Vivenciar a pandemia não está sendo fácil para ninguém, ainda mais para crianças e jovens que de repente se viram sem seus espaços de encontro, de troca, de construção dos afetos, sem seus espaços de organização e de luta. Seja na Paraíba ou seja em Pernambuco, os movimentos de jovens costumavam se encontrar nas visitas de intercâmbio ou durante os momentos de formação para trocar suas vivências na agricultura e afirmar sua identidade camponesa. Provocados pelas dificuldades postas pelo necessário isolamento social, as lideranças desses grupos se desafiaram a criar formas de se encontrar. E por que não, estender esse encontro também com os jovens da cidade? Assim nasceu o projeto Diálogos entre juventudes do campo e da cidade, Paraíba e Pernambuco.
Adailma Ezequiel, que compõe a coordenação da Comissão de Juventude do Polo da Borborema e explica, “nossa ideia foi a gente se manter em contato, conhecendo experiências de outros jovens agricultores mesmo no isolamento. Isso nos motivou a fazer esse encontro, mesmo que virtual, e conhecer outros territórios e jovens de outros estados, de outras realidades. E foi partir da reflexão do projeto que estávamos desenvolvendo na Borborema, “Fique bem, Fique em casa!”, que a gente viu que vídeos também poderiam ser nossa forma de contato, pois era uma maneira de a gente estar dialogando com a juventude de Pernambuco e também da gente divulgar as nossas experiências para a sociedade de uma forma geral”.
Como os jovens da cidade entendem a agroecologia? Como os jovens do campo lidam com a violência? Foi tentando responder essas perguntas que os coletivos de jovens do Polo da Borborema, da Comissão de Jovens Multiplicadores de Agroecologia – CJMA e do Grupo Comunidade Assumindo Suas Crianças – GCASC se reuniram virtualmente para pensar juntos como construir um ambiente para esse diálogo. De maio para cá, já foram realizadas dez reuniões virtuais para debate sobre os temas e a materialização na forma de vídeo, os resultados dessas conversas. “Acredito que o ponto mais forte foi o processo de construção e o diálogo entre o campo e a cidade. Há questões específicas do campo, outras específicas da cidade, mas há também questões comuns que unem esses jovens, na luta da construção de uma vida digna, que garanta sua permanência no seu espaço, mantendo suas identidades. Outra questão é que as juventudes perceberam que mesmo em tempos difíceis, elas podem continuar conectadas, lutando pelo acesso às políticas públicas”, avalia Edson Possidônio, assessor da AS-PTA que contribuiu com a animação desse espaço.
Com o objetivo de trocar, comunicar, visibilizar e fortalecer ainda mais as ações e redes de juventudes, a ideia foi estimular a criatividade, trazer leveza e poesia e produzir três vídeos abordando temas diferentes: Apresentação das juventudes do campo e da cidade; Agricultura Familiar e abastecimento; como prevenir a violência, no campo e na cidade. Por fim, será realizada uma live com todos participantes do projeto para avaliar o processo vivido.
Márcia Araújo, da coordenação de jovens do Polo da Borborema avalia como positivo os primeiros resultados desse trabalho. “O resultado ficou bem interessante, a gente buscou de uma forma leve, descontraída, levar um pouco da nossa história para que outros jovens pudessem assistir e se perceber nesse vídeo. Aprendi muito com essa interação, com a troca. Para mim foi muto gratificante poder construir um vídeo a partir do olhar do campo e da cidade. Tivemos desafios, problemas técnicos, mas foi muito bom construir formas de superar” avalia. Felícia Panta, jovem multiplicadora da agroecologia do CJMA, também avalia de forma positiva a iniciativa apontando a importância da troca no momento de pandemia: “O projeto Diálogos entre Juventudes só vem a acrescentar às lutas de todos os coletivos. Poder dialogar é de extrema importância, principalmente diante desse novo contexto que nos encontramos. A pandemia nos mostrou outros meios de luta e de visibilizar o nosso trabalho, e esse vídeo foi um fruto de novos aprendizados”.
O primeiro vídeo foi lançado numa ação conjunta dos três coletivos de jovens. O grupo construiu também quando, em quais plataformas e como fariam para garantir visibilidade ao trabalho realizado. Para Ricardison dos Santos, o Rick, jovem multiplicador do projeto Mães da Saudade do GCASC e editor do vídeo, essa experiência também foi cheia de desafios. Conta que apesar da pouca idade, já tem bastante experiência acumulada na edição de vídeos. “Eu venho gravando e editando vídeos desde os meus 13 anos. Dentro do movimento social, pude me aperfeiçoar, mas uma coisa é a gente trabalhar dentro do nosso coletivo, e quando a gente trata com outros movimentos, com outros valores e missões, com outras temáticas, a gente tem que ser bem sensível. Mas todos contribuíram de uma forma muito massa, o que foi enviado, mesmo com algumas dificuldades técnicas, rolou, está bonito e a gente fica muito feliz por isso”, conta animado sobre o trabalho realizado.
Os desafios apontados por Rick, Felícia, Márcia e Adailma nos revelam por um lado a importância da internet e das plataformas digitais para garantir a conexão desses jovens em movimento. Por outro lado, revela que uma grande parcela de jovens do campo e das cidades, que se seguem excluídos do espaço virtual. Novas bandeiras com certeza estão sendo levantadas, abrindo o necessário debate sobre a democratização da comunicação e da inclusão digital como direito de todos.
Esta obra é fruto de uma construção coletiva e reserva uma homenagem à memória de Alexandre Meneses, grande colaborador e um entusiasta do fortalecimento da ação com as juventudes.