É pelas mãos de muitas mulheres que a agricultura urbana familiar e a agroecologia se fortalecem. Seus conhecimentos sobre cooperação, plantio, produção, preparo, beneficiamento e comercialização dos alimentos tem garantido a segurança alimentar e nutricional de muitas comunidades brasileiras.
No atual cenário de pandemia, muitas de nós estamos sobrecarregadas. O trabalho doméstico aumentou e há uma maior urgência e, ao mesmo tempo, dificuldade para a geração e incremento de renda. Somado a isso, o aumento da preocupação com os filhos, companheiro/as, idosos, familiares e vizinhos torna o tempo ainda mais escasso para o autocuidado físico e mental. E a maior sobrecarga tem cor. Esses desafios são ainda maiores para as mulheres pretas, considerando o seu lugar social historicamente construído.
Nos centros urbanos, nas áreas rurais, nos quilombos de dentro das matas, nos cortiços das áreas centrais da cidade ou nas favelas contemporâneas, a ação das mulheres tem papel de destaque na organização de seus territórios, na construção do sentido de comunidade, e na formação das estratégias de sobrevivência e resistência da população pobre, sobretudo negra. Em especial, as mulheres exercem um papel fundamental na perpetuação dos valores civilizatórios afro-brasileiros, que possibilitam outros modos de organização social e produtiva da vida, de cuidado e saúde.
As mulheres quilombolas-faveladas acumularam conhecimentos ancestrais de saúde popular sobre o uso de plantas e ervas medicinais, que vem compartilhando nas suas redes de solidariedade. São receitas de xaropes, chás, banhos e escaldas pés transmitidas através de troca e construção coletiva de saberes. Essas mulheres seguem sendo detentoras de saberes tradicionais, das rezas, da medicina natural e lutam atualmente, mais do que nunca, pela alimentação saudável em seus territórios. Através desses elementos fortalecem os laços identitários das comunidades e as estratégias coletivas de resistência e sobrevivência.
Pensando nisso a AS-PTA, por meio do programa de agricultura urbana junto com as mulheres da Serra da Misericórdia e dos Quilombos no Rio de Janeiro desenvolveram o primeiro ciclo da Oficina Saberes e Memórias, onde buscou-se registrar alguns dos valiosos compartilhamentos entre algumas dessas mulheres.
Foi realizado por meio de três encontros em que foram conectadas mulheres, jovens e griôs dos quilombos do Camorim, Cafundá Astrogilda e Dona Bilina – todos na zona oeste – e mulheres de favelas localizadas no sopé da Serra da Misericórdia, na zona norte da cidade. As experiências, os ensinamentos e histórias das mulheres que participaram da oficina são de quem luta por um ambiente saudável, pelo cuidado de si, da sua comunidade e da terra em que se planta e vive.
Como disse Rosilane de Almeida, do Quilombo do Camorim, a oficina foi um espaço de escuta e interação, “um berçário, onde podemos nos escutar e nos acolher”.
Que o resultado das oficinas possa também acolher quem recebe esse material em mãos. Que seja apenas uma semente plantada na terra preta e fértil da agricultura urbana do Rio de Janeiro.
“Que outras mulheres conectem esses saberes e memórias com novas ideias, grupos e pessoas. Que seja apenas uma semente plantada na terra preta e fértil da agricultura urbana do Rio de Janeiro” destacou Caroline Santana, assistente social e coordenadora da comissão pedagógica do projeto.
Boa leitura!
Boletim Mulheres, Jovens e Griôs conectando Quilombo e Favela