‘Caatinga viva, floresta em pé’ foi um dos gritos mais frequentes da 15ª Marcha pela Vida das Mulheres e pela Agroecologia, que pautou pelo terceiro ano consecutivo a defesa do território da invasão das indústrias de energia
Nem a chuva, nem o sol quente, impediram cerca de cinco mil mulheres marcharem hoje nas ruas de Areial, na Paraíba. Impulsionadas pelo chamado para defender o território em que vivem da invasão das indústrias de energia renovável e bradar a importância do bioma Caatinga, elas coloriram e ecoaram suas vozes pelas ruas centrais do município.
Vindas de sítios, comunidades e assentamentos do território da Borborema Agroecológica e de outras regiões da Paraíba e do Nordeste, as mulheres agricultoras realizaram a 15ª Marcha pela Vida das Mulheres e pela Agroecologia. Foi o terceiro ano consecutivo que o tema foi Mulheres em defesa do território: Borborema agroecológica não é lugar de parques eólicos. A Borborema Agroecológica é a região de atuação do Polo da Borborema, formada por 13 municípios.
“Vamos se molhar nas águas da resistência para proteger nosso território. Vamos nos organizar para sacudir Areial e dizer às empresas: ‘Nenhum passo a mais no nosso território’. Queremos vida. Vamos nos cobrir desta água sagrada que a natureza nos manda”, conclamou Roselita Vitor, uma das coordenadoras da Marcha e do Polo da Borborema, animando as mulheres para iniciar a caminhada embaixo de um toró que estiou em seguida, garantindo a finalização do ato sob sol.
Um dos objetivos da Marcha foi, como disse Rose, sacudir Areial. Isso porque algumas comunidades rurais começam a ser atingidas pela instalação de uma usina eólica, trazendo preocupação não só para moradores da zona rural, como da urbana. Outro objetivo foi jogar luz no desmatamento provocado pelas indústrias de energia renovável. Em 2022, o MapBiomas detectou que esse empreendimento provocou a retirada da vegetação numa área equivalente a quatro mil campos de futebol (quatro mil hectares) no bioma exclusivamente brasileiro, a Caatinga.
Do assentamento Laje, veio Maria do Socorro Batista, 57 anos. “A gente sabe que a natureza vai sofrer, o bicho bruto (galo, ovelha, porco, galinha, pássaros…) e as crianças. A chuva já tá difícil pra natureza e se ela for destruída! A gente tem que defender ela. O lugar que eu moro parece uma floresta. Eu amo o campo e quem ama sabe o que a destruição da vegetação provoca. Na minha família, tem gente que diz que a nossa luta é em vão porque estamos lutando contra grandões. Mas, confio em Deus, que a nossa luta não é em vão.”
E não é vão mesmo, dona Maria do Socorro. Depois, da Marcha ter percorrido 1,7km nas ruas centrais de Areial, uma das falas feitas no palco foi de Islândia Bezerra, representante da Secretaria Geral da Presidência da República. “A Mesa de Diálogos [Energias Renováveis: Direitos e Impactos] só existe porque vocês pautaram o governo federal. Já abrimos uma agenda com vários ministérios para tratar de temas cruciais como as questões fundiárias, os impactos na saúde da população e a regulamentação para a instalação das indústrias”, garantiu.
Também de Areial, mas moradora da zona urbana, dona Lúcia Maria dos Santos Targino estava na Marcha. É a quarta vez que participa desde que voltou da Bahia, onde viveu 34 anos. A família do marido é da comunidade de Campo Formoso. Segundo ela, o cunhado foi procurado por representantes de empresas de energia, mas resolveu não aceitar nenhuma proposta por saber dos barulhos que produzem os aerogeradores e também por reduzir a produtividade da propriedade.
“Em Solânea [Marcha de 2022] escutei tudo bem direitinho. É muito importante esta marcha”, conta ela. Na época, dona Lúcia chegou a conversar com o cunhado. “E ele me escutou. São pessoas que não saem muito. Eu gosto de me comunicar e, quando vejo o que é certo, gosto de falar com outras pessoas”.
Comunicar para mais uma e mais uma e mais uma é outro objetivo da Marcha, um espaço de divulgação em massa da defesa dos direitos das mulheres camponesas e de denúncia das violações deles. “Mais um ano, a gente reafirma que a Marcha cumpre seu papel”, avalia a presidente do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Areial, Zeneide Granjeiro Balbino.
“O nosso território está sendo ameaçado. Estamos na Caatinga, onde as grandes empresas vêm invadindo e nós queremos defender a nossa agricultura. A gente não quer perder nossos direitos previdenciários porque sabemos que os agricultores, quando assinam o contrato, perdem a qualidade de segurados especiais da previdência. Sem falar no meio ambiente, porque onde esses parques são instalados, a natureza fica completamente destruída”, acrescenta a sindicalista.
Conheça a Carta política 15a. Marcha pela Vida das Mulheres e pela Agroecologia
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