Depois das políticas públicas de convivência com o Semiárido e de fortalecimento da agricultura familiar agroecológica, que transformaram da água para o vinho a vida das famílias e comunidades rurais, as redes da sociedade civil têm uma proposta de desenvolvimento bem clara e consistente
As eleições estão chegando e as organizações sociais do Semiárido paraibano convocaram os candidatos e a candidata para defender as pautas que fortalecem a convivência com o Semiárido e a agricultura familiar agroecológica, especialmente, na região semiárida.
Amanhã (9), acontece o evento promovido pela ASA PB e, na terça-feira que vem (13), o Polo da Borborema dialoga com quem está no pleito pela vagas no Legislativo estadual e federal sobre as pautas específicas para o território, com ênfase nas ações e políticas de enfrentamento à violência contra a mulher e de defesa do território dos megas projetos de produção centralizada de energia renovável.
O evento de amanhã – “Eleições 2022 – a Paraíba em defesa de um Semiário vivo” – acontecerá às 9h, na sede da Associação Atlética do Banco do Brasil, em Campina Grande. Foram convidados para esse momento João Azevêdo (PSB), Veneziano Vital do Rego (MDB) e Adjany Simplício (PSOL).
Segundo Maria do Socorro Oliveira, da coordenação da ONG Centrac e da ASA-PB, essa articulação vem, há cerca de um ano, pautando nos seus territórios e grupos de trabalho o tema das eleições.
“Temos discutido a realidade das famílias agricultoras e os desafios vividos com a total falta de políticas públicas de convivência com o Semiárido, já conquistadas em governos populares, e desmontadas pelo atual governo federal com seu descaso com a vida do nosso povo. Entendemos que a luta política é crucial neste momento porque está em jogo o futuro e democracia de nosso país. Por essa razão, estamos buscando espaços de diálogo com candidaturas ao parlamento e ao governo estadual, que se alinham as nossas lutas, para que possam se comprometer com políticas públicas em defesa de um Semiárido vivo para nosso Estado”, sustenta Corrinha.
Cerca de 600 lideranças dos sete territórios de atuação da ASA PB acompanharão o debate presencialmente e à distância pela internet. Os territórios são Alto e Médio Sertão, Curimataú e Seridó, Cariris, Agreste e Borborema.
Essas lideranças fazem parte das dinâmicas dos coletivos de agricultores e agricultoras familiares, como associações de comunidades rurais, grupos de gestão dos bancos comunitários de sementes, grupos de fundos rotativos solidários.
Ao participar do diálogo ouvindo o que cada candidatura vai apresentar de proposta para a agricultura familiar agroecológica num território cada vez mais afetado pelas mudanças climáticas e por projeto com grande impacto social e ambiental como os parques eólicos e as usinas solares, as lideranças comunitárias que acompanharão o diálogo com os/a candidatos/a voltam para seus espaços com a missão de discutir com a comunidade quais os nomes que melhor representam quem vive no campo e da agricultura. O voto consciente é essencial nesse momento político pela qual passa o país.
“Estamos na reflexão coletiva das eleições e o que significa esse momento para que a gente traga o debate sobre as políticas públicas. O nosso território é marcado pela construção de políticas públicas, de experiências práticas de convivência com o Semiárido, de agroecologia e de organização”, reflete Roselita Vitor, agricultora assentada da reforma agrária em Remígio, no território da Borborema, e da coordenação política do Polo da Borborema, um coletivo com 13 sindicatos rurais e cerca de 150 associações comunitárias.
Reginaldo Bezerra, agricultor experimentador, relembra como era a peleja pela água nos tempos antes do Programa Um Milhão de Cisterna, concebido pela ASA Brasil e tornado realidade a partir de sua transformação em programa público com recursos garantidos no orçamento da União, o Programa Cisternas.
“Era uma dificuldade imensa por água. Água de cacimba que era suja, muitas vezes, o guaxinim matava um sapo dentro e a gente tinha que tirar o sapo e beber daquela água que não tinha outra. E passava o dia ao redor daquela cacimba tirando lama e, quando era a tardinha a gente não tinha água nem para lavar os pés. Então, era preciso pegar aquele caldo de água suja, preta, de lama, levar para casa e quando aquela água assentava, no outro dia, era utilizado para a mulher lavar roupa, a gente beber, tudo, no geral”, conta ele que está na presidência do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Caraúbas e integra o Coletivo ASA do Cariri Oriental (Casaco).
E continua: “Aqui na minha comunidade, a gente tinha uma cacimba só pra atender seis famílias, além dos animais de todas as seis famílias. Era uma água muito pouca e a gente tinha que ter uma divisão muito grande para que a água desse, em parte, para nós e para os animais.”
E o que aconteceu após a política de acesso à água nas comunidades rurais ser assumida pelo governo federal, Reginaldo? “Após a chegada das cisternas nessa nossa região, então melhorou muito. Porque a gente tinha onde captar água, tinha uma água de boa qualidade, e no oitão da casa. Foi através da primeira cisterna (…) depois que foi melhorando com a cisterna-calçadão ou enxurrada que tinha mais um volume de água para produção de sua horta pra abastecimento de alimento pra casa e garantir um alimento de boa qualidade durante o ano todo. Isso foi muito importante. Outra coisa que também foi muito importante foi o aumento de acesso a crédito das pessoas aos bancos.”
E o que isso tudo diz pra você, Reginaldo, como cidadão? “A ASA despertou que nós temos que ir para as políticas de partido para que as políticas públicas continuem, melhorem, aumentem outras políticas públicas para que a gente tenha acesso a uma melhoria de qualidade de vida e ver quais os candidatos comprometidos com isso aí. Eu acho que é um debate importantíssimo. Eu como agricultor nunca tinha visto a ASA fazer esse trabalho ao lado da política, conversar com os candidatos a governadores. E acho que a gente tem que se envolver até mais para que tenhamos pessoas lá dentro que tenham ideia de como são as políticas públicas para o Semiárido pra nós sair dessa ideia de que o Semiárido é feio, que o Semiárido não produz. O Semiárido é bonito, produz, existe e pode ter uma boa qualidade de vida como em qualquer região no país.”
Cartas Compromisso – No evento de amanhã, os/a candidatos/a que se comprometerem com os pleitos defendidos pela ASA-PB vão assinar três cartas compromisso. Uma da ASA Brasil, cujo conteúdo contempla de forma geral, as demandas dos diversos territórios no Semiárido brasileiro. Outra específica da ASA-PB, que será construída hoje pelos representantes dos territórios de atuação dessa articulação. E a terceira carta é da Articulação Nacional de Agroecologia, a ANA.
A Carta da ASA é mais voltada para questões práticas como a retomada imediata dos programas de acesso à água, sementes crioulas e às compras públicas de alimentos produzidos pelas famílias agricultoras, e constituição de novas estratégias e políticas de convivência com o Semiárido.
E a Carta da ANA defende a convergência de políticas em diversas áreas: acesso ao território seja no ambiente urbano ou rural; enfrentamento da fome com a promoção da soberania e segurança nutricional e alimentar; a construção de uma ciência crítica, de uma educação de qualidade e do acesso à comunicação e à cultura; o direito à participação democrática e ao controle social dos poderes públicos; e, por fim, a promoção da igualdade de gênero e racial.
A iniciativa – O diálogo proposto pela ASA na Paraíba é uma iniciativa que está acontecendo em vários territórios do Semiárido. Articulações como a ASA, a ANA e a Rede Ater Nordeste de Agroecologia estão estimulando esses processos de incidência política para que as pautas que dizem respeito à produção e acesso aos alimentos de verdade e livres de venenos estejam na prioridades dos programas e políticas públicas em todas as esferas governamentais – país, estados e municípios – além de estar na agenda do Legislativo nos três níveis.