Nos dias 20 e 23 de novembro de 2023 acontecerá, na cidade do Rio de Janeiro/RJ, o XII CBA. Após um longo período de governos antidemocráticos e da pandemia de Covid-19, é chegada a hora de ocupar coletivamente os espaços públicos e de fazer ecoar nossa defesa das instituições públicas de ensino, pesquisa e extensão. No Brasil, onde as desigualdades têm se aprofundado, o campo agroecológico se vê diante de complexos desafios, seja de ordem social ou ecológica. Nessa ótica, a luta antirracista, a promoção da soberania e segurança alimentar e nutricional, a justiça climática e a defesa de uma ciência engajada e popular são temas centrais de debate do Congresso.
A partir de uma compreensão profunda sobre as transformações da agricultura no Brasil e no mundo, o espaço do XII CBA busca colocar em debate como a produção agrícola pautada na exportação de commodities têm acarretado ao longo de séculos a expulsão dos povos e comunidades tradicionais, a concentração de terras e de riquezas. Coloca-se em evidência como as relações coloniais atravessam a história do Brasil, constituindo um modelo de agricultura imerso em violências.
O XII CBA se coloca, assim, como espaço de tecitura de novas histórias, combinando tantos os aprendizados e acúmulos até aqui, vivenciados nos territórios, nos fazeres e resistências cotidianas, e nas instituições públicas de ensino, pesquisa e extensão, quanto lançando perspectivas de futuro e esperança. Um dos pontos centrais é como a diversidade biológica, social e cultural, é fundamental no enfrentamento do monocultivo das plantas, ideais e corpos, imposto pelo modelo da agricultura convencional.
A orientação baseada na simplificação de espécies e de saberes é parte do processo secular de colonização do Brasil. Da imensidão da Mata Atlântica ao olhar unívoco ao Pau-Brasil. Dos saberes dos povos indígenas à catequização. Do cuidado do território e das cosmovisões ao extrativismo do ouro, à mineração. Do policultivo das roças e das florestas semeados por quem aqui sempre habitou, as monoculturas de cana-de-açúcar, café, algodão. Do trabalho livre e coletivo à escravidão dos povos negros.
Associado à homogeneização das paisagens e das culturas, o ideário colonial coloca em prática a espoliação dos bens da natureza e das pessoas, sobretudo, as não-brancas, que podem ser utilizados até à exaustão por este modelo. Neste sentido, o que se identifica é como a diversidade de agriculturas, ou as práticas do co-cultivo entre plantas e pessoas, foi transformada de forma a atender a interesses específicos pautados no controle da terra e do território, na concentração de riquezas e no plantio cada vez mais especializado.
Colocando-se diante das mazelas produzidas por este modelo e como estratégia de ampliação do debate do campo agroecológico, o lema do XII CBA se traduz em “Agroecologia na Boca do povo”. A proposta política colocada pelo lema, envolve tanto fortalecer os sistemas de abastecimento popular de alimentos, destacando as redes de solidariedades constituídas nos territórios, quanto aprender com agricultoras/es e com os povos e comunidades tradicionais os múltiplos significados que a agroecologia possui, permitindo diálogos amplos com a sociedade. Nessa tessitura, o Congresso aponta, ao mesmo tempo, para as práticas científicas da agroecologia, entremeadas aos saberes cotidianos e dispostas a enfrentarem as desigualdades que atravessam nossa existência.
Em um período marcado pela pós-verdade, as fake news e o autoritarismo, o XII CBA é um convite ao exercício coletivo por uma ciência que tenha em sua episteme a promoção da justiça social. Denunciar os malefícios causados pelos transgênicos e agrotóxicos, a fome que assola 15% da população brasileira, a relação entre pandemias e agronegócio e, ao mesmo tempo, anunciar como desde os território se aprende a enfrentar e construir adaptações à crise climática, a defender a biodiversidade por meio do manejo de sementes crioulas e a cultivar alimentos diversos, é parte da produção do conhecimento da ciência da agroecologia e que tem encontro na 12ª edição do Congresso.
Aprendendo juntas e juntos e construindo o XII CBA
Com objetivo de fortalecer os debates e a produção coletiva de conhecimentos, o XII CBA receberá trabalhos em 16 eixos temáticos, tratando de temas como agricultura urbana, ancestralidade, comunicação, biodiversidade, soberania alimentar, políticas públicas, saúde, educação, feminismo e infâncias. Os trabalhos poderão ser enviados em 04 diferentes modalidades: Trabalho Técnico-Científico; Relato de Experiência Técnica; Relato de Experiência Popular, em texto; e Relatos de Experiência Popular, em vídeo. A proposta é que a conexão entre linguagens e narrativas diferentes fortaleça o diálogo de saberes, enchendo de vida as práticas de construção do conhecimento agroecológico.
Para aquecer nossos debates e partilha de experiências sobre sementes crioulas e biodiversidade, um chamado todo especial para envio de trabalhos para o eixo “Biodiversidade e conhecimentos dos Agricultores, Povo e Comunidades Tradicionais”, confira a ementa, envie seu trabalho e nos vemos logo.
Biodiversidade e conhecimentos dos Agricultores, Povos e Comunidades Tradicionais
Este eixo dedica especial atenção aos processos socioculturais e ecológicos de promoção da biodiversidade relacionada à agricultura, à saúde e à alimentação e para o importante papel da agricultura familiar, dos povos e comunidades tradicionais na geração, manejo, conservação e uso sustentável da diversidade biocultural. A preservação deste patrimônio ao longo das gerações tem sido viabilizada, em grande medida, pelo trabalho desenvolvido pelos guardiões e guardiãs da biodiversidade, em seu permanente esforço de manutenção, adaptação e enriquecimento da diversidade biológica e dos conhecimentos associados. No entanto, no cenário contemporâneo, diferentes fatores têm afetado negativamente a conservação, o manejo e o livre uso da biodiversidade, como o avanço dos transgênicos, dos agrotóxicos, dos grandes projetos de infraestrutura e a implantação de marcos regulatórios e mecanismos de cadastros, registros e patenteamento. Chama-se atenção especial ainda para o aprofundamento da crise climática e dos riscos irreversíveis de erosão da biodiversidade e dos conhecimentos a ela associados. Serão acolhidos neste eixo trabalhos que tenham como foco: i) identificação e valorização da biodiversidade manejada pela agricultura familiar, dos povos e comunidades tradicionais; ii) a conservação, resgate e manejo da biodiversidade, incluindo: sementes e mudas; raças de animais; plantas medicinais; plantas alimentícias não convencionais (PANC); iii) desafios da integração entre conservação in situ, on farm e ex situ; iv) processos de erosão genética e perda de conhecimentos e práticas relacionados à biodiversidade; v) biodiversidade e direitos dos agricultores e agricultoras; vi) desafios relacionados ao acesso e repartição de benefícios associados à biodiversidade; vii) ameaças ao livre uso da biodiversidade em âmbito territorial, nacional e global; viii) biodiversidade, áreas protegidas e direitos territoriais; xi) relações entre biodiversidade, mercados e alimentação; (x) serviços ecossistêmicos da biodiversidade; (xi) mitigação, adaptação e soluções baseadas na natureza para enfrentamento da crise climática; e (xii) programas e política públicas que fortalecem ou ameaçam os sistemas locais de conservação e uso da biodiversidade.