Projeto realizado em sete comunidades de sete municípios do Polo da Borborema está distribuindo mais de 7 mil mudas para rearborizar agroecossistemas familiares
No território da Borborema paraibana, sete comunidades começaram a receber mais de sete mil mudas para plantá-las nos seus quintais e em outros espaços da propriedade. São ‘bebês’ de árvores frutíferas, nativas da região, florestais e também de plantas medicinais, que estão sendo acomodados em diferentes espaços dos agroecossistemas familiares. O plantio é sincronizado com as chuvas tardias do inverno de 2021, que facilita a “pega” da árvore no solo.
Em cada comunidade, 20 famílias terão acesso às mudas. A iniciativa faz parte do projeto Borborema Agroecológica e trabalha com o conceito de ampliação da resiliência da agricultura familiar às mudanças climáticas a partir da gestão coletiva dos bens comuns, tanto naturais, quanto tecnologias sociais de convivência com o Semiárido e do conhecimento de técnicas de manejo e outros.
No território da Borborema, são múltiplos os fatores que contribuíram com o desmatamento. “As grandes fazendas para criação de gado ou aquelas de plantação de sisal, o incentivo da troca da Caatinga por pasto, a ocupação pela agricultura familiar e a fragmentação das propriedades pelas famílias que foram transformando a paisagem para se fazer a agricultura”, enumera Adriana Galvão, assessora técnica da AS-PTA. “Este último fator é bem preponderante”, destaca ela. Na Borborema, as propriedades são muito pequenas e, com o crescimento das famílias, aumenta-se ainda mais a pressão humana sobre os recursos naturais da região.
As oficinas – Antes da entrega das mudas das árvores e plantas, há todo um processo que provoca a reflexão nas famílias envolvidas no projeto. Tudo começa com uma fase de diagnóstico participativo sobre a gestão dos bens comuns e a leitura da realidade das comunidades e dos arredores de casa. “Promovemos um debate sobre o uso das árvores e a importância delas no enfrentamento das mudanças climáticas”, conta.
Na terça-feira (18), aconteceu a quinta oficina, que realizada em Areial. Apesar de presencial, as oficinas são realizadas respeitando uma série de medidas preventivas de segurança como um número reduzidos de participantes, uso obrigatório de máscaras e higienização constante das mãos. Já foram realizadas oficinas em Solânea, Alagoa Nova, Queimadas e Remígio. Em Esperança e Lagoa Seca serão feitas mais para frente, quando reduzir os índices de contaminação por Covid-19.
Roteiro metodológico – No processo de reflexão coletiva, uma das perguntas-chave feitas às famílias é: “A partir desta retirada das árvores, quais foram as principais mudanças que se percebem na comunidade?”
“Elas falam que antes o inverno era bom, que sabiam o dia exato de plantar o milho, que tinha muita água na cacimba, hoje secas, que havia muitos pássaros e bichos nas matas, que não tinham problemas com pragas nas lavouras”, enumera Cleibson dos Santos Silva, um dos três assessores técnico do Núcleo de Agrobiodiversidade e Juventude da AS-PTA.
Este Núcleo acompanha a Rede de Viveiristas, um coletivo dentro do Polo da Borborema, que está tendo um papel importante nesta ação, visto que sempre promoveu sensibilizações a respeito do papel das árvores dentro dos agroecossistemas e incentiva o plantio delas em diversas áreas da propriedade, seja nos espaços marginais, seja na (re)composição das matinhas.
No processo de reflexão, a próxima pergunta é: ‘Quais as estratégias que cada um tomou para enfrentar os problemas que surgiram com o desmatamento?’ E Cleibson cita que as famílias, a partir de suas leituras e observações, buscam rearborizar. E aí seguem várias formas de replantio das árvores: cercas vivas, que além de delimitar a área da propriedade, servem de barramento para o vento; cultivam campos de palmas consorciadas com plantas forrageiras; fortalecem os quintais onde tem a presenças das árvores frutíferas, medicinais e ornamentais, assim como reforçam os bosques com a diversificação de árvores nativas e exóticas de múltiplo-uso.
Neste momento, é puxado o fio que conduz o debate para o reconhecimento dos papéis das árvores e suas múltiplas funções. “Como a gliricídia, por exemplo. Os agricultores e agricultoras comentam que as ovelhas comem as folhas, mas que também servem de adubo para o solo e de quebra vento”, exemplifica Cleibson que também destaca a importância das plantas medicinais na vida das mulheres.
Com esse percurso feito, todo conhecimento vindo à tona a partir dos depoimentos das próprias famílias, é chegada a hora delas mesmas fazerem o planejamento do plantio das árvores nas suas propriedades.
“A distribuição dessas mudas tem dois pontos de partida, o primeiro é promover a diversificação produtiva dos quintais para ampliar a segurança alimentar das famílias. E o segundo é a diversificação e ampliação das estratégias de plantios de espécies forrageiras para estimular a formação de bancos de proteínas vegetais a partir de árvores como a gliricídea, a leucena e outras”, destaca Adriana.
Para estimular ainda mais a vontade dos/as participantes das oficinas, pessoas que plantam árvores nos seus espaços, desde 2010, são chamadas a dar depoimentos que, com certeza, fazem os corações dos/as ouvintes vibrarem: “Melhoria do solo, voltam a ver animais que não viam há 30 anos, reforço do sistema de criação de animais, criação de microclimas, ampliação da umidade do solo, aprimoramento da ecologia dos sistemas”, entre outras mudanças.
Para Maria do Céu Silva, uma das lideranças do Polo da Borborema e também da direção do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Solânea, avalia como muita positiva esta ação. “Cada vez que a gente vai na comunidade, que a gente faz o levantamento da área – de como está a agricultura e a Mãe Terra, os animais e tudo o que se tem – e a gente traz perspectivas e ações que vão melhorar e fortalecer o que já existe naquelas comunidades, as famílias ficam muito felizes. Inclusive, porque nós refletimos com elas.”
A Rede de Viveiristas – Em 2010, o Polo da Borborema já estimulava o replantio de árvores com ação direcionada para a produção e distribuição de mudas. Brigadas formadas por jovens e adultos iam para as matinhas dos municípios catar sementes para cultivá-las, gerar mudas e distribui-las. Em 2013, a Rede de Viveiristas passa a ser integrada também pelos jovens que tomaram gosto pela experiência. Nesta época, havia sete viveiros comunitários, que eram gestados de forma coletiva, em sete municípios.
Hoje, são quatro viveiros, sendo dois no município de Esperança, um em Alagoa Nova e outro em Solânea. Um dos viveiros de Esperança, o que se localiza na sede da AS-PTA, fornece mudas para todos os municípios do território e até para fora dele.
E a Rede de Viveiristas tem 30 jovens envolvidos na sua dinâmica. Cada um deles/as receberam um kit para produzir mudas e arborizar suas propriedades e também gerar renda, vendendo-as.
O Borborema Agroecológica – Iniciado em 2020, este projeto integra uma iniciativa mais ampla, que envolve oito países da América Latina, chamada INNOVA – Gestão de Conhecimento para a Adaptação da Agricultura Familiar ao Câmbio Climático. O INNOVA-AF tem o financiamento do Fundo Internacional para o Desenvolvimento Agrícola (FIDA), uma agência da ONU, e do Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura (IICA).
O Polo da Borborema é uma rede territorial de sindicatos rurais de 13 municípios, mais de 150 associações comunitárias, uma associação de produtores agroecológicos, a EcoBorborema, e uma cooperativa da agricultura familiar, que começou a operar no início de 2021, a CoopBorborema.