O presidente Lula, quando candidato, definiu-se na questão dos transgênicos dizendo: “Liberar é burrice.” Nestes próximos dias, porém, poderá assinar uma medida provisória com o conteúdo do substitutivo do senador Ney Suassuna ao projeto de lei de Biossegurança, aprovado na Câmara mesmo contra a posição da bancada ruralista e o forte lobby da Monsanto. O projeto alterou proposta assinada pelo próprio Lula, amplamente debatida dentro do governo.
Que se passa no governo para que o presidente faça aquilo que antes chamou de burrice? O governo mudou de posição no intervalo da tramitação do projeto entre a Câmara e o Senado?
A justificativa do governo para liberar a comercialização da safra de soja 2002/2003, em flagrante violação das posições anteriores do PT, do próprio Lula e da legislação vigente era a famosa “herança maldita” do governo anterior, inflada com avaliações incorretas sobre a amplitude do problema. Em 2003/2004, a liberação considerou o dado falso sobre a falta de sementes. Ora, ou o presidente e seus assessores foram manipulados ou estavam tentando enganar o público. Os dados sobre a disponibilidade de sementes estavam acessíveis na internet para verificação de qualquer um.
O trágico na mudança de posição do governo é que ela não se deu por uma confrontação entre os argumentos complexos envolvendo aspectos científicos, ambientais, de saúde, e outros. A conversão se deu por razões mais comezinhas, vinculadas a uma opção cega pelo agronegócio, representado no governo pelo ministro da Agricultura, a favor dos transgênicos por razões imediatistas e falseadas por circunstâncias peculiares que não têm a ver com vantagens reais nem a médio prazo.
Consumidores e agricultores europeus se posicionam maciçamente contra esses produtos. Ignora-se o fato de que cientistas do Food and Drug Administration, do governo americano, levantam vários problemas sobre a segurança desses produtos e que a decisão de liberação dos transgênicos nos EUA foi em franca oposição a essas razões. Lula afirma que mudou sua posição por “razões científicas”, mas só escutou as “razões científicas” defensoras dos transgênicos.
As implicações de uma liberação indiscriminada dos transgênicos terão efeitos de longo prazo e o governo dá mostras de uma total irresponsabilidade na forma em que vem tratando o assunto. JEAN MARC VON DER WEID é coordenador do Programa de Políticas Públicas da Assessoria e Serviços a Projetos em Agricultura Alternativa e membro do Conselho Nacional de Desenvolvimento Rural Sustentável.
|