Quem esteve na 16ª Marcha pela Vida das Mulheres e pela Agroecologia, que ocupou as ruas de Esperança (PB) nesta quinta-feira (13/03), se deparou com uma diversidade de representações de outros estados nordestinos, reforçando a reivindicação pela regulamentação dos projetos eólicos instalados na região. Cerca de 6 mil pessoas estiveram no ato, que teve concentração e encerramento na Praça da Cultura e duração de quase 5 horas ininterruptas.
A mobilização costuma atrair um público de outros estados por ser a segunda maior marcha de mulheres do Brasil, mas a presença do povo indígena Kapinawá, de comunidades pescadoras e agricultoras impactadas pelas eólicas em seus territórios, reafirma a urgência de um modelo de geração de energia renovável que não devaste a caatinga e os modos de vida tradicionais.
“O que nós queremos é afirmar a importância que tem o território da Borborema na produção de alimentos, na construção da Agroecologia e da Convivência com o Semiárido. O Brasil precisa de uma legislação que regule como as empresas chegam nos territórios, que tem sido em forma de agressão e violação de direitos”, explica Roselita Victor, coordenadora do Polo da Borborema e integrante da coordenação da marcha.
Essas agressões e violações são descritas com detalhes na carta política da 16ª Marcha pela Vida das Mulheres e pela Agroecologia: “hoje ocupamos e compartilhamos as ruas com dezenas de famílias do nosso território que vivem ao lado do Parque Eólico Serra da Borborema. Essas famílias camponesas já vivem, há quase um ano, os assombros das explosões, das cisternas e casas rachadas, da mudança das estradas, do aumento do tráfego de pessoas e carros, do cercamento das áreas comuns, do arrendamento dos reservatórios de água, da fuga e a invasão dos animais silvestres”.
O cacique Robério Francisco Maia, do povo indígena Kapinawá (PE), conta que decidiu se somar à marcha “em defesa da vida”. Ele diz que, se for necessário, os kapinawá vão “andar o Brasil todo para juntar forças” para resistir contra a implementação de parques eólicos. “Viemos aqui na Paraíba pedir encarecidamente que os governantes se sensibilizem e vão até os territórios, sintam na pele o que as comunidades estão sentindo. É uma luta pela vida, pela vida das nossas matas, da mãe terra. Para garantir o futuro dos nossos curumins”, acrescenta.
Agricultora, sindicalista e representante do Rio Grande do Norte no Movimento dos Atingidos pelas Renováveis (MAR), Francisca Barbosa, faz questão de garantir que os impactos dos aerogeradores “não acontecem só no meu estado”. “Quando eles chegaram lá, eu já vivia, mas eles não querem saber disso. Eles chegam onde tem criança e idoso e simplesmente implantam aquilo ali. Não dizem qual é o malefício, todo tipo de doença. A gente está pedindo socorro. É para isso que a gente está aqui marcha, nos fortalecer e sair pronto para resolver”.
A marcha é uma realização das mulheres do Polo da Borborema, um coletivo de sindicatos rurais de 13 municípios do território da região paraibana, cerca de 150 associações comunitárias, uma associação de agricultores e agricultoras agroecológicos, a EcoBorborema, e uma cooperativa, a CoopBorborema.
Junto a elas, estão as mulheres da Articulação do Semiárido Paraibano (ASA Paraíba), da Articulação no Semiárido Brasileiro (ASA), Rede Feminismo e Agroecologia, Rede ATER Nordeste, do GT de Mulheres da Articulação Nacional de Agroecologia (ANA), do Movimento de Atingidos pelas Renováveis (MAR), do Movimento de Trabalhadoras e Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), da Federação dos Trabalhadores Rurais, Agricultores e Agricultoras Familiares do Estado da Paraíba (Fetag-PB) e da Confederação Nacional dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares (CONTAG).
Borborema é território de produção de alimentos (em números)
A região da Borborema (PB) é responsável pelo abastecimento de muitos produtos que chegam à mesa dos consumidores. Corresponde a 100% da produção de tangerina e de mudas de frutas cítricas do estado, além de 70% da produção de laranja, 45% de limão, 16% de banana. Também a 51% da produção de abacate, 58% de jaca e 81% de jabuticaba. É responsável por 52% da produção de folhosas, além de 68% de abobrinha, 56% de berinjela e 71% do pepino.
Além dessas, são cultivadas lavouras importantes: 36% da batata inglesa, 28% da fava, 63% do feijão preto e 59% dos feijões carioquinha e mulatinho e 12% do feijão macassar. A Borborema é a maior produtora de sementes de feijão da Paraíba. Com relação ao milho, a Borborema é responsável por 8,5% da produção do estado e se destaca pelo trabalho de resgate e conservação das sementes crioulas e o beneficiamento de milho livres de transgênicos.
Apesar da irregularidade das chuvas no ano de 2024, foram beneficiados com a marca agroecológica “Da Paixão”, cerca de 20 toneladas de produtos derivados de milho, dentre flocão, xerém, fubá e mungunzá. Esses produtos são destinados ao abastecimento das feiras agroecológicas, as feiras livres, as Quitandas da Borborema, o grande mercado consumidor de Campina Grande, e também de João Pessoa, Natal, Recife e até São Paulo.