Mia Rowan
“Ao definir “o futuro que queremos” para o planeta em que vivemos, líderes mundiais reunidos na Rio+20 resolveram estabelecer como meta lutar por um mundo sem degradação de terras. O processo de construção de uma parceria global para reverter e prevenir a desertificação/degradação da terra e para mitigar os efeitos das secas em áreas afetadas, a fim de apoiar a redução da pobreza e a sustentabilidade ambiental, faz com que a Convenção das Nações Unidas para o Combate à Desertificação (UNCCD, na sigla em inglês), um dos três tratados internacionais firmados na Cúpula da Terra de 1992, permaneça no centro dos desafios mais urgentes para o desenvolvimento dos países”.
Mia Rowan
A UNCCD aborda questões vitais relacionadas à melhoria da produtividade da terra, assim como à regeneração, à conservação e ao manejo sustentável dos solos e dos recursos hídricos. As 195 Partes (194 países e a União Europeia) que ratificaram a Convenção têm por objetivo melhorar as condições de vida das pessoas, especialmente daquelas residentes em zonas secas, onde se encontram alguns dos ecossistemas e populações mais vulneráveis. A Convenção busca atingir seus objetivos lançando mão de uma abordagem “de baixo para cima” – capacitando os grupos afetados pela desertificação e pela degradação da terra para combatê-las, fornecendo os instrumentos e desenvolvendo as capacidades das autoridades locais e da sociedade civil.
A degradação dos solos acarreta um custo enorme, e não só para o 1,5 bilhão de pessoas em todo o planeta diretamente afetadas. Os 12 milhões de hectares perdidos anualmente em função da degradação da terra têm o potencial de produzir 20 milhões de toneladas de grãos – alimento que minimizaria a crescente insegurança alimentar e reduziria a fome ao nível global.
“Um dos principais pontos fracos do atual sistema alimentar global é a ausência de políticas de incentivo destinadas a três áreas-chave na produção de alimentos – empoderamento das mulheres, produtividade de áreas secas e acompanhamento do uso que se faz da terra ”, declarou Luc Gnacadja, Secretário Executivo da UNCCD. Gnacadja ressaltou ainda que, em- bora as mulheres constituam mais de 40% da força de trabalho, elas representam apenas 3 a 20% dos proprietários de terras.
As terras secas do mundo – situadas nas zonas áridas, semiáridas e subúmidas secas – representam 44% de todos os sistemas de cultivo. Mas a degradação dos solos não só nessas áreas como em outros lugares está prejudicando a produção alimentar global e, dessa forma, contribuindo para afetar a estabilidade dos preços dos alimentos. A produção de alimentos consome recursos que são finitos – terra e água. 70% da água doce do mundo é utilizada na agricultura. A incorporação dos custos da regeneração dos solos e das fontes de água em todo o processo de produção alimentar pode ser um dos fatores de indução ao uso de práticas agrícolas mais sustentáveis.
Em sua mensagem no Dia Mundial da Alimentação, em outubro de 2012, Gnacadja perguntou incisivamente: Como podemos manter a estabilidade na produção de alimentos quando os recursos naturais – terra e solo –, que são a espinha dorsal da agricultura, são degradados ano após ano?
Para atender ao aumento dramático esperado na demanda de alimentos, não podemos contar com a intensificação da agricultura, cujos esquemas de produção degradam os solos, destroem ecossistemas e apresentam custos produtivos elevados em função do grande aporte de insumos caros. Além disso, têm exibido uma estagnação da produtividade e estão cada vez mais vulneráveis aos impactos das mudanças climáticas. Por outro lado, os sistemas de produção com base na intensificação da biodiversidade localmente disponível e adaptada, utilizando conhecimento local, bem como as potencialidades dos ecossistemas locais, têm mostrado que podem contribuir significativamente para reduzir a fome, melhorar os meios de subsistência, proteger e regenerar a terra, os solos, as fontes de água e a biodiversidade, aumentando a resiliência às mudanças climáticas.
EXEMPLOS DE SUCESSO
Os sucessos obtidos por agricultores familiares em todo o mundo são muito importantes, uma vez que contribuem para a identificação de deficiências nas políticas vigentes e a construção de soluções. Em Burkina Faso, por exemplo, algumas comunidades não só se tornaram mais resistentes à seca, mas também estão produzindo excedentes de grãos ao adotarem práticas de regeneração natural dos recursos que são geridas pelos próprios agricultores e ao implantarem sistemas agroflorestais. Trata-se de práticas de uso da terra construídas com base em técnicas agrícolas que conjugam conhecimentos vindos da ciência convencional e do saber local.
As experiências bem-sucedidas mostram que os benefícios são imediatos para as famílias, mas também atingem escalas nacionais e globais em termos de promoção de segurança alimentar ao incorporar o manejo sustentável da terra na prática agrícola.
TRABALHANDO COLETIVAMENTE
As ações ligadas às convenções sobre biodiversidade, mudanças climáticas e combate à desertificação caminham de mãos dadas. Os sistemas de produção biointensivos, como a agricultura orgânica, a Agroecologia e as agroflorestas, têm um papel a desempenhar para evitar a degradação da terra e regenerar áreas degradadas. Eles encontram-se bem estabelecidos em todo o mundo e poderiam ser chamados de “Práticas Sustentáveis de Manejo da Terra aplicadas à agricultura”, no âmbito da UNCCD, ou “Agricultura Climaticamente Inteligente”, no âmbito da Convenção da ONU sobre Mudanças do Clima (UNFCCC, na sigla em inglês).
O resultado da Rio+20, no sentido de reunir esforços para lutar por um mundo sem degradação de terras, sinaliza um forte desejo de mudar, evitando o avanço da degradação de solos sobre novas regiões e melhorando a qualidade da terra que é degradada a cada ano. Mas essa intenção deve ser transformada em ações concretas – é preciso estabelecer um cronograma e mecanismos para a sua realização. Na verdade, a interrupção dos processos de degradação da terra deve figurar entre os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) para assim ter sucesso na conquista dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM) em 2015.
Fundada em 1994, a Convenção das Nações Unidas de Combate à Desertificação é um acordo internacional que vincula juridicamente o ambiente e o desenvolvimento ao manejo sustentável da terra. A UNCCD trata especificamente das zonas áridas, semiáridas e subúmidas secas, genericamente conhecidas como terras secas, onde se situam os ecossistemas e povos mais vulneráveis.
Mia Rowan
especialista em mídia social, editora da língua inglesa no Mecanismo Global (GM – ver quadro) da UNCCD.
m.rowan @ global-mechanism.org
Baixe o artigo completo:
Revista V9N3 – Lutando por um mundo sem degradação de terras