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POR UM BRASIL ECOLÓGICO,
LIVRE DE TRANSGÊNICOS & AGROTÓXICOS
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Novo estudo evidencia diferenças moleculares entre milho convencional e transgênico
Número 659 – 17 de janeiro de 2014
A revista científica Proteome Science, classificada entre as seis melhores publicações da área proteômica, publicou em dezembro de 2013 uma pesquisa que evidencia diferenças moleculares entre organismos geneticamente modificados e seus respectivos convencionais. O artigo foi produzido por uma equipe de pesquisadores da Universidade Federal de Santa Catarina e foi destacado pelos editores da revista dentre os mais interessantes na área de espectrometria de massas.
Sua grande contribuição é contestar o principal conceito (pseudo)científico utilizado para justificar a liberação dos transgênicos: a chamada “equivalência substancial”. Segundo essa teoria, as plantas transgênicas são equivalentes em sua composição química às plantas convencionais e assim, por princípio, não apresentam riscos. O conceito foi criado pelo órgão do governo dos EUA responsável pela regulamentação de alimentos e medicamentos (o FDA – Food and Drug Administration) depois que um ex-advogado da Monsanto assumiu o cargo de “deputy commissioner for policy” (uma espécie de conselheiro para políticas), especialmente criado para ele. O método é bastante vago e não especifica os níveis de similaridade entre a composição química das plantas que permitem que elas sejam consideradas “equivalentes”, mas mesmo assim garantiu a liberação dos transgênicos nos EUA e depois em outros países, sendo até hoje utilizado (inclusive pela CTNBio – Comissão Técnica Nacional de Biossegurança) para justificar a não realização de estudos aprofundados para avaliação de riscos das novas plantas.
O artigo “Comparative proteomic analysis of genetically modified maize grown under different agroecosystems conditions in Brazil” mostrou diferenças entre o milho convencional e o milho transgênico da Monsanto MON810, do tipo Bt (modificado para produzir toxinas inseticidas e matar as lagartas que dele se alimentam). Os experimentos foram conduzidos em dois agroecossistemas distintos, nos municípios catarinenses de Campos Novos e Chapecó. Os pesquisadores encontraram 16 proteínas diferentes entre os dois tipos de milho em cada local de cultivo (32 proteínas diferentes no total) – ou seja, as diferenças são altamente dependentes do ambiente e por isso são ainda mais difíceis de serem previstas, sendo que as evidências sugerem que o milho convencional é mais estável, ou seja, varia menos em relação ao milho GM nos diferentes ambientes. As funções moleculares dessas proteínas foram atribuídas principalmente ao metabolismo energético, metabolismo de resposta da planta, metabolismo de processamento de informação genética e metabolismo de estresse.
Cada uma dessas proteínas diferentes encontradas poderia causar uma alteração em uma rota metabólica ou uma interação dentro da célula, que por sua vez poderia gerar novas características nas plantas, com possíveis efeitos sobre a saúde humana/animal ou o meio ambiente.
Essas diferenças no proteoma das plantas não representam risco em si, mas são uma indicação de que pode haver riscos e que estes devem ser confirmados por técnicas adequadas, que atualmente não são utilizadas nas avaliações dos OGMs.
O novo estudo constitui mais uma prova de que estamos cultivando e consumindo em larga escala uma tecnologia que não foi testada de maneira completa e rigorosa e que, além de apresentar importantes riscos já tornados evidentes a partir de pesquisas independentes realizadas nos anos recentes, pode envolver ainda outros vastamente desconhecidos.
O artigo Comparative proteomic analysis of genetically modified maize grown under different agroecosystems conditions in Brazil pode ser baixado na íntegra e gratuitamente no site revista Proteome Science.
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Neste número:
1. Qual a quantidade que cada pessoa pode consumir de agrotóxico?
2. Pesquisadores alertam para expansão de transgênicos e agrotóxicos no Brasil
3. Tribunal da União Europeia anula aprovação da batata transgênica Amflora, da Basf
4. Tasmânia proíbe organismos geneticamente modificados
5. Seminário de 10 anos de Liberação dos Transgênicos no Brasil – Carta Política
A alternativa agroecológica
Mais sustentáveis, sementes crioulas conquistam agricultores do Nordeste
Dica de fonte de informação
“A natureza reage às monoculturas”, excelente entrevista do agrônomo Leonardo Melgarejo, representante do Ministério do Desenvolvimento Agrário na CTNBio, à revista Superinteressante – publicada em 18/12/2013.
“(…), as tecnologias BT e HT [os dois tipos de transgênicos plantado comercialmente] se associam à expansão no uso de agrotóxicos e na transição de produtos para venenos cada vez mais tóxicos. Os grandes números mostram evidências claras neste sentido. Três a quatro anos após a liberação comercial das PGMs [plantas geneticamente modificadas] a natureza reage, os agricultores ampliam os volumes de agrotóxicos utilizados, novas PGMs são lançadas, e assim sucessivamente.”
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1. Qual a quantidade que cada pessoa pode consumir de agrotóxico?
Ao entrar em um supermercado e caminhar entre frutas, verduras e legumes, é possível que você já tenha notado gôndolas destinadas apenas a alimentos orgânicos, que, dentre outras coisas, são cultivados sem o uso de agrotóxicos – assunto que vem ganhando destaque ao longo dos últimos anos no Brasil.
As atenções dos holofotes direcionam-se a constatações como a da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco): um dos maiores problemas no Brasil é o uso de muitos princípios ativos que já foram banidos em outros países. De acordo com um dossiê da Associação, dos 50 produtos mais utilizados nas lavouras brasileiras, 22 são proibidos na União Europeia, o que faz com que o país seja o maior consumidor de agrotóxicos já banidos em outros locais do mundo. “Quando um produto é banido em um país, deveria ser imediatamente em outros. Quando chega ao Brasil para fazer o banimento é um luta enorme das entidades sanitárias”, diz a médica toxicologista Lia Giraldo, da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz/ Ministério da Saúde).
Em 2011, uma pesquisa conduzida pela Universidade Federal do Mato Grosso (UFMT) em parceria com a Fiocruz comprovou que até mesmo o leite materno pode conter resíduos de agrotóxicos. O estudo coletou amostras em mulheres do município de Lucas do Rio Verde/MT, um dos maiores produtores de soja do país. Em 100% delas foi encontrado ao menos um tipo de princípio ativo. Em algumas, até 6 tipos.
Hoje, é difícil dissociar safras recordes e indústria química, responsável pela fabricação de herbicidas, inseticidas e fungicidas que matam e controlam a disseminação de plantas daninhas, insetos e fungos nas plantações. Só em 2012, 185 milhões de toneladas de grãos foram colhidas no Brasil. Números tão expressivos se justificam para além das extensões continentais do território brasileiro. Um sem-fim de opções tecnológicas para evitar perdas de produção está disponível aos agricultores. Dentre elas, mais de 1.640 agrotóxicos registrados para uso.
Um dos pontos importantes do processo político de incentivo ao uso de venenos no Brasil aconteceu na época do regime militar, quando, em 1975, foi instituído o Plano Nacional de Defensivos Agrícolas, que condicionava a obtenção de crédito rural pelos agricultores ao uso dos produtos químicos nas lavouras. “Foi também nesta época que apareceram as primeiras denúncias de contaminação de alimentos e intoxicação de trabalhadores rurais”, explica engenheiro agrônomo e consultor ambiental Walter Lazzarini, que teve participação ativa na formulação da Lei dos Agrotóxicos brasileira (7.802) em 1989.
A lei vigora até hoje, com algumas mudanças no texto original. O gargalo, porém, fica visível no cumprimento do que prevê a legislação. “Existe um descompasso entre a regra e os mecanismos para cumpri-la. O país investe menos do que deveria em fiscalização e monitoramento”, comenta Decio Zylbersztajn, professor e criador do Centro de Conhecimento em Agronegócios da FEA/USP.
Um estudo da USP revela que, entre 1999 e 2009, o Sistema Nacional de Informações Tóxico-Farmacológicas (Sinitox) registrou 62 mil intoxicações por agrotóxico no país – uma média de 15,5 por dia. Apesar de altos, os números não refletem totalmente a realidade, já que projeções do próprio Sistema indicam que para cada caso de intoxicação notificado, 50 acabam no desconhecimento. “Faltam dados de registro das intoxicações para suportar a necessidade de uma política de fiscalização na aplicação”, alerta Lazzarini.
A repercussão dos números levanta debates entre movimentos civis e órgãos regulatórios. Aumentar a rigidez das fiscalizações e proibir o uso dos produtos químicos já banidos em outros países são algumas das exigências da Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e Pela Vida, que reúne entidades, organizações civis e comunidade científica em Comitês Populares presentes em quase todos os estados brasileiros. Outra proposta da Campanha é a rotulação dos produtos alimentícios com as informações sobre os agrotóxicos utilizados.
Saúde é quantificável?
Para a aprovação de novos agrotóxicos, são obrigatórios estudos conduzidos em animais de laboratório, que supostamente indicam a quantidade máxima de resíduos que uma pessoa pode consumir por dia. É o IDA: Índice Diário Aceitável.
De acordo com a Anvisa, a ingestão dentro do índice não causa dano à saúde. Mas a médica Lia Giraldo contesta a sua eficiência, uma vez que os testes não levam em conta concentrações prolongadas, mesmo que baixas. “Criou-se uma teoria de que o efeito é decorrente da quantidade e não do produto, das reações químicas. É uma teoria científica muito linear, dose-efeito, como se tudo dependesse só da quantidade. Essa ideia ainda está vigente na regulamentação”, explica. “O que se faz para aceitar os agrotóxicos no mercado são estudos experimentais em animais que tem vida muito curta. Não há tempo para eles desenvolverem as doenças crônicas degenerativas que os humanos manifestam por viverem mais”.
A intoxicação crônica, que se desenvolve ao longo de meses, anos ou até décadas, pode levar a doenças hepáticas e renais, câncer, malformação congênita, problemas de fertilidade, reprodução, além de distúrbios neurológicos, mentais e endócrinos. “Considero que os indicadores fazem uma inversão de complexidade. É anticientífico. Um ser humano é diferente do outro, cada organismo vai manifestar as alterações na sua singularidade. A saúde plena não pode ser garantida, mesmo se o indicador for respeitado”, diz Lia.
Um exemplo: o índice chega a um valor que permite que as pessoas comam um tomate e não morram intoxicadas. “Mas isso não quer dizer que se você comer um tomate todos os dias ao longo de anos você não desenvolva um câncer”, explica a médica. “Não existe quantidade ‘menos pior’. Temos que ser críticos. Há uma convenção baseada em um indicador que não tem sustentabilidade científica, embora se utilize de uma determinada ciência pra justificar sua existência”.
Além disso, analisar e identificar os efeitos combinados de diferentes substâncias químicas, em situações distintas de exposição (ar, água, solo, alimentos), são verdadeiros desafios para a ciência chegar a números que possam ser considerados seguros. “No cozimento quanto é degradado e se transforma em outras substâncias que podem ser até mais tóxicas? O ideal é garantir que não tenha resíduos, e pra isso seria necessário não ter agrotóxicos”.
Leonardo Melgarejo, engenheiro agrônomo que representa o Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) na Comissão Nacional de Biossegurança (CTNBio), também defende que “é equivocado supor que pequenas doses de veneno devem ser aceitas nos alimentos porque causam pequenos danos”. Para ele, a alternativa é buscar produtos orgânicos, que devem (e podem) ser disponibilizados para todos. “A produção em policultivo é maior por unidade de área, mais intensiva em mão de obra e menos demandante de insumos externos. Com ela é possível gerar ocupações produtivas, ampliar a oferta de alimentos e minimizar riscos de intoxicação, custos com a saúde”. (Leia a entrevista com Leonardo Melgarejo na íntegra no post anterior).
Lavar os alimentos resolve?
Na verdade, a prática é importante apenas para higienizá-los, mas não retira os produtos químicos, já que os resíduos circulam nos tecidos vegetais pela seiva. “O agrotóxico é utilizado por todo o ciclo da produção e atinge a planta sistemicamente”, explica a médica.
A Anvisa também alerta que mesmo os chamados agrotóxicos “de contato”, que agem externamente no vegetal, podem ser absorvidos pelas porosidades da planta. A Agência aconselha que produtos in natura devem vir de fornecedores qualificados pelo cumprimento das Boas Práticas Agrícolas, como o respeito ao período de carência (intervalo entre a aplicação do agrotóxico e a colheita).
Este texto é um complemento à reportagem “Comida Química”, publicada na edição verde da Superinteressante, que está nas bancas este mês.
Superinteressante, 19/12/2013
2. Pesquisadores alertam para expansão de transgênicos e agrotóxicos no Brasil
O pedido para a liberação de sementes transgênicas de soja e milho resistentes ao herbicida 2,4-D esquentou o debate sobre a regulamentação de plantas geneticamente modificadas e agrotóxicos na agricultura brasileira.
Pesquisadores e o Ministério Público Federal (MPF) solicitaram em dezembro à Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio), encarregada de analisar pedidos de vendas de transgênicos, que suspendesse os trâmites para a autorização das sementes tolerantes ao 2,4-D, um herbicida usado contra ervas daninhas que consideram nocivo à saúde.
Eles dizem que a liberação desses transgênicos poderá multiplicar de forma preocupante o uso do 2,4-D no Brasil.
Paralelamente, cobram maior rigor dos órgãos reguladores na liberação tanto de agrotóxicos quanto de transgênicos e alertam para a associação entre esses dois produtos no país.
Segundo o Ministério do Meio Ambiente, o Brasil é hoje o maior consumidor global de agrotóxicos. O mercado brasileiro de transgênicos também é um dos maiores do mundo. De acordo com a consultoria Céleres, quase todo o milho e a soja plantados no país hoje são geneticamente modificados.
Especialistas ouvidos pela BBC Brasil dizem que a expansão dos transgênicos estimulou o mercado de agrotóxicos no país, já que grande parte das sementes geneticamente alteradas tem como principal diferencial a resistência a venenos agrícolas. Se por um lado essa característica permite maior controle de pragas, por outro, impõe riscos aos consumidores, segundo os pesquisadores.
Agente laranja
No centro do debate, o herbicida 2,4-D é hoje vendido livremente no Brasil e utilizado para limpar terrenos antes do cultivo.
Pesquisadores dizem que estudos associaram o produto a mutações genéticas, distúrbios hormonais e câncer, entre outros problemas ambientais e de saúde. O 2,4-D é um dos componentes do agente laranja, usado como desfolhante pelos Estados Unidos na Guerra do Vietnã.
O MPF pediu à Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) que acelere seus estudos de reavaliação da licença comercial do 2,4-D. O órgão quer que o resultado da reavaliação da Anvisa, iniciada em 2006, embase a decisão da CTNBio sobre os transgênicos resistentes ao produto.
Já a Dow AgroSciences, que fabrica o agrotóxico e é uma das empresas que buscam a liberação dos transgênicos associados a ele, diz que os produtos são seguros. Em nota à BBC Brasil, a empresa afirma que “o 2,4-D é um herbicida que está no mercado há mais de 60 anos, aprovado em mais de 70 países”. (…)
Agrotóxicos combinados
O pedido para a liberação das sementes resistentes ao 2,4-D reflete uma prática comum no mercado de transgênicos: a produção de variedades tolerantes a agrotóxicos. Geralmente, assim como a Dow, as empresas que vendem esses transgênicos também comercializam os produtos aos quais são resistentes.
“É uma falácia dizer que os transgênicos reduzem o uso de agrotóxicos”, afirma Karen Friedrich, pesquisadora e toxicologista da Fiocruz.
Friedrich cita como exemplo a liberação de soja transgênica resistente ao agrotóxico glifosato, que teria sido acompanhada pelo aumento exponencial do uso do produto nas lavouras.
Caso também sejam liberadas as sementes resistentes ao 2,4-D, ela estima que haverá um aumento de 30 vezes no consumo do produto.
Segundo a pesquisadora, o 2,4-D pode provocar dois tipos de efeitos nocivos: agudos, que geralmente acometem trabalhadores ou pessoas expostas diretamente à substância, causando enjôo, dor de cabeça ou até a morte; e crônicos, que podem se manifestar entre consumidores muitos anos após a exposição a doses pequenas do produto, por meio de alterações hormonais ou cânceres.
O médico e professor da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT) Wanderlei Pignati, que pesquisa os efeitos de agrotóxicos há dez anos, cita outra preocupação em relação aos produtos: o uso associado de diferentes substâncias numa mesma plantação.
Ele diz que, embora o registro de um agrotóxico se baseie nos efeitos de seu uso isolado, muitos agricultores aplicam vários agrotóxicos numa mesma plantação, potencializando os riscos.
Pignati participou de um estudo que monitorou a exposição a agrotóxicos pela população de Lucas do Rio Verde, município mato-grossense que tem uma das maiores produções agrícolas do Brasil.
A pesquisa, diz o professor, detectou uma série de problemas, entre os quais: desrespeito dos limites mínimos de distância da aplicação de agrotóxicos a fontes de água, animais e residências; contaminação com resíduos de agrotóxico em todas as 62 das amostras de leite materno colhidas na cidade; e incidência 50% maior de acidentes de trabalho, intoxicações, cânceres, malformação e agravos respiratórios no município em relação à média estadual nos últimos dez anos.
O pesquisador defende que o governo federal invista mais no desenvolvimento de tecnologias que possam substituir os agrotóxicos – como o combate de pragas por aves e roedores em sistemas agroflorestais, que combinam a agricultura com a preservação de matas.
Já a Confederação Nacional da Agricultura e Pecuária (CNA) diz que os agrotóxicos (que chama de produtos fitossanitários) são imprescindíveis para proteger a agricultura tropical de pragas e ervas daninhas, assim como para aumentar a produtividade das lavouras. (…)
BBC Brasil, 10/01/2014
3. Tribunal da União Europeia anula aprovação da batata transgênica Amflora, da Basf
Segundo tribunal, Comissão Europeia quebrou regras ao aprovar o produto
A Basf parou de produzir a Amflora na Europa em 2012
Decisão lança mais dúvidas sobre regras de aprovação de OGMs na Europa
O segundo mais alto tribunal europeu derrubou em 13 de dezembro de 2013 uma decisão da Comissão Europeia que permitia o cultivo e a venda de uma batata transgênica desenvolvida pela Basf. Segundo o tribunal, a Comissão Europeia não havia cumprido as regras do bloco quando aprovou o produto, que foi geneticamente modificado para produzir amido extra para uso pela indústria de papel.
Se por um lado a Amflora já não é mais cultivada na Europa (a Basf desistiu do produto em 2012 alegando oposição à tecnologia), a decisão levanta novas preocupações a respeito do complexo e altamente criticado sistema europeu para aprovação de lavouras transgênicas. (…)
A surpreendente aprovação da Amflora foi uma das primeiras decisões tomadas pelo então comissário de saúde da União Europeia, John Dalli, que assumiu o cargo em fevereiro de 2010. Dalli foi forçado a renunciar da Comissão no último ano depois de ter sido relacionado a um escândalo de suborno sobre tabaco.
A Amflora foi o segundo produto transgênico a ser aprovado para cultivo na Europa e sua liberação provocou forte reação de ativistas ambientais e grupos de consumidores que se opõem à tecnologia. A aprovação também levou a Hungria a questionar legalmente a decisão, em processo que foi apoiado por outros países europeus que se opõem aos transgênicos, incluindo a França, a Áustria e a Polônia. (…)
Atualmente o único transgênico cultivado comercialmente na Europa é o milho inseticida MON810, da Monsanto – cerca de 100 mil hectares, principalmente na Espanha (área irrisória comparada com os estimados 170 milhões de hectares plantados com lavouras transgênicas globalmente, principalmente nas Américas e em partes da Ásia). (…)
Reuters, 13/12/2014.
4. Tasmânia proíbe organismos geneticamente modificados
Moratória aprovada em 2011 foi estendida por prazo indeterminado.
Objetivo é proteger a indústria agrícola e a pecuária.
O governo da ilha da Tasmânia, na Austrália, anunciou nesta quinta-feira (9) que estenderá indefinidamente a proibição a cultivos e a animais geneticamente modificados para proteger a indústria agrícola e a pecuária da região.
O subchefe do governo de Tasmânia, Bryan Green, disse em comunicado que a ilha manterá vigente a moratória aos organismos geneticamente modificados que foi aprovada em 2001.
“Não haverá uma data para o fim desta moratória para dar aos negócios da Tasmânia um incentivo positivo para investir em marketing e no desenvolvimento da marca para aproveitar ao máximo o potencial das oportunidades, já que este é um estado livre de organismos geneticamente modificados”, disse Green.
O subchefe do governo regional afirmou que a moratória prevê como exceção o uso de organismos modificados no cultivo de papoulas para uso farmacêutico.
Os outros organismos modificados, sejam vegetais ou animais, continuarão proibidos na Tasmânia, exceto para seu uso em pesquisas genéticas para o desenvolvimento de tratamentos e remédios para humanos.
G1 (da EFE), 09/01/2014.
5. Seminário de 10 anos de Liberação dos Transgênicos no Brasil – Carta Política
Por um Brasil ecológico, livre de transgênicos e sem agrotóxicos! O CFN apoia o conteúdo da carta política que traz o posicionamento dos participantes do Seminário 10 anos de Liberação dos Transgênicos no Brasil, realizado entre os dias 21 e 24 de outubro de 2013, em Curitiba. Estiveram no encontro camponeses, representantes de povos e comunidades tradicionais, além de consumidores, pesquisadores, técnicos e membros de organizações da sociedade civil vindos de diversas regiões do País e do mundo.
O documento, construído coletivamente pelos impactados com o avanço dos cultivos transgênicos e do modelo do agronegócio, apresenta uma análise crítica do período desde a legalização da soja geneticamente modificada no Brasil até os dias de hoje. O objetivo é denunciar a ação de empresas e a forma pouco criteriosa com que o tema vem sendo debatido tanto pelo poder público como por uma parcela da comunidade científica.
De acordo com a carta, outra preocupação é alertar a sociedade sobre o cenário enganoso que busca enaltecer os supostos benefícios dos transgênicos e esconde um quadro preocupante, marcado pelo descontrole em relação aos efeitos desses produtos sobre a saúde, o meio ambiente e a economia.
Confira, na íntegra, o documento.
Conselho Federal de Nutricionistas, 06/01/2014.
A alternativa agroecológica
Mais sustentáveis, sementes crioulas conquistam agricultores do Nordeste
Insatisfeitos com as sementes híbridas distribuídas pelo governo, comunidades passaram a aderir a estas variedades locais, mais adequadas ao semiárido e que não precisam de agrotóxicos
Campo Grande (RN) e Alagoa Nova (PB) – Proprietários de um pequeno sítio no vilarejo de Caiana, no interior do Rio Grande do Norte, João Fernandes Nogueira e a mulher, Rita Maria de Paula, reclamam das sementes de milho, envoltas em defensivos cor de rosa, que receberam de programas oficiais. Elas não brotaram e a família ficou sem colheita. Perto dali, na própria comunidade, Francisco Benedito de Paula, 37, compartilha da mesma queixa. O grão é “bonito”, afirma, mas “não nasceu”. Em local bem mais distante, no município de Queimadas, na Paraíba, a agricultora Maria do Carmo da Silva expressa decepção ainda maior: teve que devolver as sementes recebidas para abastecer os lavradores filiados à Associação de Desenvolvimento Rural do Sítio Guritiba, da qual é presidente. Os defensivos intoxicaram o seu neto de apenas um ano, que chegou a ficar hospitalizado por dois dias.
No Nordeste, onde mais de 1,5 milhão de famílias do semiárido vivem da agricultura familiar, situações como essas começaram a provocar uma rejeição à oferta de sementes híbridas padronizadas, que são misturadas geneticamente e precisam de agrotóxicos. Embora sejam distribuídas de graça aos agricultores do Agreste e do Sertão, muitos acreditam que elas colocam em risco o patrimônio genético da região, pois apenas uma variedade é entregue, ignorando o regime diferenciado de chuvas da região e a diversidade de solos. Nos últimos tempos, os agricultores encontraram em uma variedade local a alternativa para uma safra mais sustentável. Trata-se da semente crioula, ou “da paixão”, adequada ao semiárido e que vem sendo trabalhada e guardada desde gerações passadas.
— As crioulas têm mostrado que, talvez pela adaptação ao meio, produzem mais do que as oficiais ou comerciais. Não que estas não sejam boas. Mas exigem custos adicionais, como adubação, irrigação, defensivos, que terminam só dando lucratividade se plantadas em larga escala. Já as nativas chegam livres de agrotóxicos e não precisam de despesas com esses cuidados adicionais — afirma o agrônomo Emanoel Dias, da Assessoria e Serviços em Projetos de Agricultura Alternativa (AS-PTA), uma das parceiras da Articulação Semiárido Brasileiro (ASA), rede de organizações que atuam na gestão e no desenvolvimento de políticas para a região semiárida.
Utilizadas desde os tempos pré-coloniais pelos índios, as sementes crioulas chegaram aos dias atuais pela prática da agricultura tradicional, na qual os lavradores conservam-nas, selecionam, melhoram e as trocam entre si. Seu nome muda de acordo com o estado: são as sementes “da paixão” na Paraíba, “da fartura” no Piauí, “da resistência” em Alagoas, “da liberdade” em Sergipe, e “da gente” em Minas Gerais. Agora, as comunidades vêm se organizando para a criação de bancos de sementes crioulas, que podem ser familiares, comunitários ou regionais.
Segundo a ASA, já há mais de mil experiências coletivas, que envolvem quase 20 mil famílias. Só na região da Borborema, que congrega quinze municípios, os bancos comunitários somam 73, e há ainda outros três mil familiares. No estado, a “rede” já possui 225 bancos comunitários, com mais de oito mil famílias beneficiadas em 61 municípios.
Um dos bancos comunitários mais tradicionais é o do Sítio São Tomé, em Alagoa Nova, a 136 quilômetros de João Pessoa. O banco foi fundado em 1974 por José Oliveira Luna, o Zé Pequeno, indignado com a manipulação política. No sertão, a exemplo do que ocorria com a água, as sementes vinham se transformando em “moeda” eleitoreira.
— Tomei a iniciativa porque as sementes estavam fugindo do nosso meio, por causa do assistencialismo político. Fiquei revoltado com o que as autoridades faziam. Davam sementes em troca de voto — lembra Zé Pequeno, cujo banco tem hoje 61 “sócios” e preserva mais de 20 variedades tradicionais de milho e feijão, que são cultivadas na região.
Cada lavrador é obrigado a devolver 15 quilos de sementes crioulas para cada dez que receberam. Caso estas não vinguem, ele se obriga a devolver aquela quantidade em outra variedade.
Zé Pequeno defende que as sementes crioulas são cem por cento melhores do que as híbridas e que os sítios que as utilizam comemoram a fartura. As híbridas (não confundir com transgênicas, que são as geneticamente modificadas) resultam do cruzamento de variedades diferentes, seja na forma natural ou em laboratório. Mas estas vão perdendo a produtividade durante safras seguidas, o que obriga o lavrador a ter despesas a cada safra ou a depender da distribuição gratuita, feita pelos governos.
Em geral, são compradas em grandes quantidades e distribuídas de graça aos agricultores, quase sempre descapitalizados com as constantes secas que assolam a região. Como recebem em pequenas quantidades (até três quilos), eles precisam apelar para o comércio nos períodos de bom inverno, quando os preços são proibitivos para os padrões da Caatinga. Para os lavradores, as híbridas trazem três tipos de risco: a dependência da boa vontade das autoridades, a erosão do patrimônio genético da região, e a não garantia da segurança alimentar. Pior do que isso: só germinam bem na primeira geração.
— Na segunda, já não brotam como na primeira. E na terceira, nem nascem. Percebi que tinha virado escravo. Agora só planto semente crioula, porque produz melhor e a saúde é outra — afirma Carlos Soares Menezes, do Sítio São Carlos, localizado no município de Monte Alegre, em Sergipe.
A julgar por estudos realizados pela Embrapa Tabuleiros Costeiros, há vantagens no uso das crioulas. Foram testados sete campos de multiplicação em seis municípios diferentes, e realizados ensaios comparativos. Os testes foram efetuados entre 2010 e 2013, e analisado o desempenho de oito tipos de sementes, sendo seis crioulas, uma híbrida distribuída por órgãos oficiais e outra escolhida em casas comerciais. Ao todo, foram efetuados oito ensaios no período.
O estudo mostrou, por exemplo, que a variedade crioula jabatão de milho rendeu 2,5 toneladas de grãos por hectare, enquanto a comercial, conhecida por caatingueira (desenvolvida pela própria Embrapa), só produziu duas. Enquanto a primeira rendeu 11 toneladas de massa seca por hectare, a caatingueira só deu 8,5. A massa seca é importante no semiárido porque serve de forragem para o gado.
Por conta da importância das crioulas, a ASA incluiu o apoio e estímulo à criação de bancos de sementes no P1+2, Programa Uma Terra e Duas Águas. O P1+2 surgiu como desdobramento do P1MC, Programa Um Milhão de Cisternas, que visa implantar 1 milhão de cisternas para consumo doméstico no semiárido. O P1MC já implantou mais de 500 mil cisternas domésticas no semiárido, com o objetivo de garantir água potável para as famílias da área rural durante as secas.
Já o P1+2 visa um passo adiante: assegurar água para a agricultura e a segurança alimentar, inclusive com permanente de sementes crioulas. Até agora implantou 33.473 tecnologias como barragens subterrâneas, cisternas de enxurrada e tanques de pedra, entre outras.
Guardiões da paixão
Durante muito tempo marginalizadas pelos programas governamentais — pois eram consideradas grãos, usados para alimentação e não para o plantio — as crioulas passaram a ser reconhecidas como sementes a partir da Lei 10711/2003, que dispõe sobre o Sistema Nacional de Sementes e Mudas. Essa lei impede que sejam feitas restrições à inclusão das crioulas em programas de financiamento ou em políticas públicas de aquisição, distribuição ou troca de sementes. Em pelo menos dois estados — Paraíba e Alagoas — há legislações locais incentivando a produção de sementes crioulas. Mas os agricultores reclamam que a maior parte da lei permanece no papel.
De acordo com o agrônomo Emanoel Dias, da AS-PTA, só no ano passado o governo da Paraíba investiu R$ 350 milhões (sic) na aquisição de sementes [em realidade foram R$ 6,5 milhões]. Mas elas eram de uma só variedade e vinham de um mesmo fornecedor. Os sertanejos revindicam o direito de também fornecer as suas. E afirmam ser urgente a implantação não só de iniciativas estaduais, mas de um programa nacional de fortalecimento de bancos comunitários de sementes “que valorize o patrimônio genético produzido gratuitamente pelas famílias agricultoras”. Em carta divulgada durante o 3º Encontro de Agricultores Experimentadores em Campina Grande, em outubro do ano passado, eles ressaltaram o pesar por estarem “assistindo a distribuição de sementes por meio dos Programas Estadual e Federal no território da Borborema e em todo o estado da Paraíba”. Denunciaram que a distribuição de poucas variedades, não adaptadas às condições ambientais e socioculturais das diferentes regiões, “repete o erro histórico dos programas públicos que em nada contribuíram para promover a autonomia das famílias agricultoras”, prática que contribui “para a erosão genética da rica diversidade das sementes da paixão cultivada pelas famílias agricultoras”.
As coisas, no entanto, começam a mudar. Organizados em cooperativas, os produtores já conseguem vender suas crioulas para programas federais como o de Aquisição de Alimentos, o PAA, do Ministério de Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Eles exigem que o Programa Brasil Sem Miséria trabalhe prioritariamente com as crioulas e que o governo crie condições para que, num futuro não tão distante, opere exclusivamente com elas.
— Eu já tinha dito para o governo que não queria mais semente híbrida, mas mandaram para os 19 agricultores que se inscreveram no Garantia Safra, em Queimadas — conta Maria do Carmo Silva, que preside a associação de moradores da comunidade. — Foi no mês de junho. As sementes ficaram armazenadas em um galpão, junto da minha casa. Meu neto passou junto e ficou adoentado por causa do veneno. Agora virei guardiã e só trabalho com as crioulas. Lá no Sítio Guritiba fundamos um banco de sementes que já tem 32 sócios.
O Globo, 14/01/2014.
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Campanha Brasil Ecológico, Livre de Transgênicos e Agrotóxicos
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