Brasília, 26 de junho de 2010.
Carta aberta à Ministra Erenice Guerra
Presidente do Conselho Nacional de Biossegurança
Senhora Ministra,
O Conselho Nacional de Biossegurança é instância máxima deliberativa em matéria de biossegurança, nos termos do artigo 8o da Lei 11.105/2005, competindo-lhe avocar e decidir, em última e definitiva instância, sobre os processos relativos a atividades que envolvam o uso comercial de OGM e seus derivados; bem como sobre os aspectos de conveniência e oportunidade socioeconômicas e do interesse nacional, sobre os pedidos de liberação para uso comercial de OGM e seus derivados, como não poderia deixar de ser.
Até o presente momento, a atuação do CNBS tem sido lamentável. Uma demonstração é que diante de divergências técnicas, devidamente formalizadas entre CTNBio e os órgãos de registro (ANVISA e IBAMA), decidiu o Conselho se abster de seu dever legal enquanto instância recursal, não apreciando a questão. Decisão que esvaziou completamente a competência técnica dos órgãos de registro e fiscalização, imposta por lei.
Esta decisão do Conselho de Ministros em 2008 contribuiu sobremaneira para o acelerado quadro de liberações comerciais no Brasil. Até 2008, apenas 2 variedades geneticamente modificadas estavam liberadas no país, hoje este número saltou para 21 variedades, entre algodão, soja e milho.
Outro fato a ser lembrado é que em 18 de julho de 2008, o CNBS decidiu, por unanimidade, que fosse criada Comissão para avaliação dos efeitos a médio e longo prazo dos organismos geneticamente modificados na saúde e no meio ambiente, conforme Orientação no 2, mas até agora, nenhuma medida foi tomada. Pior, o Conselho cala-se quando a CTNBio anuncia publicamente que irá rever a regra que prevê o monitoramento pós liberação comercial dos OGMs para a saúde, contrariando frontalmente a diretriz do CNBS.
Neste momento está em fase avançada de tramitação o processo de liberação comercial do arroz Liberty Link desenvolvido pela empresa Bayer, resistente ao princípio ativo (agrotóxico) glufosinato de amônio. Conforme documento anexo amplamente divulgado por mais de 100 organizações e movimentos sociais, são diversos os riscos à saúde e ao meio ambiente decorrentes deste evento.
Neste caso, há também vários aspectos econômicos envolvidos, razão pela qual a própria Embrapa Arroz e Feijão é contra sua aprovação, assim como os setores produtivos do arroz no
país, como FARSUL, Federarroz e IRGA.
É, portanto, imprescindível que o Conselho Nacional de Biossegurança não se omita mais uma vez, discuta amplamente com os setores interessados a matéria e, por fim, rejeite a liberação comercial do arroz Liberty Link no país. Ressalte-se que em nenhum lugar do mundo o arroz geneticamente
modificado está liberado comercialmente.
Delegar decisões de extrema relevância pública e social única e exclusivamente a 14 membros de um órgão técnico da administração, como vem sendo o processo de liberação na CTNBio, e que tem sido ampla e publicamente criticada, é medida de irresponsabilidade que não se pode admitir deste governo.
As organizações AAO – Associação de Agricultura Orgânica; ABRANDH – Ação Brasileira pela Nutrição e Direitos Humanos; ACAN – Associação Catarinense de Nutrição; AEPAC – Associação Estadual dos Pequenos Agricultores Catarinenses; ANA – Articulação Nacional de Agroecologia; ANAC – Associação Nacional de Agricultura Camponesa; ANPA- Associação Nacional dos Pequenos Agricultores; APATO – Alternativas para a Pequena Agricultura no Tocantins; APPA – Associação Paranaense de Pequenos Agricultores; ARPA- Associação Riograndense de Pequenos Agricultores; AS-PTA – Agricultura Familiar e Agroecologia; Cooperfumos – Cooperativa Mista de Fumicultores do Brasil Ltda; CONESANGO – Conselho Estadual de Segurança Alimentar e Nutricional de Goiás; CONSEASC – Conselho Estadual de Segurança Alimentar e Nutricional de Santa Catarina; CPCPR – Cooperativa Mista de Produção e Comercialização Camponesa do Paraná Ltda; CPCRS – Cooperativa Mista de Comercialização Camponesa do Rio Grande do Sul Ltda; FASE – Federação de Órgãos para a Assistência Social e Educacional; FBSSAN – Fórum Brasileiro de Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional; FEAB – Federação dos Estudantes de Agronomia do Brasil; FESANSMS – Fórum Estadual de Segurança Alimentar e Nutricional Sustentável do Mato Grosso do Sul; FNECDC – Fórum Nacional das Entidades Civis de Defesa do Consumidor; FOSANES – Fórum de Segurança Alimentar e Nutricional do Espírito Santo; IDEC – Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor; Instituto Cultural Padre Josimo; MAB – Movimento dos Atingidos por Barragens; MMC – Movimento de Mulheres Camponesas; MPA – Movimento dos Pequenos Agricultores; MST – Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra; PJR – Pastoral da Juventude Rural; RECIDGO – Rede de Educação Cidadã de Goiás; Terra de Direitos; Via Campesina assinaram o documento anexo e aguardam o posicionamento do CNBS.
Atenciosamente,
AS-PTA – Agricultura Familiar e Agroecologia
IDEC – Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor
TERRA DE DIREITOS