Sexta-feira, 4 de março de 2022, 18h. No centro de Campina Grande, o Teatro Municipal Severino Cabral está cheio. Mulheres, homens e as juventudes do campo se juntam aos da cidade para assistir ao documentário “Mulheres de Curimataú”. Costurando as emoções, o lançamento contou com a voz potente de Sandra Belê. A exibição gratuita no teatro público foi em celebração ao Dia Internacional da Mulher.
No território da Borborema, do qual Campina Grande é a cidade polo, em todo dia 8 de março, milhares de agricultoras ocupam as ruas do centro de um dos municípios para realizar a Marcha pela Vida das Mulheres e pela Agroecologia. Esse ano, por conta da pandemia, o ato foi adiado para 01 de maio e a programação foi outra.
Desta vez, campo e cidade se encantaram com o milagre das vidas ordinárias que não estão nas capas de revista, nem mobilizam milhares de seguidores nas redes sociais. Quem esteve no teatro viu com seus próprios olhos e ouviu com seus próprios ouvidos relatos de quatro mulheres que fazem parte de uma força social capaz de romper com o ciclo de pobreza que acorrenta gerações e gerações de famílias rurais e, principalmente, as mulheres.
Após a exibição, uma fala ao vivo de uma das protagonistas do documentário, Maria Helena Barbosa: “Como vocês puderam ver a nossa história, essa mulher que hoje vocês estão vendo aqui ela nunca foi desse jeito não. Era uma mulher de cabeça baixa ela, era uma mulher triste, ela não tinha nem infância, nem boa de educação, mas ela aprendeu e colocou na cabeça dela que quando ela crescesse, ela não ia mais ser aquela mesma pessoa. E ela teve o direito de lutar e batalhar pelo que ela é hoje. E o que eu sou hoje? Eu sou Maria Helena, mas eu sou dona da minha vida, sou mãe, sou esposa e sou mulher. Pois essa Maria Helena, ela não se acomodou porque ela teve uma vida difícil, não teve educação, só terminou a quarta série, mas ela viu lá atrás, através do pai dela, que a dificuldade dele era grande. Então eu não queria a vida dos meus pais para mim, porque o sofrimento dele era tão grande que fazia dó. Trabalhava em campo, trabalhava em motor [de agave], era escravizado, era humilhado não tinha o seu chão para plantar. A minha mãe aos 40 anos ainda não tinha terra para morar e eu aos 38 já tenho a minha primeira terra e moro lá. Então quando a gente vê essa grandeza através desta equipe tão grande que é a AS-PTA, o Sindicato, a na nossa Associação, o Polo da Borborema, a Ciranda da Borborema, todo esse conjunto de pessoas que vai lá na nossa casa, na nossa terra visitar e conhecer a nossa vida, a nossa história, eu só sou eu agora através de vocês. Então eu não me sinto protagonista, protagonistas são eles que levaram pra nós essa oportunidade. Muito obrigada”.
Sem dúvida, foi uma noite foi inesquecível para quem esteve presente. Muitas mulheres saíram de lá emocionadas, encantadas por se verem nos relatos de Maria Helena, Verônica, Marília e Nalva, que estreavam na tela grande.
“Tomara que este documentário ganhe o mundo. É interessante ver as histórias daquelas mulheres. Elas nos representam. Achei lindo”, dispara Anilda Batista, uma das coordenadoras da Marcha pela Vida das Mulheres e pela Agroecologia, que esse ano ganha as ruas de Solânea no dia do/a trabalhador/a.
“É um momento fantástico. A gente ver as histórias de mulheres agricultoras, de mulheres de Curimataú. A gente se emociona e se identifica bastante com a realidade de cada uma delas. Realidade que a gente, como agricultoras, enfrenta como a questão da seca, a questão das mudanças climáticas, a questão da mulher ter vez e voz na sociedade, que consegue conquistar suas coisas com esforço. Elas passam pra gente muita força pra lutar”, sustenta Daiane Nascimento, uma jovem camponesa do município de Esperança.
Curimataú é uma das regiões mais secas da Paraíba. No ano passado, nesta localidade, no município de Solânea, a 70 km de Campina Grande, teve o menor índice pluviométrico dos últimos 100 anos. Esse dado dá uma ideia da condição de quem vive do que cultiva na região. E para enfrentar as mudanças climáticas, que atingem com mais veemência o trabalho e a vida das mulheres, é preciso ampliar a autoestima das mulheres e enfrentar o machismo.
“Esse documentário é muito importante porque valoriza a vida das mulheres”, opina Penha Batista, agricultora da região do Brejo de Solânea. “No cotidiano, elas vão aprendendo a se fortalecer junto com o sindicato, com os movimentos [de mulheres]. E o conhecimento que elas trazem pra si tem transformado a vida delas, tem permitido que permaneçam no seu lugar, educando seus filhos, valorizando a agricultura e trazendo pra si o zelar pela vida”, acrescenta Marizelda Salviano, do sindicato de Esperança.
“Foi um documentário que eternizou a vida de tantas mulheres que conseguem ressignificar suas vidas, se fortalecer nos territórios, fortalecer outras mulheres e fortalecer a luta pela igualdade de direitos entre homens e mulheres”, destaca Cristina Lima, de Remígio.
Na plateia, estava também uma representante do povo na Assembleia Legislativa da Paraíba, Estela Bezerra, que também fez uma fala no momento de escutar quem foi assistir ao doc. “Fiquei muito comovida. Parabéns pela narrativa, por reunir estas histórias”, pontuou, destacando aspectos presentes nas falas das mulheres do documentário: “Tem o esperançar, porque os tempos estão tão duros, tão difíceis, que a gente se sustenta na ideia de ter uma esperança, na [atitude] de esperançar e construir resistência. E também está presente na narrativa das mulheres a abertura para quebrar a ignorância, para aceitar um conhecimento que ainda não têm, para a transformação e para modificar uma cultura patriarcal.”