A rotina de Maria do Céu da Silva, agricultora familiar e liderança sindical, mudou na semana passada. Do território da Borborema Agroecológica, no Semiárido da Paraíba, ela embarcou para Brasília, sede do governo federal. Foi participar de um importante momento de incidência política, protagonizado por mulheres agricultoras, junto a nove ministérios e a Secretaria Geral da República.
Como representante do Movimento de Mulheres do Polo da Borborema na Comissão Ampliada da Marcha das Margaridas, Céu foi a Brasília com uma missão: relatar a resistência que as mulheres agricultoras e juventude rural vêm protagonizando no território à chegada das indústrias de energia renovável. Tais empreendimentos aportam nos territórios rurais ou litorâneos desorganizando o tecido social local e provocando inúmeras violações de direitos às famílias que vivem na região.
O relato de Céu foi feito em dois momentos. O primeiro dentro da Jornada das Margaridas 2024, que contou com painéis que estimularam reflexões e análises sobre as ações e medidas anunciadas pelo Presidente Lula durante o encerramento da Marcha das Margaridas, realizada em agosto de 2023. Esse momento foi importante também para organizar e pactuar as reivindicações das mulheres dos campos, da Floresta e das águas e atualização dos desafios para seguir vivendo e produzindo alimentos sem venenos e cuidando da natureza.
Um dos temas abordados e que também compõe a pauta de reivindicações da Marcha das Margaridas junto ao Governo Federal é a transição energética popular, justa e inclusiva. O painel que Céu fez a exposição teve como título: Transição energética, agroecologia e participação social: o que propõem as mulheres e o que anunciam as políticas públicas?
O segundo relato de Céu sobre a violência sofrida pelas mulheres e famílias com a invasão dos territórios pelas indústrias de energia renovável aconteceu nas Audiências Interministeriais. Estes momentos reuniram representantes da Marcha das Margaridas com representantes da Secretaria-Geral da Presidência da República e dos Ministérios das Mulheres; Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar; Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome; Meio Ambiente e Mudança do Clima; Minas e Energia; Saúde; Direitos Humanos e da Cidadania; Justiça e Segurança Pública; e Cidades.
“Mais uma vez, a gente reafirmou qual modelo de produção de energia que a gente quer e precisa, que é o descentralizado. Porque ele tem a ver com o projeto de agroecologia que a gente faz nos territórios, baseado na defesa da Caatinga, do meio ambiente, dos nossos animais, da nossa permanência no campo e da nossa resistência feminina e agroecológica”, relatou a sindicalista paraibana.
“As audiências foram extremamente importantes para tratar sobre a pauta permanente da Marcha das Margaridas. Esse é o momento de diálogo e de buscar respostas concretas para serem anunciadas na 3ª Mostra das Margaridas, na sexta-feira (16). Nós estamos reafirmando para o Governo Federal a importância de concretizarem os anúncios feitos e também de atender aquilo que ainda não foi respondido”, avalia Mazé Morais, secretária de Mulheres Trabalhadoras Rurais da CONTAG (Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura).
E o diálogo segue por outros caminhos – Na sexta-feira (16), aconteceu mais um momento de diálogo entre governo e sociedade civil em torno do tema da transição energética. Representantes do Polo da Borborema e da AS-PTA se somaram às demais organizações que compõem o NE Potência na reunião virtual com o Ministério das Minas e Energia para apresentação do Relatório GT de Eólica.
O documento é fruto das escutas realizadas pelo MME no âmbito da Mesa de Diálogos “Energia Renovável: direitos e impactos” instituída pela Portaria SG/PR 165, em setembro de 2023. Essa foi uma primeira sistematização dos resultados encontrados e espera-se que o relatório seja capaz de elaborar ações para melhor regulação do setor.
O Polo da Borborema é um coletivo de 13 sindicatos e cerca de 150 associações rurais do território da Borborema e é assessorado pela AS-PTA, uma das organizações que fazem parte da Rede ATER NE de Agroecologia.
A Rede ATER NE tem desenvolvido um projeto com foco na qualificação da incidência política feita pela sociedade civil para aprimorar as políticas públicas. Trata-se do projeto Cultivando Futuros, resultado de uma parceria entre Rede ATER NE, AS-PTA, Pão para o Mundo (Brot fur de Welt no nome em alemão), com financiamento do Ministério Federal da Alimentação e da Agricultura da Alemanha (BMEL, na sigla em alemão).