, comenta Adriana Galvão do Núcleo de Comunicação da AS-PTA na Paraíba.
No primeiro dia da oficina, que teve a facilitação de Isadora Lira, jornalista e pesquisadora integrante do Coletivo Intervozes, o tema foi segurança digital. A pergunta moobilizadora era: De que modo podemos tornar um pouco mais seguro o uso dos aplicativos? Isadora destaca que a privacidade dos dados deve ser vista não só como uma questão importante apenas para o indivíduo, mas também para a coletividade.
O alerta sobre a segurança dos dados de interesse coletivo – como conhecimentos associados à biodiversidade – é algo, de fato, super importante. As grandes empresas de tecnologia têm avançado muito sobre este tipo de conhecimento, assim como sobre a terra e o território para extração de minérios utilizados na cadeia produtiva eletrônica, tecnológica e digital.
E os jovens rurais são parte de um segmento social que possuem conhecimentos de interesse das grandes corporações da área de tecnologia. Eles são e convivem com os guardiões e guardiãs da biodiversidade em seus territórios. Eis mais um elemento que reforça a importância da formação da consciência crítica com relação ao uso das redes sociais.
“Tudo neste ambiente digital é muito exposto. Vimos as ameaças e os riscos trazidos pelos aplicativos com relação aos nossos dados. Tiramos muitas dúvidas desde o uso do WhatsApp, aplicativo bem corriqueiro pra nós, até como manter nossos dados no sigilo com relação ao cartão de crédito. Como podemos nos proteger para dificultar mais que acessem nossos dados?”, conta Edson Possidônio, assessor técnico do Núcleo de Juventude e Agrobiodiversidade, e conhecido como Edinho.
“Esta parte da segurança chocou muito a gente. Muitas novidades”, comenta o jovem Matheus Silva, que faz parte da Comissão Executiva de Jovens do Polo da Borborema. “Muitos aplicativos sempre estão conectados com a gente como se tivesse nos vigiando para vender produtos. Sempre estão com o microfone ligado para nos escutar e oferecer o que a gente comentou que queria. Isso é assustador, na verdade. Até um jovem perguntou se isso acontecia até quando a gente leva o celular para o banheiro. É claro que sim (rs).”
Neste dia, os/as jovens se dedicaram a configurar os aparelhos para deixá-los mais seguros, como o bloqueio da tela inicial e a não permissão para que as mensagens dos apps apareçam mesmo com as telas bloqueadas, criação de senhas para o acesso aos apps e fazendo a opção pela segurança em duas etapas, a partir da criptografia.
No segundo dia, facilitado por Yago Paolo, comunicólogo e videomaker, foi o momento dos/as participantes colocarem as mãos na massa. De ampliar os conhecimentos sobre a produção de conteúdo usando o celular e os programas de edição gratuitos. “Foi maravilhoso!”, dispara Matheus que tem 22 anos. “Houve uma palestra rápida sobre produção de vídeo e, depois, em grupos, fizemos documentários de um minuto.”
“Aprendemos sobre cenas de transição, que podem ser imagens de árvores, de céu. Ficamos atentos ao sol para não estourar a luz nas imagens. Para o áudio ficar limpo, uma dica é usar dois aparelhos. Um capta o áudio com o microfone do fone de ouvido. E o outro faz a imagem”, destaca. “Um dos participantes falou que o mundo da produção de vídeos não é mais um desconhecido, que já entende um pouco mais sobre isso”, dispara Matheus.
Para Edson, este dia foi bem lúdico e proveitoso porque muitos já faziam seus vídeos, a exemplo das jovens que trabalham nas Quitandas da Borborema, que criam vídeos para divulgar no Instagram os produtos disponíveis nas lojas. O próprio Matheus também tem uma certa prática na captura e edição de imagens.
“Sempre gostei de ficar gravando vídeos. Quando teve a abertura da Quitanda em Solânea, eu fiz um vídeo. Na campanha de minha mãe [Maria do Céu, sindicalista de Solânea e uma das lideranças do Polo da Borborema] para vereadora, eu fiz os vídeos dela se apresentando, andando nas comunidades e agradecendo os votos”, comenta.
No terceiro dia, foi a vez de direcionar a atenção para as fakenews, as informações falsas difundidas pelas redes sociais principalmente no tempo das eleições. Este dia foi facilitado por Isadora novamente. “Foi o momento para eles se perguntarem ‘que comunicação queremos?’ Sobre as fakenews vimos como identificá-las e também como detectar links maliciosos. Estamos lidando com plataformas desenhadas para serem opacas, sem nenhum processo de transparência sobre como funcionam”, ressalta Isadora, que está cursando doutorado na área de Sociologia na Universidade Federal da Paraíba e tem estudado os algoritmos no Twitter.
“O debate sobre as fakenews foi bem interessante”, conta Matheus. “Agora, a gente sabe que é preciso prestar atenção na fonte da informação, no sensacionalismo. Se estiver uma informação posta de forma muito escrachada, é bom duvidar. Na verdade, a dica é nunca acreditar de primeira, sempre pesquisar”, aconselha. “Fomos apresentados a vários aplicativos de pesquisa além do Google, como o duckduckgo.com”, diz ele.
Em suma, os três dias de oficina cumpriram com louvor o objetivo planejado. “Buscamos uma abertura de olhares para pensar uma comunicação consciente no que se refere aos riscos no uso da plataforma digital e, também, uma comunicação que dialogue com o movimento da juventude rural agroecológica”, assegura Edinho.
Na verdade, este foi mais um importante passo para despertar um olhar crítico e cidadão para o mundo digital, que aparenta ser paralelo, mas está completamente integrado ao mundo concreto e material. “Temos que deixar de pensar neste campo digital como desmaterializado. Pelo contrário, sua ação ele está muito ligado à terra, ao alimento…”, pontua Isadora, fazendo referência ao avanço das ‘big techs’ no ambiente rural. “Recentemente, li que Bill Gates (Microsoft) tem mais terra que os povos nativos nos Estados Unidos.” As big techs são as grandes corporações que dominam o mercado tecnológico em todo o mundo, como a Apple, Amazon, Facebook.