A recusa do governo da Zâmbia de aceitar alimentos contaminados com transgênicos levantou uma celeuma que responde, no fundo, à estratégia das empresas que controlam estes controversos produtos.
É preciso saber que os produtos transgênicos produzidos nos Estados Unidos só se vendem porque não há rotulagem naquele país e porque o governo está compensando os agricultores com subsídios da ordem de 10 bilhões de dólares por ano e com compras destinadas à distribuição para ajuda alimentar aos países pobres.
Os alimentos transgênicos são o grande mico deste início de século e as empresas que os produzem, Monsanto, Syngenta e Dupont, entre outras menores, dependem da ajuda do governo americano para não serem varridas do mercado pela rejeição dos consumidores, inclusive americanos.
A ajuda alimentar já foi muito questionada como cínico instrumento de penetração de produtos e empresas em mercados dos países receptores, com perigosos efeitos locais. O mais evidente é a criação de padrões de consumo baseados em produtos de difícil produção nacional, como o trigo na África, por exemplo. Pior ainda é chantagear um país pobre, com uma crise social profunda e milhares de famintos, para que consumam alimentos que são rejeitados em todo o mundo. É simplesmente indecente!
Se o objetivo é ajudar os famintos e não desovar os estoques encalhados de produtos transgênicos americanos o que deve ser feito já é sabido há muito tempo. Muitas vezes o problema da fome não é falta de produção nacional mas falta de dinheiro para comprar alimentos. É o caso do Brasil, por exemplo. Em países pobres os governos não têm recursos para comprar alimentos e distribuí-los de graça e apelam para a ajuda internacional. Nestes casos, doar alimentos, transgênicos ou não, é contraproducente, pois vai arruinar os agricultores e engrossar o número de famintos. Seria preciso doar dinheiro para que os governos pudessem comprar produtos nacionais e distribuí-los.
Se há uma crise de produção nacional de alimentos e incapacidade dos governos de comprá-los nos mercados externos, mais uma vez a solução inteligente não é distribuir excedentes dos países ricos, mas ajudar a comprar os produtos da dieta básica do país em questão nos mercados regionais e internacional. Entupir um país africano com trigo e derivados é criar problemas para o futuro resolvendo o problema imediato.
Só em último caso, e por períodos tão curtos quanto possível, é que se deve aproveitar os excedentes dos países ricos como ajuda alimentar. A experiência internacional mostra que a fórmula, que parece óbvia, de doar o que sobra do norte para os famintos do sul é boa para o norte, mas cheia de problemas de longo prazo para o sul. E que não se diga que faminto não tem escolha, deve comer o que lhe derem! Se a intenção é ajudar e não resolver seus próprios problemas há, certamente, outras opções que impor alimentos ao sul que os consumidores do norte recusam-se a comer por considerá-los, certo ou errado, arriscados.
Jean Marc von der Weid, economista e coordenador da AS-PTA.