Os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) representam um compromisso contundente de erradicar a pobreza, acabar com a fome, alcançar a segurança alimentar, promover a nutrição e uma agricultura sustentável e garantir que ninguém seja deixado para trás. A Agroecologia baseia-se no conhecimento agrícola tradicional e indígena e, quando realizada por camponeses, mostrou ser muito mais produtiva por hectare do que a monocultura industrial, do agronegócio. Portanto, tem um grande potencial para contribuir com os ODS.
Mas a Agroecologia não pode disseminar-se enquanto a terra continuar concentrada nas mãos de poucos investidores ricos e estrangeiros. São necessárias transformações estruturais urgentes e profundas, incluindo a verdadeira reforma agrária. É preciso também continuar defendendo, protegendo e mantendo os territórios sob controle de camponeses, pastores, mulheres indígenas, pescadores e povos das montanhas. É imperativo um modelo diferente de sociedade baseada na propriedade democrática dos recursos e na participação plena nas atividades econômicas. Vivenciei um processo desse tipo no Zimbábue, onde a reforma agrária tornou a terra mais produtiva e sustentável, aumentou a produção de alimentos para a economia local e nacional e ofereceu uma vida digna para as populações rurais empobrecidas.
A maioria das políticas dos governos africanos tende a privilegiar a agricultura industrial prescritiva, unidirecional, imposta de cima para baixo. As consequências têm sido catastróficas. É necessário, portanto, construir uma resiliência baseada na diversidade. A diversidade de alimentos baseada na diversidade de culturas, cultivadas pelo agricultor de pequena escala (o primeiro consumidor), é uma forma eficaz de combater a desnutrição. E encontramos essa possibilidade na Agroecologia porque os camponeses trabalham com a biodiversidade para experimentar e trocar conhecimento. A Escola de Agroecologia Sashe, administrada pelo Fórum de Pequenos Agricultores Orgânicos do Zimbábue, é um exemplo em que os agricultores aprendem com seus pares. Essa metodologia é eficaz, pois sabemos que os agricultores tendem a confiar nas coisas que aprendem de outros agricultores. Como parte de seu processo para promover a Agroecologia, a FAO deveria tirar proveito de seu poder institucional para influenciar a criação de políticas nacionais de apoio a tais espaços de aprendizado.
Torna-se também crucial um marco institucional e político que forneça os elementos fundamentais para a implantação da Agroecologia – acesso à terra, à água, ao crédito e à biodiversidade funcional crítica –, amparados por um sistema dinâmico de preservação de sementes camponesas para fornecer uma nutrição em quantidade suficiente e de qualidade adequada diante de um contexto de mudanças climáticas. Os recursos financeiros destinados à atividade agrícola não devem privilegiar os interesses do agronegócio, enquanto os camponeses e suas famílias sofrem com dívidas impossíveis de pagar. Esses recursos devem, isso sim, ajudar os camponeses, especialmente as mulheres.
É importante deixar claro que a Revolução Verde e a agricultura convencional não têm sido sustentáveis e que só serviram para aumentar as desigualdades sociais. A Agroecologia oferece a nossa melhor esperança de alcançar verdadeiramente os ODS, especialmente por contribuir para combater a fome e a pobreza. Ela fornece um modelo diferente de agricultura que assegura um bem- -estar econômico para agricultores familiares e suas comunidades, enquanto propicia a produção de alimentos saudáveis, suficientes e acessíveis a todos. Minha própria experiência no Zimbábue é um testemunho de que a Agroecologia apoiada pela reforma agrária pode ser um pilar fundamental do desenvolvimento sustentável.
Elizabeth Mpofu
([email protected]) é a Coordenadora Geral da Vía Campesina.
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Agriculturas V14,N1 – Agroecologia é a nossa melhor esperança para o desenvolvimento sustentável