Cerca de 1.200 pessoas participaram em Campina Grande, no último dia 28 de março, da “Mobilização pelo acesso à água de qualidade como um direito de todos”, realizada pela Articulação do Semiárido Paraibano (ASA Paraíba) em alusão ao Dia Mundial da Água, celebrado em 22 de março. O objetivo da atividade foi ainda o de celebrar as conquistas dos 21 anos de atuação da ASA Paraíba no seu trabalho de construção de um projeto de convivência com o semiárido baseado na agricultura familiar de base agroecológica e em especial a democratização do acesso à água.
A programação teve início às 8h da manhã, quando as caravanas chegaram das regiões Alto e Médio Sertão, Cariri, Curimataú, Brejo, Agreste e Seridó se concentraram no interior do Teatro Municipal Severino Cabral. O grupo de tradições folclóricas Acauã da Serra animou a chegada dos participantes com músicas emblemáticas da região e da cultura sertaneja, com o autêntico forró pé-de-serra. Em seguida foi apresentada uma peça de teatro que mostrou de que forma a chegada da cisterna vem revolucionando a vida no semiárido e como é feito o processo de mobilização e envolvimento das famílias agricultoras.
Exposição – Ainda dentro do teatro houve a exposição feita por Luciano Silveira, da AS-PTA Agricultura Familiar e Agroecologia, uma das 300 entidades que faz parte da ASA Paraíba presentes em mais de 160 municípios paraibanos. Luciano fez uma apresentação da região semiárida brasileira, uma área de aproximadamente um milhão de quilômetros quadrados onde vivem perto de 2 milhões de famílias agricultoras. Em seguida trouxe um resgate histórico das secas na região e do cenário de calamidade, subordinação e dependência das famílias no acesso a terra, a água e as sementes e as soluções apresentadas pelos governos da época de “combate à seca”. Relembrou o momento de ocupação da Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste (SUDENE) em 1993, o qual deu origem a Articulação do Semiárido Paraibano e que significou um marco na luta pela autonomia dos agricultores e agricultoras da região. Falou ainda do processo de criação do Programa Um Milhão de Cisternas, da ASA e atualmente executado com recursos do Governo Federal, por meio da parceria com o Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS) que já construiu mais de 600 mil cisternas em todo o semiárido brasileiro.
Cisternas de plástico – Ao final da exposição foram exibidas matérias veiculadas na imprensa com queixas de agricultores de várias regiões do semiárido sobre problemas apresentados pelas cisternas de plástico como deformações e aquecimento da água. As cisternas de plástico ou PVC estão sendo propostas pelo Ministério da Integração Nacional, por meio do Departamento Nacional de Obras Contra as Secas (DNOCS), do Governo Federal. Os agricultores não concordam com a substituição das cisternas de alvenaria pelas de plástico e alegam que, além de funcionar bem, as cisternas de placa trazem oportunidade de trabalho no campo com o emprego de pedreiros e a compra de material no comércio local, dinamizando a economia. Já as cisternas de plástico só beneficiam uma única grande empresa e é uma tecnologia que os agricultores não dominam.
Caminhada – Após a exposição os participantes saíram em caminhada pela Avenida Floriano Peixoto, no centro da cidade, organizados em alas que simbolizavam temas estratégicos de atuação da ASA como acesso à terra, educação para a convivência com o semiárido, sementes, criação animal, pedreiros e feiras agroecológicas, entre outras. E uma ala dedicada às ameaças denominada de “Cultura da Morte”, que incluiu símbolos do agronegócio como os transgênicos, os agrotóxicos e as cisternas de plástico. Segurando faixas, cartazes, banners e produtos da agricultura familiar e acompanhados por um minitrio elétrico e um carro de som, com direito a carro “abre-alas”, os manifestantes distribuíram panfletos e dialogaram com a população. Levando para a cidade uma demonstração da riqueza e das conquistas alcançadas pelo movimento de trabalhadores e trabalhadoras rurais.
A manifestação seguiu até a Praça da Bandeira onde uma feira de experiências com exposição de produtos, maquetes e distribuição de mudas foi montada. Um ato público trouxe depoimentos que resgataram momentos importantes da caminhada de 21 anos de luta da ASA Paraíba e apontaram seus desafios atuais. Rogéria Campos, da coordenação do Coletivo das Organizações da Agricultura Familiar, sediado em Soledade-PB, relembrou a conquista na luta pela afirmação do modelo das cisternas de placas como a tecnologia mais adaptada ao semiárido: “Em maio de 2013 recebemos um convite para compor um comitê gestor das cisternas de plástico no município. Fomos para ouvir, nos posicionamos contra e, com muita luta, conseguimos barrar esse projeto. Em dezembro do ano passado fomos surpreendidos com um novo convite. A gente se organizou e conseguiu pressionar o governo municipal para barrar pela segunda vez e varrer as cisternas de plástico de lá. É bom lembrar que Soledade foi o primeiro município a ter construída uma cisterna de placas na Paraíba, então seria uma vergonha pra nós, se fosse construído lá uma cisterna de plástico”, afirmou.
A programação foi encerrada com uma mística onde os manifestantes fizeram o “enterro simbólico” de uma cisterna de plástico. Os participantes então celebraram o êxito do evento com uma bonita ciranda. A mobilização contou com parceiros como o Núcleo de Extensão Rural e Agroecologia (NERA) da UEPB.