Foto: Túlio Martins/AS-PTA
As políticas públicas de agricultura familiar com foco nas mulheres vêm dando passos significativos em 2025, frutos da luta e do potencial de incidência política da Marcha das Margaridas nos últimos dez anos. Em junho de 2025, o Governo Federal incluiu no Plano Safra a linha de crédito “quintais produtivos”, que traz condições especiais de microcrédito para mulheres rurais, uma das principais reivindicações da Marcha. Oferece financiamento com juros baixos (0,5% ao ano), um limite de R$20 mil e bônus de 40% para pagamentos em dia.
A medida acompanha outras iniciativas anteriores do governo como a criação do Programa Quintais Produtivos das Mulheres Rurais e o projeto Quintais das Margaridas, alocado no programa. A execução do primeiro edital do projeto está em fase de encerramento em diversos territórios do Semiárido brasileiro e já traz apontamentos valiosos sobre como o Estado deve conduzir as políticas de fortalecimento das mulheres do campo.
Uma avaliação evidente é que não dá para reduzir essas políticas a apenas uma ação. Acesso a crédito e direito à Assistência Técnica e Extensão Rural (ATER) de qualidade precisam andar juntos para impulsionar a auto-organização, autonomia econômica e inclusão produtiva das mulheres.
Foto: Túlio Martins/AS-PTA
Ou seja, o uso da nova linha de crédito do Pronaf (Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar) pode e deve ser potencializado com metodologias de ATER Feminista a exemplo do Quintais das Margaridas. Para isso, os quintais precisam virar uma política pública efetiva, deixar de ser projeto. Com recursos e metas amplas estabelecidas no orçamento do governo e a partir das reais demandas da agricultura familiar.
“Se consolidados como política pública, os Quintais das Margaridas garantem autonomia e protagonismo às mulheres beneficiadas. Segurança alimentar e nutricional não só para as famílias, mas para as suas comunidades, justamente pelas relações de reciprocidade que se formam. Além de ampliar a comercialização da produção e o acesso a múltiplos mercados, gerando renda e emancipação financeira para essas mulheres”, analisa Renata Paula Oliveira, do núcleo de Saúde e Alimentação da AS-PTA e do projeto Quintais das Margaridas no território da Borborema, na Paraíba.
Os acenos do Governo Federal para os resultados do projeto são positivos, mas ainda há muito o que avançar, inclusive decidir como os quintais serão colocados na pauta da política pública a partir de então. Na Marcha de 2023, as Margaridas propuseram que o projeto beneficiasse um milhão de quintais em todo o Brasil, mas hoje o governo tem trabalhado com a meta de 92 mil unidades beneficiárias até 2026, número bem distante da reivindicação popular.
Contudo, no fim de julho deste ano, durante o encerramento do Quintais das Margaridas da Borborema, em Solânea (PB), a subsecretária de Mulheres do Ministério de Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar (MDA), Patrícia Mourão, teceu elogios sobre os resultados do primeiro edital.
Subsecretária de Mulheres MDA, Patrícia Mourão, e a agricultora Maria Helena segurando a placa da sua cozinha produtiva no encerramento do projeto Quintais das Margaridas, em Solânea (PB). Foto: Túlio Martins/AS-PTA
“Um milhão de quintais a gente não conseguiria em quatro anos, mas a gente criou o programa e apresentou uma meta audaciosa para as condições que a gente tinha. Eu acho que aqui tem uma conquista muito grande das margaridas, que é a gente colocar no centro da política pública e do governo esse espaço que por muito tempo foi renegado, não tinha crédito e nem assistência técnica para quintais. Não é só um programa de incentivo à produção, mas sim um programa que valoriza o trabalho e o conhecimento das mulheres”, afirmou.
Os 80 quintais beneficiados no território da Borborema, executados pela AS-PTA junto ao Polo da Borborema, com coordenação da Articulação Semiárido Brasileiro (ASA), estão entre as 160 unidades beneficiárias no estado da Paraíba, neste primeiro edital do projeto. Um dos principais atores de mobilização dos Quintais no território foram os sindicatos rurais.
“Nós estamos de portas abertas recebendo essas mulheres. A gente vai continuar fazendo essa luta para que nos próximos governos, principalmente nos governos democráticos que queremos eleger, projetos como este sejam ampliados para várias outras mulheres”, pontua Maria do Céu Silva, da coordenação do Polo da Borborema.
A necessidade e urgência dos Quintais das Margaridas se tornarem política pública ecoam principalmente na fala de mulheres beneficiárias. No curta audiovisual “História de Quintais”, você pode conferir o depoimento de três agricultoras da Borborema (PB) sobre as transformações construídas coletivamente em suas vidas e seus quintais. Para além da melhoria em suas propriedades, as 80 mulheres partilharam da experiência de auto-organização da 16ª Marcha pela Vida das Mulheres e pela Agroecologia.
Assista ao curta:
No Nordeste, foram 1.120 quintais ao todo. Os quintais produtivos são espaços ao redor das casas, em geral criados e manejados pelas mulheres para a produção de alimentos, criação de pequenos animais e conservação da biodiversidade. O Programa Quintais Produtivos das Mulheres Rurais tem o objetivo de promover a autonomia econômica das mulheres do campo, da floresta e das águas e ampliar o acesso às políticas públicas de apoio à produção e comercialização de alimentos e a tecnologias sociais de acesso à água potável, como as cisternas.