Elo entre passado, presente e futuro, centenas de sementes crioulas circularam na feira
Eram quase sete da manhã e as pessoas já começavam a chegar para preparar o café e montar as bancas da feira. Entre gorros e casacos para espantar um pouco o frio, um caloroso sentimento de animação pelo dia que estava por vir. Nas caravanas que continuaram a chegar ao longo da manhã, pessoas vindas de mais de 18 municípios do Paraná, além de Andradina, do estado vizinho de São Paulo.
A 10ª Feira Municipal de Sementes Crioulas e da Agrobiodiversidade de Palmeira, convocada pelo Coletivo Triunfo e suas organizações parceiras, foi o primeiro encontro deste ano na região Centro-Sul paranaense. A feira também integra o calendário de 2024 da Rede Sementes da Agroecologia (ReSA), com mais de 25 festas e feiras em todo o estado do Paraná.
“O que nos anima a vir e participar é encontrar as pessoas, se divertir, trocar variedades que não temos. Mesmo com esse frio vale a pena, muito!”, conta a agricultora Claudete Barboza Lorena. Certificada pela Rede Ecovida de Agroecologia, a família Barboza levou três variedades de cana-de-açúcar e duas de mandioca, verduras, sementes, além de flores e plantas ornamentais para comercializar na feira. Toda produção vem de casa, no Assentamento Palmares II, em Palmeira.
A banca de Claudete e sua família foi uma dentre as 90 bancas que ocuparam o estacionamento do Supermercado Franco, espaço que recebeu a feira. Quem pôde participar, viu um verdadeiro retrato da celebração da diversidade oriunda da agricultura familiar camponesa, indígena, quilombola e urbana. Para Miriane Serrato, assessora técnica do Programa Local Paraná da AS-PTA, “uma coisa que ficou muito evidente foi o protagonismo das mulheres como expositoras, elas se destacaram com a maioria das bancas. E o mais interessante é que quase todas participam de grupos, frisando a importância da coletividade”.
Cores, formatos e texturas vindas das centenas de espécies e variedades de sementes, de mudas de plantas medicinais, de flores, de árvores nativas e frutíferas, alimentos in natura e beneficiados, artesanatos e todo o conhecimento atrelado a essa produção. Conhecimento esse que é passado de geração em geração.
Por trás das bancas, a Rede de Famílias Guardiãs da Agrobiodiversidade, formada por agricultoras e agricultores, por gente de todas as idades, com diferentes trajetórias. Porém, que trazem o compromisso com a defesa da agrobiodiversidade como comum. Essa crescente rede é apoiada por organizações de base, tais como associações, cooperativas, sindicatos, grupos comunitários, além da sociedade civil e do Estado.
“A história foi gerada pelas mãos das famílias agricultoras, através da preservação das sementes crioulas e da Agrobiodiversidade em Palmeira” foi o lema escolhido pela comissão organizadora para a 10ª Feira Municipal. A cultura da região esteve presente através da valorização das tradições alimentares e apresentações de grupos do município. Além da animação da banda oficial das feiras da ReSA, a Banda Filhos da Mãe Terra.
Na tradicional gincana, a abóbora mais pesada veio de Teixeira Soares, do quintal da agricultora Michele Tavares, com pouco mais de 15 quilos. O agricultor Silvestre dos Santos, guardião da Casa de Sementes do Coletivo Triunfo, em Fernandes Pinheiro, foi o debulhador mais rápido de seis espigas de milho crioulo, da variedade Sol da Manhã. Já a mandioca mais comprida veio de Andradina, São Paulo, produzida pela agricultora Terezinha.
Antes de um dos momentos mais aguardados em todas as feiras de sementes, que é a partilha da mandala, foram abordados dois temas muito importantes para manter a agroecologia na boca do povo.
Uma homenagem ao Projeto Emergencial de Conservação e Multiplicação da Agrobiodiversidade no Paraná (PECMAP). Em uma parceria entre a Rede Sementes da Agroecologia (ReSA), o Ministério Público do Trabalho no Paraná (MPT-PR) e a AS-PTA, as sementes crioulas de cereais e hortaliças, mudas de plantas medicinais e ramas de tubérculos puderam circular no período da pandemia, entre os anos de 2021 e 2023. O projeto, apoiado pela então procuradora-chefe do MPT-PR, Margaret Matos de Carvalho, contribuiu expressivamente com a segurança alimentar e nutricional de milhares de famílias paranaenses, garantindo a produção de alimentos saudáveis e a preservação da agrobiodiversidade, além de gerar renda para as famílias agricultoras.
Com a proximidade das eleições municipais, que ocorrem em outubro deste ano, Ínes Polidoro, da ReSA, trouxe a importância da ativa participação popular na proposição de políticas públicas que promovam a agroecologia. Polidoro apresentou a campanha Agroecologia nas Eleições (AnE), uma iniciativa de incidência política da Articulação Nacional de Agroecologia (ANA). A ação tem como foco a mobilização das candidaturas em todo o país, para o planejamento e a execução de políticas públicas voltadas à garantia de direitos, como o direito à segurança alimentar e nutricional, direito à terra e território, à saúde, bem como o direito à comunicação.
“Essa feira foi marcada pela diversidade. Uma diversidade de produtos, de histórias e de sonhos que são trilhados pelas famílias do campo e da cidade, resultando em autonomia, geração de renda, de conservação da cultura e da Agrobiodiversidade”, finaliza Serrato. A próxima feira será em Teixeira Soares, dias 30 e 31 de agosto, as inscrições já estão abertas e podem ser feitas através das redes sociais do Coletivo Triunfo.