A partir dessa análise, buscou-se identificar os pontos de estrangulamento e definir estratégias comuns de fortalecimento do acesso aos mercados. A ideia também é constituir um espaço permanente de discussão e articulação das organizações que atuam no território.
Segundo Luciano Silveira, da AS-PTA, uma das estratégias a ser priorizada é o fortalecimento das feiras livres, circuitos mercantis já presentes há muito tempo na região, mas que hoje enfrentam alguns problemas. As feiras livres aproximam o produtor do consumidor, que tem a oportunidade de absorver a diversidade de produtos e, portanto, a diversidade da cultura alimentar. Então, não se trata só de criar novos canais, mas também valorizar os mercados tradicionais que são relevantes e estratégicos, como as feiras livres. Mas como fortalecer esse espaço?
A concorrência dos mercados atacadistas e a forte influência do agronegócio na região foram levantadas como obstáculos a serem superados para que os agricultores tenham mais condições de escoar sua produção.
Os atacadistas têm estratégias para atrair os consumidores. Criaram um aspecto parecido com o das feiras livres, na parte de hortaliças. Isso chama consumidores. Tem que ocorrer o mesmo com relação às feiras, que têm que ser atrativas, destacou Marenildo Batista, da Arribaçã.
Para Nelson Ferreira, do Polo da Borborema, é preciso também dar mais visibilidade às feiras: O hábito de ir à feira é diferente daquele de ir ao mercado. As feiras são uma forma rotativa e solidária de distribuir a produção familiar. São espaços onde os agricultores têm a chance de negociar. Ter uma comunicação mais expressa com a população talvez seja um caminho. Na questão da saúde e da alimentação, o trabalho que as mulheres fazem também deve ser divulgado para a sociedade.
A importância da higiene nas feiras e do transporte para os agricultores foram outros aspectos debatidos. Diógenes Fernandes, da EcoBorborema, apresentou uma cronologia das feiras nos municípios, com número de famílias agricultoras participantes e os dias de feira em cada município. A partir desses dados, percebeu-se que o número de agricultores não evoluiu muito.
No início das feiras, os agricultores recebiam apoio para transporte. Quando foi cortado esse apoio, muitos agricultores desistiram, concluiu.
Como proposta de encaminhamento, foi destacada a importância de buscar compreender a dinâmica do mercado nos municípios que compõem o Território da Borborema. A ideia é fazer um mapeamento de quais são os que têm feira e por que alguns não têm.
Já as feiras agroecológicas estão abrindo novos mercados na região, embora haja o desafio de superar a forma seletiva e altamente burocrática com que as normativas regulam esse mercado. Para enfrentar essa realidade, os participantes discutiram sobre a possibilidade de agricultores em transição venderem seus produtos ao lado dos produtores agroecológicos. Afinal, é sempre importante buscar favorecer as famílias que estão integradas em dinâmicas de inovação agroecológica, sem criar distinções e a elitização desses espaços de comercialização.
Foi também apontada a preocupação de evitar que se estabeleçam relações de dependência dos agricultores com o mercado. Os plantios de algodão, fumo e hortaliças foram citados como exemplos. Nesses casos, existe uma pressão por parte do mercado para que a produção seja de escala, o que incentiva a especialização dos sistemas produtivos. Ao se especializar num único cultivo, porém, o agricultor familiar perde as vantagens de uma produção diversificada e se torna vulnerável às oscilações dos preços e eventuais quedas de produção. Nesse sentido, o acesso aos mercados não contribuiria, mas sim ameaçaria a sustentabilidade da agricultura familiar no território.
A relação com o mercado tem que ter qualidade, é uma relação também política e de poder. E o que a gente quer é que a agricultura familiar dessa região mantenha o poder de suas formas de construir as relações com o mercado na região. Estamos falando do mercado como parte importante da construção de um projeto de vida, não só da agricultura familiar, mas também da sociedade do entorno, com consumo saudável e consciente, explicou Luciano Silveira (AS-PTA).
Falar de qualidade na relação com os mercados significa dizer que boa parte das riquezas geradas deve ser retida pelos agricultores de forma a garantir a sustentabilidade dos sistemas produtivos a partir da reprodução de sua base ecológica e social. A oficina justamente buscou apontar a importância de criar estratégias de mercado diversificadas, que promovam a inserção econômica da família, por meio da democratização do acesso ao mercado pela agricultura familiar. Algumas questões podem ser levantadas nesse sentido: Quem se apropria da riqueza produzida pela família? Como ficam os jovens, como ficam as mulheres? Como fazer para garantir o acesso maior ao núcleo familiar?
Além disso, foi abordada a necessidade de um diálogo mais constante com os órgãos públicos e fazer um levantamento dos projetos em andamento e sua abrangência. Discutiu-se a importância de haver um maior protagonismo dos agricultores, assim como estabelecer mecanismos de controle social para o acompanhamento dos programas, tais como o Programa de Aquisição de Alimentos da Companhia Nacional de Abastecimento (PAA/Conab), PAA municipal e PAA estadual. Melchior Batista, da Embrapa Algodão, reforçou que as organizações que representam as famílias agricultoras devem ser mais atuantes: Acho que o Polo deve se envolver mais, pois representa a classe dos agricultores. Há inclusive casos de pessoas que utilizam a Declaração de Aptidão do Pronaf (DAP) de agricultores e se beneficiam do recurso PAA sem ser agricultor.
Esse novo e estratégico mercado institucional também vem cobrando das famílias agricultoras formas de organização e gestão mais ágeis e adequadas. Trata-se, nesse sentido, de um grande desafio a ser superado, sobretudo para a assessoria técnica. Esta deve pensar estratégias de capacitação para os empreendimentos econômicos, de modo a elevar a capacidade das organizações agricultoras para gerir a burocracia do PAA, organizar os circuitos de oferta e demanda, atender às exigências dos mercados, avançando no processamento, beneficiamento, com produtos tratados, selecionados, o que representa um esforço grande por parte das famílias, organizações agricultoras e associações comunitárias que estão envolvidas em empreendimentos econômicos.
O acesso aos mercados pela agricultura familiar é um assunto de grande relevância, uma vez que o escoamento da produção não beneficia apenas as famílias agricultoras, mas também a população consumidora, tanto aquela que frequenta as feiras como aquela que recebe, por intermédio de programas do governo, produtos produzidos nas unidades familiares. As feiras agroecológicas apresentam ainda um diferencial. Nelas, pode-se conhecer quem produz e como produz, estabelecendo uma relação de confiança mútua e de reconhecimento do importante papel que as famílias agricultoras desempenham na produção de alimentos saudáveis, na geração de riqueza e de empregos.