Foram centenas de pratos e sacolas cheios de alimentos cultivados pelas famílias agricultoras no Banquetaço
Ontem (27) foi dia festivo na praça da Bandeira, no centro de Campina Grande. A festa, que aconteceu em várias cidades de norte a sul do Brasil, celebrou a volta da atuação do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea).
Esse conselho, formado por representantes do governo federal, organizações da sociedade civil e institutos de pesquisa e ensino, funciona como uma instância consultiva ao presidente sobre as estratégias para enfrentar a fome que, infelizmente, afeta 33 milhões de brasileiros e brasileiras. Há quatro anos, o Consea foi fechado num dos primeiros atos do governo de Bolsonaro.
Na festa da praça da Bandeira, estavam enfileiradas 13 mesas dessas de plástico, comuns em bar. Do início ao fim da fileira, panelas e recepientes continham alimentos frescos, saudáveis, de verdade. De feijão verde temperadinho sem caldo, a macaxeira com molho ou sem, passando por arroz, queijo coalho e variados tipos de bolo.
Tudo doado pelas famílias agricultoras mobilizadas pela Articulação Semiárido paraibano e pelas entidades organizadoras do evento. E quem chamou todo mundo para organizar o banquetaço foi, além da ASA PN, o CONSEA PB, o Fórum Paraibano de Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (FPBSSAN) e a Universidade Estadual da Paraíba.
“Essa festa é um ato político importante. Foram oferecidos alimentos saudáveis advindos da agricultura familiar como um modo novo de destacar que o direito à alimentação precisa ser assegurado pelo Estado a toda a população do país”, ressalta Maria do Socorro Oliveira, da ONG Centrac e membra do Consea PB.
Ao lado das mesas repletas de comida de verdade, enfileiravam-se também centenas de pessoas a espera das delícias. Segundo a organização do banquetaço, foram doados cerca de mil pratos e sacolas com alimentos, entre eles frutas frescas e da estação.
Tudo foi distribuído em uma hora, com música boa de fundo a cargo da cantora Savanna Aires, do guitarrista Breno Felipe e da percusionista Maria Clara. Teve gente na fila que estava até dançando.
Antes da entrega começar, algumas mulheres, curiosas para saber que movimento era aquele em plena praça pública, chegaram junto e perguntaram:
– Você sabe dizer o que está acontecendo?
– Sim… estamos alegres, celebrando o retorno de um conselho muito importante para que o país enfrente a fome, para que a gente possa tirar milhares de pessoas dessa condição, respondi algumas vezes.
Uma delas das senhoras que conversei foi dona Hosana, Maria Hosana Alexandre da Silva, 59 anos. Ela nasceu na zona rural de Remígio e morou vários anos no campo em Areia, dois municípios que fazem parte do território da Borborema Agreocológica. Seu pai era vaqueiro de uma fazenda grande que, com a reforma agrária, foi repartida para cerca de 100 famílias morarem.
Entre as famílias assentadas está a de Rose, Roselita Vitor, que faz parte da diretoria do Sindicato dos Agricultores e Agricultoras de Remígio, da coordenação política do Polo da Borborema e do Consea Paraíba.
Foi bonito ver o encontro de Hosana e Rose. As duas conversaram um pouco. As vidas ligadas a um mesmo espaço que foi transformado pela força popular e se tornou um lugar de produção diversa de alimentos saudáveis, cultivados sem as toxinas dos agrotóxicos que envenenam dia a dia os/as brasileiros/as.
Depois, quando os alimentos começaram a ser servidos, dona Hosana se sentou perto da parada dos moto-táxis para comer. “Tá uma delícia”, afirmou ela sem que eu perguntasse. “É triste comer com agrotóxico. Por isso que tá todo mundo por aí fazendo tratamento para o câncer”, complementou com muita lucidez.
Hosana hoje vive no bairro de Pedregal, em Campina Grande. Mesmo lugar onde mora dona Maria José de Lima Brandão. “Pode me chamar de Zezé”, me aconselhou com sorriso nos olhos. Dona Zezé é pensionista, tava de passagem no centro de Campina e foi uma das que ficaram curiosas com o movimento na praça.
Apesar da idade já avançada e do histórico de três AVCs (acidente cardiovascular), ela quis um lugarzinho na fila para ter acesso à comida. Com a cabeça branquinha, ficou logo no início. Conseguiu um prato farto, suco, um saco de papel com várias fatias de bolo e uma sacola com frutas. Lá mesmo, só tomou o suco. Guardou o restante para comer em casa. “Esse suco já me deixou cheia, minha filha”, disse.
É dona Zezé, é para deixar as pessoas cheias e nutridas que o Consea foi reinstituído por decreto pelo governo Lula, hoje (28). Esse conselho vem cuidar e zelar de políticas e programas públicos que garantam direitos fundamentais às populações mais vulneráveis, como o direito à água potável, porque água também é alimento, e o direito das crianças terem refeições saudáveis nas escolas públicas. Porque, muitas vezes, essa é a única refeição que fazem ao dia. Além de tantos outros direitos ainda não garantidos para todos e todas os/as brasileiros/as.