Iranilde de Oliveira Silva, Diogo de Souza Pinto, Maiza Grabielle Ribeiro Pereira, Fernanda Olivieri de Lima, Luciana Nogueira Fontenele, Selma Fabre Dansi e Lia Maria Teixeira de Oliveira
Articulação de Agroecologia do Rio de Janeiro (AARJ), a partir do acúmulo de práticas e experiências de grupos organizados nas diferentes regiões do estado, identificou demandas de formação e capacitação de jovens agricultores e agricultoras. Para responder, em termos político-acadêmicos, a essa demanda específica, a AARJ procurou a Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ) com o objetivo de estabelecer uma parceria para a execução do projeto Campo e Campus – Jovens rurais/quilombolas protagonizando o fortalecimento da agricultura familiar e a construção do conhecimento agroecológico no estado do Rio de Janeiro. Executado entre janeiro de 2009 e fevereiro de 2011, o projeto atuou na formação de 70 jovens (entre 14 a 18 anos) provenientes das regiões Norte Fluminense, Metropolitana, Médio Paraíba, Serra-Mar (Serrana e Baixada Litorânea), e Sul (Costa Verde) (ver mapa 1).
ORIGEM DOS EDUCANDOS
Os jovens que participaram do Programa de Intervivência Universitária são oriundos de regiões rurais e urbanas que assistiram a processos de especulação imobiliária e disputas por terra ao longo das últimas três décadas. Alguns vieram de comunidades rurais de Casimiro de Abreu/RJ e já haviam participado de um projeto denominado Agentes Jovens, que tinha como objetivo fomentar atividades produtivas em bases agroecológicas para estimular a permanência da juventude na agricultura familiar. Outros eram do Quilombo do Campinho, em Paraty/RJ, articulados por um projeto voltado à promoção do protagonismo juvenil em ações relacionadas à preservação e conservação dos recursos naturais e da cultura local motivadas pelo manejo sustentável da palmeira juçara. Um terceiro grupo originou-se do programa de formação de jovens do campo e da cidade organizado pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra. Um último grupo foi composto por parentes de agricultores urbanos e rurais vinculados a atividades de formação agroecológica realizadas na região metropolitana do Rio de Janeiro pela Comissão Pastoral da Terra (Escolinha de Agroecologia) e pela AS-PTA. Embora de origens diversas, os grupos estavam informalmente articulados por meio de uma rede sociotécnica e política de âmbito estadual identificada aos princípios da Agroecologia.
O contexto geral da juventude rural no estado do Rio de Janeiro é marcado pelas limitadas oportunidades de trabalho e renda e por processos de despolitização e aculturação que estimulam a adoção de estilos de vida estranhos às suas heranças culturais. Além disso, a ausência de uma educação básica relacionada com a realidade local e contextualizada na diversidade sociocultural desses jovens contribui para uma escolarização acrítica e sem atrativos. Por essas razões, a programação do processo de formação enfatizou o vínculo entre educação e cultura, assumindo a Agroecologia como enfoque identitário para a construção de conhecimentos engendrados nos (e com) os cotidianos dos educandos.
A PRÁXIS DO PROGRAMA: FORMAÇÃO POR ALTERNÂNCIA
O projeto foi elaborado em parceria com docentes da UFRRJ da área de Edu- cação, Agronomia e Economia Doméstica, e formadores dos movimentos sociais vinculados à AARJ, respeitando os focos temáticos do Edital 23/CNPq e eixos de abordagem voltados para o meio ambiente, a agricultura, a ecologia, a saúde, a cultura e a tecnologia. Como o edital estabelecia que os jovens deveriam estar cursando o ensino fundamental ou médio, o programa foi executado em tempos e espaços estruturados segundo a Pedagogia da Alternância. Essa metodologia se ajustou plenamente aos objetivos da proposta, uma vez que se caracteriza por estimular o diálogo de saberes popular e acadêmico.
A Intervivência Campo-Campus foi organizada em três momentos interdependentes, sendo eles: Tempo Escola (TE), Tempo Comunidade (TC) e nova- mente TE. Cada TE durou 14 dias, período em que os jovens permaneceram na UFRRJ seguindo uma programação de estudos teórico-práticos e experimentais. O TC durou em torno de cinco meses e destinou-se à aplicação dos conhecimentos conceituais refletidos e discutidos durante os TEs.
A CONSTRUÇÃO DAS IDENTIDADES
Os conteúdos abordados na for- mação estiveram centrados nos eixos Reforma Agrária, Juventude, Agroecologia, Cultura e Sociedade e foram referenciados a experiências acumuladas anteriormente, tanto pela AARJ como pela UFRRJ.
As atividades desenvolvidas nos TEs e no TC contribuíram para que os jovens reafirmassem suas identidades enquanto agricultores. Para tanto, foram organizadas dinâmicas pedagógicas que os estimulavam a refletir sobre suas origens socioculturais, analisando em particular o que é ser jovem rural no mundo atual. Esse exercício foi realiza- do tendo em mente que os vínculos do jovem a sua comunidade/sociedade não são apenas de natureza material, mas configuram-se essencialmente a partir das relações sociais e interpessoais que se estabelecem no cotidiano.
A formação também contemplou oficinas de Teatro do Oprimido, viagens de intercâmbio e atividades culturais. Por meio dessas variadas formas de expressão e visualização, as realidades das comunidades quilombolas, caiçaras e indígenas puderam ser mais bem conhecidas.
Após uma vivência com as práticas agroecológicas no TC, os jovens trouxeram para o TE os resultados da implantação de seus projetos, destacando os limites e avanços na aceitação por parte da comunidade. As maiores queixas dos jovens estiveram relacionadas à falta de sensibilização da comunidade em relação às mudanças que os mesmos são capazes de promover, aspecto que dificultou o trabalho deles junto a outros jovens. De certa forma, esse comportamento confirma a falta de credibilidade que os jovens têm perante os adultos.
Diante dessa realidade, vimos a necessidade de incorporar ao processo reflexões sobre a posição do jovem em suas comunidades, bem como o debate sobre a necessidade deles serem mais propositivos quanto aos rumos da comunidade diante de outros jovens.
OS FRUTOS DO PROGRAMA
Após dois anos de atividades, as organizações da AARJ foram peças-chave para a inserção dos jovens nas atividades político-social-culturais das comunidades das quais fazem parte. Os frutos estão sendo colhidos e acolhidos. De 70 jovens formados, cerca de 80% estão envolvidos diretamente com as atividades da AARJ e outros 10% participam de forma indireta. Apenas 10% não retornaram ao TE. Os projetos locais na região Sul seguem fortalecidos com o protagonismo juvenil. A juventude da região metropolitana foi contemplada com um projeto financiado pela Fundação Luterana de Diaconia (FLD), onde seu maior objetivo é dar continuidade às atividades de formação, bem como acompanhar os jovens da segunda turma de Intervivência e ampliar as trocas de experiências entre os jovens das diversas regiões da AARJ. Na região Serra-Mar os jovens estão envolvidos em um projeto de banco de sementes crioulas na comunidade Quilombo de Itapinoã. Na região Norte os jovens desenvolveram atividades de formação para outros jovens, por meio de troca de conhecimentos e a estruturação de hortas como espaços de socialização de práticas de manejo agroecológico. Também contribuíram com assistência nas capacitações sobre Agroecologia em seus assentamentos. Embora não exista uma expressiva organização da AARJ no Vale do Médio Paraíba, os jovens dessa região desenvolveram ações ligadas às suas famílias e comunidades.
Com a Intervivência, o despertar para as questões da educação, como o ingresso em cursos de graduação, foi fortalecido. Muitos dos jovens estão cursando o segundo período do curso de graduação de Licenciatura em Educação do Campo, que também tem base na Pedagogia da Alternância e cuja presença da coordenação institucional do Campo-Campus contribui para que os jovens passassem a se interessar pelo ensino superior. O curso é oferecido pela UFRRJ por meio de um convênio com Programa Nacional de Educação para Reforma Agrária (Pronera).
Agradecimentos à Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ), AARJ e ao CNPq.
Iranilde de Oliveira Silva
coordenação executiva do Programa Intervivência Universitária; MST-RJ, integra a coordenação executiva da AARJ.
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Diogo de Souza Pinto
coordenação executiva do Programa Intervivência Universitária e estudante da UFRRJ
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Maiza Grabielle Ribeiro Pereira
coordenação executiva do Programa Intervivência Universitária e estudante da UFRRJ
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Fernanda Olivieri de Lima
coordenação executiva do Programa Intervivência Universitária; estudante da UFRRJ e membro do Grupo de Agricultura Ecológica da UFRRJ (GAE)
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Luciana Nogueira Fontenele
coordenação executiva do Programa Intervivência Universitária; estudante da UFRRJ e membro do Grupo de Agricultura Ecológica da UFRRJ (GAE)
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Selma Fabre Dansi
coordenação executiva do Programa Intervivência Universitária; licenciada em Economia Doméstica e membro do Grupo de Agricultura Ecológica da UFRRJ (GAE)
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Lia Maria Teixeira de Oliveira
professora da UFRRJ, Área de Ensino Agrícola, e coordenadora institucional do Programa Intervivência Universitária/UFRRJ e CNPq
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Revista V8N1 – Jovens educandos do Programa Interveniência Universitária Juventude protagonizando a transição agroecológica no estado do Rio de Janeiro