Passados dois anos de pandemia, sem grandes encontros presenciais, as lideranças e os participantes das comissões temáticas do Polo da Borborema voltaram a se reunir no mês passado, nos dias 16 e 17, no Santuário de Santa Fé, em Solânea.
“Essa é uma volta muito significativa e muito importante pra vida política do Polo e também para fortalecer as comissões temáticas para avaliar e fazer seu planejamento. Ao mesmo tempo, o nosso evento foi de reencontro. Tinha agricultores e agricultoras que a gente não conseguia ver há um certo tempo”, celebra Roselita Vitor, da coordenação do Polo, ressaltando que, em momentos como esse, quando se juntam diversos sujeitos do campo, a força do movimento sindical é renovada. “O Polo nasce a partir das percepções das bases e das lideranças”, aponta.
Foi um evento grande com mais de 100 pessoas. Havia gente antiga, envolvida nas dinâmicas do Polo de outras épocas, e gente nova que se soma ao movimento a partir de sua participação nos Fundos Rotativos Solidários bastante disseminados nos últimos anos entre os jovens e mulheres.
Na programação do encontro, houve um momento de reconexão com a história desse coletivo, formado por 13 sindicatos e cerca de 150 associações comunitárias. Um coletivo que tem força política e poder para concretizar suas intenções e desejos. O Polo criou uma associação, a EcoBorborema, que organiza os espaços de comercialização e também promove a certificação participativa das famílias agricultoras e criou também uma cooperativa com capacidade de atuar em toda a Paraíba, a CoopBorborema.
No encontro de agosto, também houve um momento de leitura do momento atual da vida no campo dentro do território. “Não me conformo com a fome no campo”, destacou Nelson Ferreira, liderança do sindicato de Lagoa Seca e membro da coordenação política do Polo. “Essa é a maior contradição que vivemos. O roçado é o nosso maior prato.”
E acrescenta um fenômeno que vem chamando atenção nos últimos anos: “Por quê têm muitas pessoas da cidade comprando a nossa terra? Precisamos fazer uma campanha para evitar que as terras caiam nas mãos de pessoas que não são agricultoras”, defende.
O passo seguinte foi se reunir em grupos temáticos para responder a pergunta: O que eu gostaria que tivesse e não tivesse no meu território? “É hora também de trazer a nossa base para essa reflexão e se sentir parte da construção de um projeto democrático, construído a partir do olhar das nossas lideranças e dos nossos agricultores e das agricultoras”, anuncia Rose.
E acrescenta: “O que significa esse momento pré-eleições para que a gente traga o debate sobre as políticas públicas? O nosso território é marcado pela construção de políticas públicas, de experiências práticas de convivência com o Semiárido, de agroecologia e de organização. Fizemos também uma construção coletiva de questões como a importância do voto consciente, da democracia. Refletimos também sobre o enfrentamento a alguns projetos de desenvolvimento que vem afetando a vida das famílias como essa questão da indústria das energias renováveis”, conta Rose. Essa atividade foi preparatória ao encontro que o Polo da Borborema promoveu junto aos candidatos e candidatas do campo progressista da Paraíba.
Luciano Silveira, assessor técnico da AS-PTA, organização que assessora o Polo na sua missão de construir um projeto político para o território agroecológico da Borborema, ajuda na provocação das reflexões: “O que queremos construir para o nosso território? Não é só votar dando carta branca. A gente quer dizer o que queremos. E antes de tomar posse, nos reuniremos novamente. Porque não nos satisfaz só as promessas. Queremos o compromisso pós eleições.”
As reflexões que foram feitas orientaram a elaboração da carta política do Polo da Borborema para as candidaturas. “As questões importantes para nós entraram nesse documento não como desafios, mas apontando caminhos, como políticas que foram e são importantes e outras que podemos construir”, sublinha Rose.
No segundo dia do encontro, foi o momento de falar sobre as inovações camponesas. “O que essas duas palavras dizem pra gente?”, questiona Luciano que estava na facilitação do momento. “Esse nome tem a ver com os recursos da natureza que o camponês se entrosou”, responde um. “Tem a ver com conhecimento e sabedoria, com agricultor que ensina o outro”, sugere outra pessoa.
Na conversa, Luciano faz um destaque: “A cisterna é uma inovação camponesa. É a tecnologia social mais disseminada no Semiárido brasileiro, onde estão implementadas mais 1,4 milhão de cisternas. Também está presente em vários países da África, América Central. Está ganhando o mundo.”
Daí por diante, várias pessoas lembraram de diversas inovações, como um método de estocar farinha de mandioca por mais de dois anos de forma que ela não perde o gosto. “Inovação não diz respeito a coisas novas, mas também ao que é adaptado para a nossa realidade”, salienta Luciano.
A seguir, Seu Joaquim Pedro de Santana de Montadas pontua: “Nós, que somos lideranças, temos que correr atrás dos tesouros escondidos que têm muitos nas nossas comunidades. Vai depender só de nossa capacidade de articulação.”
“A gente não seria um movimento sindical se não reconhecêssemos o papel dos agricultores e agricultoras como construtores de conhecimento e experimentadores”, sustenta Rose ao iniciar a apresentação de um programa do Polo que vai dar o tom da ação sindical na Borborema nesse segundo semestre.
“Programa de Inovações Camponesas. O que é isso? É, justamente, a gente identificar os agricultores e agricultoras que já fazem suas experiências a partir de alguma ação que ele tem no quintal, roçado ou arredor de casa, que a gente não percebeu ainda. Esse programa de inovações vai nos ajudar, a cada município, a levantar esses camponeses e camponesas pra gente poder fazer uma leitura desse conhecimento e dessa sabedoria. E daí, promover intercâmbios com outros agricultores/as dentro do território”, explica Maria do Céu Silva, liderança do sindicato de Solânea.
Nelson Ferreira destaca outro elemento muito importante que será favorecido a partir do novo programa. “Um programa como este visa exatamente trazer uma dinâmica muito importante para fortalecer, cada vez mais, a agricultura familiar e a agroecologia. E também traz pedagogias importantes para a gente trazer, cada vez mais, um número de agricultores e agricultoras para a transição agroecológica.”
Ferreira ressalta também que o Polo tem o desafio de, através do movimento gerado por esse programa, das sistematizações e intercâmbios realizados, influenciar políticas públicas municipais de fortalecimento da agricultura familiar agroecológica.
Para Rose, o novo programa tem a capacidade de enraizar a ação política do Polo “nesse chão que são essas experiências. E as experiências são processo organizador da construção da agroecologia, do movimento sindical. Teremos muitas reflexões sobre o papel do movimento sindical a partir dessa construção”, arremata ela.