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POR UM BRASIL LIVRE DE TRANSGÊNICOS
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Boletim 220 – 06 de agosto de 2004
Car@s Amig@s,
na semana passada o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) divulgou uma nota com os resultados da fiscalização da produção de soja transgênica que realizou durante o primeiro semestre do ano. De acordo com o Ministério, foram fiscalizados no total 806 municípios em 14 estados. Das amostras coletadas, 296 (4%) acusaram a presença da soja transgênica. Desses casos, apenas 88 produtores haviam assinado o Termo de Compromisso e Ajustamento de Conduta (TAC), previsto na Lei 10.814/03, declarando terem plantado apenas as sementes transgênicas que eles mesmos multiplicaram. Ainda de acordo com o MAPA, 117 produtores não assinaram o termo, e é aqui que as omissões do Ministério começam a aparecer. Vejamos: 117 com 88 fazem 205. Para 296, que foi o número de amostras positivas, faltam 91. A conta não fecha. O que aconteceu nesses 91 casos? Além disso, segundo a nota do MAPA foram feitas 62 autuações, apesar de terem sido, pelo menos, 117 os casos ilegais. Nos 14 estados fiscalizados — o Ministério também não informou quais –, 83.558 produtores assinaram o Termo, sendo que 81.602 deles estavam no Rio Grande do Sul. Ou seja, praticamente 98% do plantio de soja transgênica nesta safra estavam concentrados no Rio Grande do Sul. No dia 28 de julho, a Campanha Por Um Brasil Livre de Transgênicos encaminhou ao MAPA um pedido de esclarecimento sobre os resultados e métodos adotados para a fiscalização, mas o que recebeu até o momento foi uma mensagem informando que a solicitação foi repassada ao Departamento de Defesa e Inspeção Vegetal. Embora incompletos e imprecisos, os dados “oficiais” nos permitem chegar a valores de área e volume de soja transgênica bastante diferentes daqueles amplamente divulgados pela imprensa e pelo próprio MAPA. Assumindo que as análises foram distribuídas igualmente entre os estados, 4% da soja nacional é transgênica. Exatamente a metade do valor até então divulgado. Isso equivale a cerca de 2 milhões de
toneladas. Se ainda considerarmos que toda essa produção de soja transgênica veio do Rio Grande do Sul, o que não está muito longe do real, e adotarmos a produtividade média para o estado divulgada pela Conab (Companhia Nacional do Abastecimento/MAPA), de 1.370kg de soja por hectare, chegamos a 1,46 milhão de hectares semeados com a soja transgênica. Menos da metade do valor divulgado pelo ISAAA (International Service for the Acquisition of Agri-biotech Applications) e adotado pela Abrasem (Associação Brasileira das Empresas de Sementes) e pelo próprio governo. Ainda pelos dados do Ministério, menos de 37% da soja do estado gaúcho é transgênica. A falta de números precisos e confiáveis é uma das principais armas usadas pelos setores pró-transgênicos. Ela tem duas funções: proteger seus produtos de avaliações de desempenho e de comparações com lavouras não-transgênicas, e dar espaço para que números inflados ganhem status de oficiais, reforçando a política do “fato consumado”. Não fosse por isso, por que os serviços públicos de pesquisa e extensão rural não acompanhariam o desenvolvimento dessas lavouras com o objetivo de extrair delas dados sobre produtividade, uso de herbicidas e outros insumos, resistência a pragas e doenças e custos de produção, de forma a tornar claro para agricultores e sociedade se os benefícios da biotecnologia anunciados pelas indústrias estão de fato se concretizando? Ao contrário, evita-se a produção desses dados. Tanto é que a para a divulgação da safra gaúcha de soja deste ano o governo simplesmente considerou que a soja transgênica tem a mesma produtividade que suas correspondentes convencionais. A Monsanto (empresa que desenvolveu as sementes que foram introduzidas ilegalmente no país), que alega que a soja Roundup Ready é mais produtiva que as variedades convencionais, não questionou a equiparação do desempenho de seu produto ao das sementes não modificadas pela biotecnologia. O Ministério da Agricultura comunica, mas não informa. Com isso reforça a política do fato consumado e a usa para convencer a sociedade, o Congresso Nacional e outros setores do governo sobre a necessidade de se liberar rapidamente os transgênicos. Se mais de 8% da produção nacional de soja estivessem contaminados com transgênicos e dispersos em vários estados, talvez o controle da situação não fosse tão trivial. Mas, com cerca de 4% da soja contaminada e concentrada em um único estado, o isolamento dessa produção apresenta-se mais factível. Ao invés de assumir uma postura clara e encaminhar soluções responsáveis ao problema, o governo titubeia e se expõe a pressões das indústrias e dos ruralistas, que insistem na edição de uma nova medida provisória autorizando por mais uma safra o plantio e a comercialização de soja transgênica sem que tenham sido realizadas as avaliações dos riscos deste produto para a saúde humana e o meio ambiente. Isso só daria mais corda aos que alegam que a situação é irreversível.
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Neste número:
1. Oposição à soja transgênica no Paraguai
2. Sri Lanka irá criar regras para a importação de OGMs
3. Responsabilidade por transgênicos na Alemanha
4. Controvérsias sobre o leite geneticamente modificado Sistemas agroecológicos mostram que transgênicos não são a solução para a agricultura Cafezal vizinho de floresta produz mais. Dica sobre fontes de informação Rede de ação sobre pesticidas e suas alternativas para a América Latina. http://www.rap-al.org
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1. Oposição à soja transgênica no Paraguai Representantes da Rede de Organizações Ambientais Não-Governamentais do Paraguai, da Rede de Ação em Pesticidas para América Latina (Rapal) e da ONG Sobrevivência manifestaram seu descontentamento com as intenções do Ministério da Agricultura e Pecuária liberar o cultivo da soja transgênica no país. Eles temem os resultados que podem sair das reuniões que estão sendo realizadas pelo Ministério, das quais as entidades ambientalistas não participam. Os representantes da sociedade civil lembraram que a comercialização das sementes no Paraguai está proibida de acordo com a Comissão Interinstitucional de Biossegurança, criada pelo Decreto 18.481/97, fixando que este órgão é a autoridade para as questões relacionados aos transgênicos. (…) As sementes são vendidas de forma ilegal no Paraguai, através de contrabando, desde de 1999. Nesse momento, segundo dados das organizações, 80% da produção nacional de soja é proveniente de sementes transgênicas. “A semente é ilícita, existe cumplicidade dos funcionários do Ministério da Agricultura na venda ilegal e a pressão da empresa norte-americana Monsanto é fortíssima”. Víctor Benítez, da Rede de Organizações Ambientalistas, sustenta que a intenção do Ministério da Agricultura é “branquear” o comércio ilegal de sementes transgênicas. “Oficialmente a venda está proibida, mas quase toda a produção nacional é transgênica. Agora buscam legalizar uma situação já desenvolvida (um fato consumado)”, acrescentou Benítez, dizendo que é impossível a venda das sementes sem a participação de sua proprietária, a Monsanto. (…) Outra manifestante, a engenheira Hebe González, assinalou que não cabe só ao Ministério da Agricultura decidir sobre o uso de transgênicos. “Para um tema fundamental para a saúde humana e para o meio ambiente deve-se conhecer a opinião do Ministério da Saúde, assim como da Secretaria de Meio Ambiente, as quais também devem decidir sobre a intenção de liberar o comércio de sementes geneticamente modificadas”. González ainda lembrou a posição do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), que sustenta “a possibilidade de que genes modificados passem descontroladamente de uma espécie à outra é um risco real que poria em perigo a biodiversidade, que é fundamental para a segurança alimentar da humanidade”. (…) As entidades solicitam ao Ministério da Agricultura uma moratória sobre a liberação dos transgênicos “de acordo com o direito que o país tem de rechaçar tecnologias consideradas de risco ou que não apresentem avaliações científicas suficientes sobre os efeitos a longo prazo”. Outra proposta é a rotulagem obrigatória de produtos e alimentos transgênicos, visto que o consumidor paraguaio recebe atualmente uma grande quantidade de sucos de soja consumidos em grande parte por crianças (…). http://www.abc.com.py/articulos.php?fec=2004-07-30&pid=125008&sec=5, 30/07/2004.
2. Sri Lanka irá criar regras para a importação de OGMs O ministro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais do Sri Lanka, A. H. M. Fowzie, destacou a importância da introdução de um Sistema Regulatório para controlar a entrada de Organismos Geneticamente Modificados (OGMs) e dos Alimentos Geneticamente Modificados no país. (…) Sediando um evento sobre segurança ambiental, o ministro alertou que com a globalização, os organismos geneticamente modificados, gêneros alimentícios, rações e produtos processados, incluindo produtos farmacêuticos e nutricionais (…), estão sendo livremente importados para o país. Referindo-se ao Projeto para o Desenvolvimento de um Sistema Nacional de Biossegurança, do seu ministério, disse que o Sri Lanka foi forçado a implementar artigos do Protocolo de Cartagena na forma de um Sistema Nacional para Biossegurança com referência às importações de OGMs, gêneros alimentícios e produtos processados derivados de OGMs. Fowzie enfatizou a necessidade de se adotar medidas de precaução antes da importação e introdução de produtos transgênicos e seus derivados no mercado, em face da possibilidade de riscos à saúde, que as importações não programadas e não avaliadas podem impor. As vantagens dos transgênicos são mínimas (…). Mas as desvantagens são grandes, tais como riscos à saúde da população, à biodiversidade, aos organismos não alvo, à estabilidade econômica e social da agricultura local, assim como às questões éticas e morais, incluindo o patenteamento de material biológico. O ministro acrescentou ainda que é fundamental o estabelecimento de uma abordagem institucional de avaliação de riscos que garanta a participação da sociedade nos processos de tomadas de decisão. www.dailynews.lk/2004/07/27/new20.html, 27/07/2004.
3. Responsabilidade por transgênicos na Alemanha Depois de muito adiar, a Alemanha implementou em suas leis nacionais, no dia 18 de junho, uma versão mais restritiva da diretriz européia 2001/18, que regulamenta o uso comercial de cultivos transgênicos. A ministra da agricultura e da proteção do consumidor, Renate Künast, do Partido Verde, disse que as novas regras irão proteger os plantios convencionais e orgânicos da “contaminação” pelos plantios transgênicos. De acordo com as novas regras, os agricultores são responsáveis por qualquer dano ou prejuízo causados pelas plantações geneticamente modificadas — uma medida que também existe na lei dinamarquesa. A nova lei alemã está indo além do requerimento das diretrizes, observa Damien Plan, Supervisor dos Assuntos Públicos e Governamentais da BayercropScience, em Bruxelas. Ele teme que essa medida crie um “precedente” que possa limitar o cultivo comercial dos transgênicos na Europa se outros países seguirem o exemplo alemão. A lei também exige que seja criado um registro central com a localização de todas as plantações geneticamente modificadas no país. O pedidos para cultivo devem ser feitos com três meses de antecedência. (…) Nature Biotechnology 22, 935 – 937 (2004).
http://www.nature.com/cgi-taf?file=/nbt/journal/v22/n8/full/nbt0804-935.html, 27/07/2004.
4. Controvérsias sobre o leite geneticamente modificado A corte Alemã proibiu o Greenpeace de usar o termo “leite geneticamente modificado” para descrever os produtos da Theo Müller, uma fábrica de laticínios situada na Bavária e estabelecida em cinco países da Europa, que alimenta suas vacas com rações transgênicas. A corte avaliou que o leite, os ovos e a carne dos animais alimentados com cultivos OGMs não podem ser rotulados como alimentos geneticamente modificados, de acordo com a nova legislação européia — também adotada por países não europeus como fez a Suíça em junho. No dia 02 de junho, a Theo Müller entrou com uma ação contra a campanha do Greenpeace contra seus produtos. O Greenpeace espalhou cartazes nos supermercados com os dizeres “Leite transgênico: não toque!”, exibindo os produtos da empresa. A ação foi motivada por um estudo de 2001 que identificou traços de transgênicos nos laticínios. Cientistas criticaram o estudo alegando que não há evidências de que o leite produzido por vacas alimentadas com transgênicos contenha resíduos destes. O Greenpeace irá pagar uma multa de US$ 304 mil e os ativistas podem ser presos se a organização violar a decisão. O Greenpeace irá recorrer da sentença. Klaus-Dieter Jany, do Centro Federal de Pesquisa para Nutrição e Alimentação em Karlsruhe, alerta que a indústria de alimentos deve se preocupar cada vez mais com o uso de rações transgênicas para evitar repercussões negativas entre os consumidores. Nature Biotechnology 22,935-937 (2004), 27/07/2004. http://www.nature.com/cgi-taf/Dynapage.taf?file=/nbt/journal/v22/n8/full/nbt0804-935.html
Sistemas agroecológicos mostram que transgênicos não são a solução para a agricultura
Cafezal vizinho de floresta produz mais Estudo realizado na Costa Rica estima em 20% aumento na colheita, causado pela ação de insetos polinizadores A presença de florestas tropicais na vizinhança de áreas agrícolas pode ser lucrativa, além de ecologicamente correta. Para uma fazenda de café na Costa Rica, o benefício foi estimado em cerca de US$ 60 mil, por conta do aumento da produtividade nos cafezais provocado pelos insetos que habitam a mata. A estimativa foi feita por um grupo de cientistas americanos. É a primeira vez que um experimento calcula o valor do serviço ambiental de polinização, realizado por abelhas silvestres. A conclusão dos pesquisadores é que vale a pena pagar por ele. Serviços ambientais são valores agregados pela natureza a uma dada atividade econômica, mas que não costumam entrar nas contas da economia por não terem seu valor estabelecido ou mercado em que possam ser comercializados. É difícil calcular, por exemplo, quanto vale a reciclagem de nutrientes realizada por microrganismos no solo, ou a proteção de um manancial por uma mata ciliar. O estudo liderado por Taylor Ricketts, pesquisador da Universidade de Stanford e do WWF (Fundo Mundial para a Natureza) e publicado ontem no periódico “PNAS”, da Academia Nacional de Ciências dos EUA (www.pnas.org), criou um artifício para fazer esse cálculo no caso da polinização. O grupo mediu a produtividade de cafeeiros em uma fazenda de 1.065 hectares no Vale Geral da Costa Rica, e constatou que plantas num raio de 1 km de um fragmento de floresta nativa produziam 20% mais grãos. A polinização (transporte de pólen de uma flor para a outra que fertiliza a planta) realizada pelos insetos da floresta também era mais eficiente: a quantidade de sementes mal formadas nesses cafeeiros foi 27% menor. Para poder comparar a eficiência da polinização pelas abelhas silvestres, o grupo de Ricketts — integrado também por Paul Ehrlich e Gretchen Daily, de Stanford, dois pioneiros no estudo do valor dos serviços ambientais — polinizou manualmente alguns ramos das plantas. O aumento de 20% na produtividade dos cafeeiros próximos à floresta correspondeu a US$ 61.716, ou 7% dos resultados da fazenda. Ricketts defende que esse valor seja pago aos proprietários da área florestada, adjacente à fazenda, como compensação e incentivo para conservar a mata. “O nosso ponto é ilustrar que a floresta é valiosa, e que os proprietários precisam capturar esse valor”, afirmou o pesquisador à Folha, por telefone. Ricketts defende também que os agricultores restaurem as florestas em suas fazendas, mas dentro de um limite. “Os benefícios superam os custos até uma certa área.” Segundo ele, em plantações com menos de 50 hectares o aumento da produção não compensa a perda em área plantada. Folha de São Paulo, 04/08/2004.
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