A Pedra do Sapo é uma localidade na favela do Morro da Esperança, no Complexo do Alemão, Zona Norte do município do Rio de Janeiro. Moradores da região reportam o aumento de antigos desafios no contexto da pandemia, sendo a ausência de coleta adequada dos resíduos orgânicos nas ruas e a dificuldade de acesso a serviços essenciais, como compra do botijão de gás, alguns dos problemas mais levantados.
Dona Josefa Santos, moradora há 15 anos da comunidade, passou a ser reconhecida como ativista comunitária pela vizinhança, por animar ações de melhoria ambiental e estar sempre atenta às dificuldades do entorno. Participante da Verdejar Socioambiental desde 2012, ela vem recebendo apoio e assessoria do Projeto EcoFavela. Este tem a proposta de transformar Soluções Baseadas na Natureza (SbN) em Tecnologias Socioambientais de Baixo Custo, visando fortalecer a capacidade de resistência e adaptação dos moradores de modo que todos possam replicar as técnicas de maneira autônoma em seus territórios.
Nessa perspectiva e pensando sobre o direito a áreas verdes saudáveis e o acesso a comida de verdade, integrantes do EcoFavela e do Arranjo Local da Serra da Misericórdia – rede territorial formada por coletivos e moradores na qual, de forma autogestionada elaboram estratégias de agricultura urbana ancoradas na base da agroecologia – promoveram no alto do morro, no dia 31 de julho, a oficina de confecção de um biodigestor.
O biodigestor é uma tecnologia socioambiental de baixo custo que permite a transformação da matéria orgânica em biogás – que pode ser utilizado no fogão de cozinha – e no biofertilizante – usado como insumo nas hortas – por meio da digestão anaeróbica (sem oxigênio) feita por microorganismos pelo processo de fermentação. Sobre essa ação Dona Josefa comenta:
“Diante do caos que estamos vivendo, da pandemia que nos trouxe tantos problemas, tem muitas pessoas na minha comunidade que não tem mais como pagar um botijão. Até que comecei ver além, pensar em mim e nos outros, muitas vezes até penso mais nos outros do que em mim. A gente que mora em comunidade passa por muita dificuldade, então eu faço um trabalho de conscientização porta a porta. Eu tenho um olhar diferente sobre tudo que se joga fora. Comecei a fazer pesquisas na internet, assistir vídeos e participar de cursos online, e assim que descobri a tecnologia do biodigestor fiz dois protótipos no meu quintal com materiais que eu reaproveitei não deram certo, e então eu comecei a buscar orientação com pessoas da minha rede”.
Mediada pelos oficineiros Izabela e Vagner do Instituto Socioambiental Reserva da Prata, a formação começou com uma apresentação teórica do funcionamento e contextualização histórica do biodigestor. O processo de instalação durou o dia todo e foi enriquecido pelas trocas entre os participantes.
O modelo implementado foi uma adaptação do chamado Bio21, que conta com o uso de 3 bombonas ligadas por um sistema de canos de PVC e conexões, sendo duas de 200L usadas como alimentador formando um sistema de êmbolo, e uma de 1000L como reservatório. Para seu manejo é necessário esterco para ativação, resíduos orgânicos e água.
Conforme os oficineiros mostravam o passo a passo da confecção, Edson Gomes, da Verdejar Socioambiental, indicava a todo tempo alternativas para o uso das ferramentas e equipamentos apresentados por eles, de modo que ficasse claro para os participantes que, mesmo não tendo o equipamento sugerido, isso não seria um impeditivo para a construção. “Na agroecologia e na permacultura não se tem uma receita única e pronta, é a experimentação a partir de nossas próprias vivências, com recursos que estão disponíveis e que sejam compatíveis com a realidade local, que encontramos soluções para nossos desafios” complementa Mariana Portilho, assessora técnica da AS-PTA.
O legado que fica é a geração própria de gás de cozinha, garantindo autonomia e autossuficiência à comunidade além do benefício ecológico na geração de biofertilizante garantindo a agricultura urbana orgânica sem uso de insumos químicos. Além disso, como forma de gerir resíduos orgânicos sem misturar com recicláveis, ajuda a prevenir a proliferação de doenças e animais indesejados.
A realização dessa ação é uma parceria entre os projetos: EcoFavela, realizada pela Verdejar Socioambiental, Agricultura Urbana e Arranjos em Mercados Locais na Região Metropolitana do Rio de Janeiro realizada pela AS-PTA com apoio da MISEREOR e Sertão Carioca: Conectando Cidade e Floresta com patrocínio da Petrobras, por meio do Programa Petrobras Socioambiental.