Alimentos Saudáveis em Mercados Locais é o novo projeto do Programa de Agricultura Urbana lançado no dia 09 de outubro em Nova Iguaçu, na Baixada Fluminense, pela AS-PTA Agricultura Familiar e Agroecologia. A iniciativa contribuirá para promover a transição agroecológica de quatro municípios da região metropolitana do Rio de Janeiro, desenhando caminhos diferentes e encurtando a distância entre produtores e consumidores. A comercialização da produção de cinco empreendimentos solidários será fortalecida, envolvendo duzentos agricultores familiares. Além dos agricultores, o projeto estabelece parcerias com universidades, centros de pesquisa, órgãos da sociedade civil e do governo.
Preservar a natureza, promover a experimentação, sistematizar experiências, facilitar momentos de formação, implantar tecnologias sociais, fortalecer as feiras e sistemas produtivos, estimular o consumo de alimentos saudáveis, essas são algumas das suas propostas. A ideia é ir a campo para construir com as famílias agricultoras, a partir das experiências locais, estratégias de ação para fortalecer as feiras, os mercados de proximidade, as vendas para alimentação escolar, os programas de compras coletivas e outras formas de produção e consumo.
A programação do lançamento teve início na Feira da Roça de Nova Iguaçu onde os participantes puderam partilhar uma mesa de café da manhã bastante diversa, composta por produtos da própria feira. Ali também puderam conhecer as dificuldades e as conquistas do espaço para afirmação da agricultura familiar do município.
Consumidor há anos da Feira da Roça, Leonel de Gouveia, aposentado de 67 anos, compra queijo, linguiça e palmito. Ele ressalta a qualidade dos alimentos sem agrotóxicos, justificando sua compra de hortaliças e legumes para o consumo de sua família. “O paladar sem agrotóxico é diferente, e tem muita coisa nova também. É bom para levar aos nossos netos. O contato com os agricultores também é muito prazeroso, já virei cliente e amigo de muitos”, disse.
O evento prosseguiu no Centro de Formação da Diocese de Nova Iguaçu (Cenfor) com as boas vindas dadas por Sônia Ferreira, da Comissão Pastoral da Terra (CPT). Sônia lembrou a luta histórica em defesa da terra realizada pela Diocese e pela CPT na região. Desde então vêm sendo mapeados os conflitos agrários no entorno que motivaram o surgimento de diferentes iniciativas para o fortalecimento da agricultura familiar, com destaque para a Escolinha de Agroecologia como instrumento de formação para os agricultores e a Feira da Roça, “ambos numa parceria da CPT com Emater local e com diversos atores que convergem nesse contexto de luta e cuidado da terra”, ressaltou.
Dom Luciano, bispo da diocese, reforçou suas observações: “É preciso dar condições para a produção e venda dos trabalhadores, empenho das autoridades desses municípios para a terra produzir frutos e lhes dar dignidade. Alimento é necessário e tem que ser saudável, sem os venenos atuais”, alertou.
Após a apresentação do vídeo Agricultura mora em mim – a face invisível da cidade, que relata a experiência e valoriza o trabalho da agricultura familiar no Rio, Marcio Mendonça, coordenador do Programa de Agricultura Urbana da AS-PTA, destacou que os projetos chegam a essas regiões para dar sequência aos trabalhos de resistência promovidos pelos camponeses. Ele também afirmou que essas realizações fortalecem circuitos sem atravessadores e grandes centrais de distribuição, possibilitando a geração de renda aos agricultores e o entendimento sobre a relação da agricultura familiar com o mercado.
“Esse projeto é uma nova etapa de nosso trabalho, conduzido na região com vários parceiros, para potencializar uma agricultura que muitas vezes está invisibilizada. É momento para festejar e seguir junto por mais um período. Para nós e os agricultores é o cotidiano, e queremos fazer virar realidade para muitas pessoas. É importante essa aproximação da produção e do consumo, trazer outro olhar da perspectiva do consumidor com um alimento saudável e apoiar a agricultura familiar local”, apontou.
Relatos e debates
Representando a Rede Carioca de Agricultura Urbana, Francisco Caldeira lembrou que no Rio de Janeiro o estado costuma trabalhar contra os agricultores familiares. Daí a importância das parcerias para avançar na organização, complementou. “Nosso grupo surgiu em Vargem Grande, na zona oeste, com forte presença dos camponeses numa história de luta e injustiça. É preciso resgatar a agricultura e ampliar parcerias para termos um horizonte melhor. Ouvimos muitos nãos, isso era e é muito desesperador, mas estamos saindo da inexistência. Tirar a Declaração de Aptidão ao Pronaf (DAP) foi um nó, mas hoje já temos duas no maciço da Pedra Branca possibilitando a venda ao Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE). Estamos discutindo a legalização da Feira Agroecológica da Freguesia. Pretendemos conhecer melhor a política de venda, e ampliar os trabalhos com as redes, ONGs e universidades para trazer mais retorno financeiro aos agricultores”, disse.
Motivados pela apresentação de Francisco, outros agricultores também relataram dificuldades para conquistar avanços na venda de seus produtos, muitas dessas também associadas às dificuldades de obtenção da DAP. A logística de transporte para essa produção também foi citada. Um dos novos desafios, segundo Claudemar Mattos, também da AS-PTA, será a capacidade de construir junto à prefeitura políticas públicas que garantam as feiras da agricultura familiar nos municípios. Um passo mais a frente na geração de renda desses trabalhadores é o acesso a mercados locais institucionais, o que exige maior grau de organização coletiva e esbarra em dificuldades com os gestores locais.
Outra forma de geração de renda fundamental é a diversificação da produção do agricultor, destacou a jovem Evellin Cunha Rodrigues, assim a família consegue garantir sua segurança alimentar e se afastar dos atravessadores. “Produzindo a diversidade no seu terreno, você não precisa ir ao supermercado, já tem tudo em casa para sua alimentação e venda”, diz.
O cenário dos alimentos é de disputa entre os modelos do agronegócio e da agroecologia, pontuou Miriam Langenbach, na apresentação da Rede Ecológica. Para ela, é fundamental a conscientização dos consumidores, que estão comprando de forma alienada sob influência dos meios de comunicação e a padronização das comidas.
“De um lado tem o agronegócio com todas as corporações, muito dinheiro e poder, e de outro, a agroecologia que é o movimento vem construindo nova relação dos produtores com os consumidores. Afirma a importância de um alimento sem veneno, cujos resultados estão ficando cada vez mais visíveis para a sociedade. Hoje a Rede Ecológica já possui onze núcleos atingindo cerca de duzentas famílias, afirmando em conjunto com os agricultores que o planeta não aguenta a atual forma de desenvolvimento”, concluiu.
De acordo com a doceira Juliana Medeiros, de 67 anos, moradora de Magé, Baixada Fluminense, a parceria da Coopagé (Cooperativa de Agricultores de Magé) com a AS-PTA permitiu melhorar sua vida ao aprimorar as condições para sua produção e comercialização. Ela faz geleias de diversos sabores com o que produz em seu sítio, e compotas de jiló, laranja e farinhas do inhame, maracujá, casca de ovo e berinjela. E está feliz com a nova etapa de trabalho.
“Desde que conheci o pessoal da agroecologia consegui melhorar na vida e me reanimar. Fiz meus processamentos e, principalmente, vendi meus produtos. Pude me capacitar e renovar materiais, como vidros e matérias primas. A partir daí fui tocando a comercialização. Participei da feira de Magé e da UFRJ, e agora Feira da Freguesia e Barra. E tem os eventos, que é onde você vende mais. Participei de feiras da Marina da Glória, da Cúpula dos Povos, etc. Quero continuar aprimorando e preciso terminar a parte da legislação e a administração da minha cozinha”, afirmou.
As atividades se encerram com um convite à Feira de Produtos da Agricultura Familiar montada no próprio Cenfor, organizada especialmente para o evento. Cada participante recebeu um ticket “Alimentos Saudáveis Direto da Roça” para trocar por produtos na feira. A iniciativa vem estimular novas formas de consumo, mais conscientes e responsáveis.
O projeto Alimentos Saudáveis em Mercados Locais será realizado pela AS-PTA Agricultura Familiar e Agroecologia com o patrocínio da Petrobras por meio do Programa Desenvolvimento & Cidadania.
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