Reafirmar sua identidade como jovens do campo, fortalecer e incentivar a experimentação e auto-organização dos jovens camponeses, esses foram alguns dos objetivos do “I Encontrão da Juventude Camponesa”, que aconteceu entre os dias 17 e 19 de junho, no Hotel Fazenda Day Camp, em Campina Grande-PB. Vindos de 14 municípios de atuação do Polo da Borborema, cerca de 170 jovens agricultores e agricultoras participaram de oficinas, painéis, momentos de lazer e formação durante o evento.
Uma mística deu início a programação do encontro, ao som da Canção da Terra, sementes, instrumentos de trabalho e mudas foram trazidos ao centro do grande salão e postos em volta de um mapa que mostrava o território do Polo da Borborema. Durante a apresentação, as comitivas traziam o mapa de seus municípios para compor o grande mapa do território, além de apresentarem suas expectativas sobre o Encontrão.
A primeira mesa da programação trouxe alguns dos resultados do Diagnóstico da Juventude Camponesa, organizado entre os temas da educação escolar, acesso aos recursos naturais e aspectos culturais que organizam a vida desses jovens. Desenvolvido desde agosto de 2015 e apresentado no último mês de maio, a iniciativa da AS-PTA e do Polo da Borborema com o apoio da entidade de cooperação internacional suíça “Terra dos Homens”, o diagnóstico trouxe novas perspectivas para o trabalho com a juventude camponesa na região da Borborema.
Os desafios de uma educação do campo descontextualizada, o preconceito sofrido por serem jovens do campo, o machismo e a homofobia, na plenária vários jovens se expressaram e reafirmaram os obstáculos identificados durante o diagnóstico. “Eu sei que o machismo tem raízes muito profundas na nossa sociedade e que as mulheres são desrespeitadas todos os dias, em músicas, propagandas”, disse Adailma Ezequiel Pereira, liderança jovem do Sítio Lutador em Queimadas-PB, que destacou a importância dos programas P1+2 e P1MC na valorização da vida das mulheres. Esse acesso a políticas públicas também foi destacado no diagnóstico, apontando que, apesar das dificuldades encontradas nesse campo, a inserção da juventude em programas sociais traz a tão sonhada independência e consequentemente o desejo de permanecer na agricultura.
Mas não foram só dificuldades que foram trazidas durante a mesa. A jovem Ana Joaquina, da comunidade Cachoeira de Pedra D’água, município de Massaranduba, é um exemplo disso: “Vamos pra rua sem ter medo de ninguém, mostrar que a gente é capaz de qualquer coisa, que a gente tem liberdade, que a gente é capaz de tudo, com força, fé e vontade”. Entendendo os problemas, traçar estratégias para contorna-los torna-se mais fácil. O espaço da plenária converteu-se num momento de reafirmação desses jovens como agricultores, reiterando as bandeiras de luta camponesa.
O direito à terra, à educação, ampliação de projetos sociais voltados ao campo, a quebra do sistema patriarcal e machista, a luta contra a homofobia, repetido durante todo o encontro o grito de guerra da juventude do campo ecoa dando esperança e força para esses que ousam lutar: juventude e agroecologia, a luta é todo dia!
No encerramento da mesa, Adriana Galvão, assessora técnica da AS-PTA, trouxe em sua fala um pouco dos resultados do diagnóstico e o atual contexto da juventude camponesa organizada na região do Polo: “Aprendemos bastante com vocês e é uma grande falácia a ideia de que ‘a juventude não quer nada, não sabe nada’, pelo contrário, se hoje estamos aqui dando o primeiro passo para a marcha, é porque vocês ousaram e vocês lutam todos os dias”, afirmou.
A programação do primeiro dia seguiu noite a dentro, com três oficinas culturais. Os jovens se dividiram entre as Oficinas de histórias digitais, Musicalidade e a Quadrilha Junina.
Oficinas Temáticas – O segundo dia de evento, foi dedicado às oficinas temáticas realizadas simultaneamente: Apicultura e meliponicultura, Manejo alimentar dos animais – fenação, Produção de calda e biofertilizante e Sistema simplificado de irrigação. Todos os cursos contaram com momentos teóricos e práticos e aconteceram durante a manhã e a tarde do sábado(18).
Todas as oficinas foram facilitadas pelos próprios jovens, com a colaboração de assessores técnicos da instituição, a exemplo da oficina Apicultura e meliponicultura que foi facilitada pelos jovens apicultores Adevan Firmino, Alexandre Ferreira e Fabrício dos Santos que também já comercializam seus produtos na Feira Agroecológica de Areial. Com o objetivo de apresentar aos jovens a criação de abelhas com e sem ferrão, foram trazidas caixas de duas espécies, a jandaíra e italiana africanizada. A oficina abordou os processos de produção e manejo, apresentação das ferramentas de trabalho, detalhes sobre coleta e armazenamento do mel, além de cuidados com a colmeia.
Moisés Valentim, jovem agricultor do Sítio Bodopitá, em Queimadas, diz ter contato com as abelhas desde os 8 anos de idade, por conta da produção que a família tem. “Todos nós devemos saber da importância que as abelhas têm, um bichinho tão pequeno que faz um trabalho tão grande”, disse o jovem.
Após as oficinas, os jovens fizeram uma devolução sobre as mesmas em plenária. Esse espaço também reavivou em vários deles o aspecto da experimentação. Entender e aplicar algo que os pais já fazem nas propriedades onde eles vivem, ou até mesmo levar algo novo para casa foi um ponto importante do encontro. Durante a noite, a cultural junina foi marcada por comidas típicas e apresentação da Quadrinha Junina da Juventude do Polo. Momento de confraternizar e partilhar as experiências de mais um dia não só de aprendizado, mas também de diversão.
O último dia de evento começou bem cedo, o torneio misto levou os jovens agricultores e agricultoras para o campo de futebol. Foi o aquecimento para uma “mini-marcha”, onde os jovens puderam ter uma prévia do que vai acontecer em Remígio no dia 28 de julho, na “I Marcha da Juventude Camponesa na Luta pela Agroecologia”, que reunirá mais de mil jovens nas ruas da cidade. Circulando nos espaços do Day Camp, durante o trajeto a juventude fez batucada, cantou, gritou palavras de ordem. A prévia da marcha já deixou o gostinho do que está por vir e fez sentir a força dessa juventude que não está para brincadeira.
Comunicação e o papel da mídia – encerrando a programação do Encontrão, os jovens participaram de mais um momento de formação com o jornalista Daniel Lamir, da ASA Brasil com o painel “Comunicação, o papel da mídia e conjuntura”. O painel teve como objetivo uma análise sobre o espaço da comunicação na atual conjuntura política do país e suas implicações para a democracia.
Tratando sobre temas como imparcialidade, monopólio da mídia e estratégias de comunicação, o espaço trouxe novamente a participação dos jovens camponeses. Discutindo o modo como os meios de comunicação podem influenciar não só no que é tido como verdade, mas também em como é um espaço de disputa de ideais, como a própria agroecologia, o painel pode elucidar algumas questões e fomentar o debate entre a juventude campesina.
Para Daniel, este é um momento de refletir sobre como a mídia está agindo, como ela vem manipulando algumas opiniões e ao mesmo tempo se pensar em estratégias que já estão ao nosso alcance e que podem ser ampliadas para se trazer mais vozes para esse debate. “Devemos quebrar essa lógica, para inserir as vozes também da mulher e do homem do campo, usando a comunicação como uma forma de embate a esse jogo político que está nos envolvendo”, disse.
Os jovens encerraram o evento com encaminhamentos para as próximas ações que antecederão a “I Marcha da Juventude Camponesa na luta pela Agroecologia”. Como a realização da Feira Agroecológica e Cultural da Juventude Camponesa do Polo da Borborema, que acontecerá no dia 30 de junho em Massaranduba e o II Encontrão da Juventude Camponesa que acontecerá também no Day Camp, entre os dias 15, 16 e 17 de julho. Os Encontrões da juventude e a Marcha fazem parte do encerramento do Projeto Sementes do Saber, desenvolvido pela AS-PTA e pelo Polo da Borborema em parceria com o Comitê Católico Contra a Fome a Favor do Desenvolvimento (CCFD) e cofinanciado pela União Europeia.