Nos dias 11 e 12 de dezembro, a Articulação do Semiárido Paraibano – ASA Paraíba, reuniu em Campina Grande cerca de 40 lideranças históricas em um encontro de celebração dos seus 25 anos, onde estiveram presentes representantes dos sete territórios de atuação. O ano comemorativo teve início em junho de 2018, quando a rede, que reúne mais de 300 organizações sociais de promoção da agricultura familiar agroecológica no estado, completou 25 anos. A partir daí, houve o lançamento do site www.asaparaiba.org junto e do selo comemorativo incorporado à logomarca da rede. As comemorações se encerrarão em junho de 2019 e tem como lema “Resistência e Democracia cultivando vidas no Semiárido”.
O encontro teve início na tarde do dia 11 com uma mística de abertura que lembrou figuras importantes que seguem presentes e que estiveram, mas não estão mais, na caminhada durante estes 25 anos, inclusive os mártires da luta pela terra. Foi assim, lembrado o assassinato recente e brutal de dois militantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra da Paraíba – MST-PB, ocorrido no dia 08 de dezembro, no acampamento Dom José Maria Pires, no município de Alhandra: “Trazemos aqui a memória dos dois companheiros, Orlando Bernardo e Rodrigo Celestino, que tombaram na luta pela terra, sabemos que muitos outros ainda tombarão, mas que seu exemplo de luta e de coragem vai continuar nos inspirando na nossa caminhada”, disse Rejane Alves, assessora pedagógica da ASA Paraíba. O momento foi encerrado com a música “Samba da Utopia” de Jonathan Silva.
Em seguida, Glória Araújo, da Coordenação Nacional da ASA Brasil e da Coordenação Executiva da ASA Paraíba, falou sobre os objetivos do encontro: “Estamos aqui para reconstruir a nossa trajetória e celebrar os 25 anos, mas não só isso, vamos também pensar o futuro, quais as nossas estratégias de resistência daqui para frente”, disse.
Luciano Silveira da AS-PTA Agricultura Familiar e Agroecologia facilitou um momento de construção de uma linha do tempo, onde o exercício para as pessoas presentes foi, à partir da divisão em três períodos: anos 1993 a 2002; anos 2003 a 2010 e anos 2011 a 2018, pensar quais foram os grandes marcos, na história da ASA: “Resgatar nossa história nesse momento é olhar para frente também, olhar para o que construímos tem o objetivo tirar referências, ver quais foram as inovações, as metodologias, os princípios e como fomos nos constituindo enquanto rede, o que ajuda a nos desafiar para o futuro”.
Foram lembrados como grandes marcos dessa história, entre outros, os seguintes: a ocupação da Sudene em 1993, ano de fundação da ASA-PB; A criação da ASA Brasil em 1999; O Programa Trabalho por Alimento; O Grupo Lua Cheia, que fez a ponte na região entre a Universidade e os movimentos; A seca de 1993 como um momento de crise e de grande mobilização; O Pronaf Capacitação que financiou 60 intercâmbios entre agricultores no estado, ainda no governo FHC; as políticas públicas de apoio à agricultura familiar como os programas de compra direta governamentais (PAA, PNAE), programas de acesso à água (P1MC, P1+2, Cisternas nas Escolas), Caminhos da Escola; Programa Sementes do Semiárido; a criação da AP1MC em 2003; a afirmação do lema “Sem Feminismo não há Agroecologia” a partir do III Encontro Nacional de Agroecologia; a influência da ASA Paraíba nas políticas públicas de segurança alimentar, inclusive tendo a primeira mulher a ocupar a presidência do Conselho Estadual de Segurança Alimentar e Nutricional da Paraíba – Consea-PB, representante da ASA Paraíba.
O segundo e último dia de encontro teve início com um trabalho feito em grupos de cochicho, de reafirmação dos princípios que movem a rede, alguns deles: a convivência com o Semiárido; o feminismo e o respeito a diversidade sexual e religiosa; a conservação das sementes crioulas e livres de transgênicos; a valorização das raças locais e adaptadas; a economia solidária e a comercialização em rede; a comunicação democrática; o protagonismo dos agricultores e agricultoras; a valorização da cultura popular e local; o fortalecimento da juventude camponesa e a construção coletiva do conhecimento.
No período da tarde, foi a vez de refletir coletivamente sobre os desafios da rede e tirar orientações estratégicas para os próximos anos. “Temos um exercício a fazer, que é esse trabalho de descobrir lideranças nas comunidades, através dos fundos rotativos solidários, por exemplo. Não podemos ter vergonha de defender os ideais socialistas, está aí o capitalismo matando gente, pessoas ficando adoecidas, precisamos manter vivas as nossas ideias e o nosso projeto de sociedade”, disse Raniere Ferreira, do Centro de Organização Popular – Ceop, município de Picuí-PB.
“É preciso lembrar que governo e poder são coisas distintas, tivemos um governo do nosso lado, mas nunca tivemos o poder, que permaneceu nas mãos dos mesmos de sempre. O momento é delicado, não sabemos se a figura do novo presidente vai resistir, mas o projeto de poder que o elegeu sim, está forte”, comentou Olivânio Dantas, liderança do município de Picuí-PB e atualmente exerce seu primeiro mandato como prefeito, pelo Partido dos Trabalhadores (PT-PB).
Como principais desafios, foram colocados o problema da volta da fome no país; a nova relação entre sociedade civil e estado, diante da ascensão da extrema direita; a construção da resistência necessária para enfrentar a ofensiva do agronegócio e a onda conservadora. Algumas estratégias levantadas foram: fortalecer a dinâmica de rede e as formas coletivas de gestão dos bens comuns, a exemplo dos bandos de sementes comunitários, os fundos rotativos solidários, os maquinários e equipamentos; propor a criação de uma Frente Parlamentar em Defesa do Semiárido e intensificar o diálogo com a cooperação internacional entre outras propostas.
Como encaminhamento de ações mais concretas, a plenária indicou a realização da 8ª edição da Festa Estadual das Sementes da Paixão em 2019; a continuidade da sistematização de experiências da juventude; a divulgação mais massiva dos resultados dos 25 anos de atuação da ASA Paraíba; a retomada a realização dos Encontro Paraibanos de Agroecologia; a articulação para estar presente no Congresso Brasileiro de Agroecologia no ano que vem, em Sergipe; além de investir na preparação do estado para o Encontro Nacional de Agricultoras e Agricultores Experimentadores que ocorrerá em fevereiro de 2019, onde a Paraíba apresentará experiências no campo das juventudes e das mulheres.
“Precisamos estar preparados para o fato de que o que é ruim, pode piorar. As vezes ficamos nos perguntando o que vamos fazer e a resposta é vamos fazer o que sempre fizemos: pequenas experiências, feitas por pequenas pessoas em muitos lugares que transformam o mundo”, comentou Ary Sezyhita, do Serviço Pastoral do Migrante do Nordeste – SPM-NE.
O encontro foi encerrado com um “bolo de aniversário” e os parabéns para a ASA, terminando com as suas palavras de ordem: “É no Semiárido que a vida pulsa! É no Semiárido que o povo resiste!”